Pesquisa e Inovação

BH sedia estudo pioneiro nas Américas sobre método de controle da dengue

Trabalho conduzido pela UFMG vai incluir todas as regionais da capital e terá participação de 60 crianças

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Inserção de mosquitos com organismo intracelular reduz casos de arboviroses  Reprodução / Projeto Evita Dengue

Belo Horizonte será o primeiro município das Américas a realizar um estudo randomizado e controlado para avaliar o impacto do Método Wolbachia na redução da incidência de casos de arboviroses, doenças como a dengue, zika e chikungunya. O projeto Evita Dengue, conduzido pela UFMG, terá início nos próximos dias, já com autorização da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).

Segundo o médico e professor Mauro Teixeira, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e coordenador da pesquisa, essa é uma colaboração científica entre a UFMG e a Universidade de Emory, a Universidade Yale e a Universidade da Flórida, todas nos Estados Unidos. O estudo é financiado pelo Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID/NIH), dos Estados Unidos. A pesquisa conta ainda com o apoio estratégico da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio das secretarias de Educação e de Saúde, da Secretaria de Saúde de Minas Gerais e do Ministério da Saúde.

O Método Wolbachia é uma iniciativa do World Mosquito Program (WMP), que é conduzido no país pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e utiliza a bactéria Wolbachia para o controle de arboviroses, doenças que são transmitidas por mosquitos. 

'Wolbachia'
A Wolbachia é um microrganismo intracelular presente em 60% dos insetos. Ela não é encontrada no Aedes aegypti e foi introduzida no mosquito por pesquisadores do WMP, iniciativa global sem fins lucrativos que trabalha para proteger a comunidade global das doenças transmitidas por esses insetos. 

Quando presente no Aedes aegypti, a Wolbachia impede que os vírus da dengue, zika, chikungunya e febre amarela se desenvolvam dentro do inseto, contribuindo para a redução dessas doenças. Não existe modificação genética nesse processo.

O Método Wolbachia consiste na liberação de Aedes aegypti com Wolbachia para que se reproduzam com os Aedes locais, estabelecendo-se, assim, uma nova população desses mosquitos, todos com Wolbachia.

Evita Dengue em BH
O Ensaio randomizado por cluster para avaliação da eficácia de mosquitos Aedes aegypti infectados com Wolbachia na redução da incidência de infecção por arbovírus no Brasil, ou simplesmente Projeto Evita Dengue, será realizado em todas as regionais de BH. 

Serão convidadas a participar da pesquisa 3.840 crianças, na faixa de 6 a 11 anos de idade, da 1ª à 3ª série, matriculadas em 58 escolas públicas municipais de BH selecionadas. Nas regiões onde estão localizadas 29 dessas escolas, o mosquito com Wolbachia será liberado em um primeiro momento; nas regiões das demais escolas, os Aedes com Wolbachia serão liberados após a validação dos testes.  

Mauro Teixeira, do ICB, coordena o projeto
Mauro Teixeira, do ICB, coordena o projeto Foca Lisboa / UFMG

Com a autorização dos responsáveis e o necessário consentimento das crianças, será colhida uma pequena amostra de sangue, para avaliar se elas tiveram contato com o vírus da dengue, zika ou chikungunya. Para garantir o sigilo da identidade das crianças, as amostras serão identificadas por números e não pelos nomes. “Os pais podem ficar tranquilos porque não será possível o uso desses exames para prejudicar seus filhos em hipótese alguma”, garante a pesquisadora Fátima Brant, doutora em Infectologia e Medicina Tropical e integrante da equipe de coordenação do projeto. 

Estão previstas ações de educação para a saúde nas escolas municipais participantes do estudo. A escolha dos bairros que receberão o Método Wolbachia e das escolas foi feita por meio de sorteio, metodologia proposta pelo Estudo Clínico Randomizado.

Dados do WMP apontam redução de casos
Um estudo semelhante ao que será realizado em Belo Horizonte foi conduzido pelo World Mosquito Program, em parceria com a Tahija Foundation e a Universidade Gadjah Mada, na Indonésia. Nesta quarta-feira, 26, a organização internacional divulgou os primeiros resultados que indicam redução de 77% na incidência de casos de dengue, virologicamente confirmados, nas áreas onde houve liberação de Aedes aegypti com Wolbachia, em Yogyakarta, no país asiático. 

O estudo clínico randomizado controlado Applying Wolbachia to eliminate dengue (AWED) teve duração de três anos e foi conduzido em área onde estão cerca de 321 mil habitantes. Doze de 24 áreas de tamanhos semelhantes da cidade de Yogyakarta foram escolhidas aleatoriamente para receber os mosquitos com Wolbachia do WMP em conjunto com as medidas de rotina de controle da dengue realizadas no município. As 12 áreas restantes continuaram recebendo apenas as ações de rotina de controle da dengue.

O ensaio envolveu 8.144 participantes com idades entre 3 e 45 anos que se apresentaram a uma das 18 clínicas de atenção primária com febre aguda indiferenciada de um a quatro dias de duração. O estudo utilizou o método de teste negativo para analisar e medir a eficácia da Wolbachia em reduzir a incidência de casos confirmados de dengue em um período de 27 meses. A implementação do Método Wolbachia foi bem aceita pela comunidade, e não houve preocupações de segurança.

Detalhes do resultado serão apresentados em novembro, em um congresso acadêmico, e publicados em um periódico científico.

Método Wolbachia no Brasil
No Brasil, o Método Wolbachia é conduzido pela Fiocruz, em parceria com o Ministério da Saúde, com apoio de governos locais. As ações foram iniciadas no Rio de Janeiro (RJ) e em Niterói (RJ), em área onde vivem 1,3 milhão de habitantes. Em Niterói, dados preliminares já indicam redução de 75% dos casos de chikungunya nas regiões que receberam os Aedes aegypti com Wolbachia, na comparação com outras que não receberam.

O projeto está em expansão para Campo Grande (MS), Petrolina (PE) e Belo Horizonte (MG). Antes do RCT em BH, será realizado um piloto da operação do WMP Brasil na capital em três áreas de abrangência da Regional Venda Nova (Centros de Saúde Copacabana, Jardim Leblon e Piratininga). A previsão é que a liberação dos mosquitos com Wolbachia seja iniciada ainda neste ano.

O professor Mauro Teixeira ressalta que o Método Wolbachia é complementar às demais ações de controle das arboviroses. A população e os governos devem continuar a realizar as ações de rotina recomendadas para o combate à dengue, zika e chikungunya.

Mais informações sobre o Método Wolbachia estão disponíveis no site do WMP.

Campus Saúde

Assessorias de Comunicação do ICB e do WMP Brasil