Pesquisa e Inovação

Alcoolismo fragiliza sistema imune e aumenta risco de morte por infecção pulmonar fúngica

Estudo do ICB com camundongos revela que consumo excessivo 'desorienta' ação das células de defesa

À esquerda, neutrófilos conseguem combater infecção em camundongos que não ingeriram álcool; à direita, triângulos amarelos revelam excesso de CXCL1 que atrapalha a chegada de neutrófilos ao pulmão do camundongo alcoolista
À esquerda, neutrófilos conseguem combater infecção em camundongos que não ingeriram álcool; à direita, triângulos amarelos revelam excesso de CXCL1 que atrapalha a chegada de neutrófilos ao pulmão do camundongo alcoolista Acervo do projeto 

Combater infecções pulmonares, geralmente causadas por vírus e bactérias, é desafiador para a ciência, especialmente diante de novos patógenos, como o Sars-Cov-2, vírus causador da covid-19. E pouco ainda se sabe sobre pneumonia causada por fungos, que pode ser fatal em indivíduos cujo sistema imunológico já tenha sido alterado, seja por um transplante de órgão, seja por doenças crônicas, como câncer, aids ou diabetes. Essa condição pode ser provocada também pelo alcoolismo crônico, como revela estudo publicado na revista eLife, por pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

A doutoranda Nathália Luísa Souza de Oliveira Malacco, sob orientação do professor Frederico Marianetti Soriani, do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução, investigou, em experimentos com camundongos, as razões de o alcoolismo, uma das doenças crônicas com maior número de mortes em todo o mundo, também deixar os indivíduos mais propensos a pneumonias.

De acordo com a literatura científica, considera-se consumo crônico a ingestão de álcool a 20% pelos animais durante 12 semanas consecutivas. “Esse teor alcoólico equivale a um vinho mais forte ou a uma cachaça misturada com água na proporção meio a meio", explica o professor.

A infecção pulmonar nos dois grupos de camundongos, alcoolistas e não alcoolistas, foi causada intranasalmente pelo fungo Aspergillus fumigatus. Esse microrganismo, já pesquisado pelo grupo liderado pelo professor Frederico Soriani, tem atuação idêntica à da bactéria Streptococcus, um dos agentes causadores da pneumonia.  

Quimiocina em excesso
Segundo Frederico Soriani, que também coordena o Laboratório de Genética Funcional (LGF) do ICB, após avaliação de todos os parâmetros de resposta do organismo dos dois grupos de camundongos, a investigação chegou à conclusão de que, no organismo de indivíduos alcoolistas, há produção exacerbada de quimiocina, ou CXCL1, substância responsável por indicar para as células de defesa, como os neutrófilos, a localização dos patógenos causadores do processo infeccioso no organismo. Os neutrófilos estão entre as principais células de combate a vírus, bactérias e fungos.

“O consumo crônico de álcool, de alguma maneira, altera a produção dessa substância, que, em excesso, em vez de ajudar, passa a confundir os neutrófilos, que ficam 'perdidos' e com mais dificuldade para migrar e encontrar a localização do  microrganismo”, relata.

Além disso, os pesquisadores observaram que, mesmo quando algumas dessas células conseguem chegar aos pulmões, a sua capacidade de capturar o fungo e combater a infecção fica comprometida. “Assim, com menos neutrófilos no pulmão, o patógeno se vê numa situação favorável, crescendo e causando muito mais danos, inclusive a morte, aos indivíduos alcoolistas do que àqueles que não consomem álcool”, conclui o professor Frederico Soriani.

O artigo Consumo crônico de etanol compromete função dos neutrófilos em infecção aguda pulmonar por Apergillus fumigatus também está descrito no vídeo do projeto de divulgação científica Ciência pra você:  

Teresa Sanches