Pesquisa e Inovação

Aula sobre crimes contra a humanidade abre curso para estudantes internacionais

Formação que traça um panorama sobre o Brasil reúne, neste ano, 120 estudantes de 40 países

A desembargadora federal brasileira Sylvia Steiner, membro do Tribunal Penal Internacional (TPI) de 2003 a 2016, ministrou, nesta segunda-feira, dia 5, a aula de abertura da edição 2021 da Summer School on Brazilian Studies, curso de curta duração que a UFMG oferece aos seus estudantes estrangeiros durante este mês.

Na aula magna, Steiner buscou esclarecer, do ponto de vista jurídico, e sob a ótica de quem já os julgou quando de sua atuação no TPI, o que são crimes contra a humanidade e em que hipóteses eles se configuram legalmente. Ministrada em português, a aula está disponível no canal da Diretoria de Relações Internacionais (DRI) no YouTube.

Crimes contra a humanidade em tempos de pandemia
Ao fim da exposição inicial da desembargadora, os participantes puderam apresentar perguntas e tirar suas dúvidas. O principal questionamento dos participantes se situou no atual contexto de emergência sanitária. É possível que a conduta omissiva de um líder de nação durante uma pandemia como a atual seja considerada crime contra a humanidade? Didática, a desembargadora respondeu de forma hipotética, considerando duas possíveis situações.

Sylvia
Sylvia Steiner: omissão gera responsabilidade penal se for deliberada, materialmente dolosa e cometida por quem tem o dever de agirFoto: ICC-CPI/Hans Hordijk

“A simples omissão não gera responsabilidade penal”, introduziu a desembargadora, construindo a sua primeira hipótese. Ela disse que não basta que um Estado não tenha uma política adequada de combate à covid-19, ou que não tenha tomado as providências necessárias para o controle da pandemia, ou “que tenha feito de conta que aquilo não era nada sério” para que um crime possa ser tipificado. “Por mais desastrosa que seja a conduta, por maior que seja o número de vítimas, não se pode falar em crime contra a humanidade [em um caso assim]”, exemplificou.

Por outro lado, explicou Steiner, a omissão gera, sim, responsabilidade penal se tiver caráter deliberado – “portanto dolosa”, ela explica – e for cometida por aqueles que tinham o dever de agir e não agiram.

“A omissão gera responsabilidade penal internacional, primeiramente, se ela for uma omissão dolosa, [isto é], se se comprovar que a inação foi deliberada. Em segundo lugar, [é preciso] que essa omissão deliberada tenha tido a intenção de ser parte de um ataque contra a população civil”, complementou. “Por fim, [é preciso] que essa omissão tenha sido de alguém que tinha o dever de agir e não agiu. Esses são os requisitos para que qualquer omissão seja punível como um crime internacional. Os quadros são esses. É uma matéria probatória”, resumiu a desembargadora.

Para justificar uma punição, é necessário, ainda, que provas demonstrem a “alta probabilidade” de que o resultado doloso do evento não teria ocorrido, tal como ocorreu, caso não houvesse omissão, explicou Sylvia Steiner. “A prova do nexo causal entre omissão e resultado é uma das matérias mais difíceis no campo do direito penal, mesmo no plano interno. No direito penal internacional, estabeleceram-se algumas tentativas de fixar um patamar, um ‘standard’, que seria o da ‘alta probabilidade’ de que o resultado não teria ocorrido caso não tivesse havido a omissão”, ponderou.

Dawisson Lopes, em evento na Índia, em 2017:
Dawisson Lopes, diretor-adjunto de relações internacionais: mosaico da diversidadeObserver Research Foundation (Índia, 2017)

O curso
O Summer School on Brazilian Studies, curso de estudos brasileiros destinado aos estudantes estrangeiros da UFMG, foi criado de 2016 para 2017 pela Diretoria de Relações Internacionais (DRI). Normalmente, ele é ministrado presencialmente e durante o período de férias. Em razão da atual pandemia de covid-19, desde o ano passado ele tem sido ofertado pela internet e não necessariamente no período tradicional das férias escolares.

Nas duas semanas de atividades do curso, professores apresentam aos alunos estrangeiros um panorama da UFMG e do Brasil nos mais diversos aspectos, como política, história, relações exteriores, geografia, direito, economia, saúde, cultura e artes. “Recebemos estudantes das mais diferentes orientações comportamentais, formações acadêmicas, origens étnicas, orientações religiosas. O que a gente faz é tentar dar conta dessa enorme diversidade que se forma na sala de aula da Summer School, esse enorme mosaico internacional”, diz o professor Dawisson Lopes, diretor-adjunto de Relações Internacionais da UFMG.

Segundo ele, a edição deste ano é a maior desde a criação do curso. “São mais de 120 estudantes de 50 instituições de cerca de 40 países", resume Dawisson. Outras informações podem ser obtidas no site do curso.

Ewerton Martins Ribeiro