Pesquisa e Inovação

'Algoritmo delator' detecta indícios de lavagem de dinheiro em transações bancárias

Ferramenta de Inteligência Artificial desenvolvida por pesquisadores do DCC é aplicada nas operações do Inter

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Ilustração: Camila Nolasco | UFMG

O termo  "lavagem de dinheiro" refere-se a ações econômico-financeiras que têm o objetivo de esconder a real origem ilícita de ativos financeiros ou bens patrimoniais. A prática visa justificar a existência de riquezas obtidas de forma criminosa por meio da execução de operações falsas, supostamente idôneas, acobertando crimes como extorsão, corrupção, terrorismo e tráfico de drogas, armas e pessoas.

Para combater esse tipo de operação, as instituições financeiras nacionais buscam estratégias e metodologias que auxiliem a rastrear as transações bancárias suspeitas. Uma delas está descrita no artigo Delator: detecção automática de indícios de lavagem de dinheiro por redes neurais em grafos de transações, que explicita estudo de pesquisadores do Departamento de Ciência da Computação (DCC) da UFMG e do Banco Inter. O modelo proposto pelo grupo, que recebeu o nome de Delator, está sendo aplicado no Banco Inter. Ele opera por meio da comparação dos perfis de transações bancárias dos clientes. 
 
O professor e pesquisador do DCC Fabrício Murai explica que o Delator considera tanto as características e comportamentos do cliente quanto a situação das pessoas com as quais ele transacionou em determinado período. "Se a situação de um cliente do Inter em determinado período é, de alguma forma, similar à de outros clientes que foram comunicados à unidade de inteligência financeira, o Delator tende a classificá-la como suspeita."
 
O pesquisador Vinícius Teodoro de Castro, coordenador de analytics no Inter, que também participou do estudo, acrescenta que o algoritmo desenvolvido pelo grupo traz uma visão mais complexa do perfil das interações feitas pelos clientes do banco. "Mapeamos os clientes com técnicas de computação e, a partir daí, observamos as interações das suas movimentações bancárias. Observando essas interações, o Delator é capaz de 'pegar' os clientes que passam pelos primeiros filtros que detectam transações suspeitas", diz. Criamos uma base de dados analítica que nos permite encontrar padrões suspeitos com base nas movimentações dos clientes. O Delator é capaz de reconhecer anomalias nas movimentações que não seriam encontradas com observações comuns e massificadas dos clientes", acrescenta Vinícius Castro. 

Da esquerda para a direita: Leandro, Vinícius Teodoro de Castro, Lucas Bernardes (diretor do Inter) e Paulo
Da esquerda para a direita: Leandro Lacerda Campos, Vinícius Teodoro de Castro, Lucas de Souza Bernardes (diretor do Inter) e Paulo Laurentys de AlmeidaFoto: Arquivo pessoal

Grafos
A metodologia usada para o desenvolvimento do Delator é baseada na arquitetura de graph neural networks (GNN). Segundo Castro, foram combinadas duas técnicas: "Usamos o desenho do cliente em grafos, representando temporalmente as transações, juntamente com as GNNs, que são redes robustas que encontram padrões dentro dos grafos."

Fabrício Murai explica como a metodologia foi aplicada no Delator. "Cada pessoa é um vértice do grafo, e cada transação é uma aresta que conecta dois vértices. Para aprender esse grafo, o Delator precisa executar duas tarefas: prever a existência de uma transação entre duas pessoas e estimar o seu valor, caso ela, de fato, exista. A situação de um cliente é representada por algum dos vértices", detalha.
 
Depois que o Delator aprende a prever esse tipo de situação, o programa é treinado para executar a terceira e última tarefa. "Finalmente, ele classifica a situação como suspeita de lavagem de dinheiro, dada a similaridade entre essa situação e outras anteriormente analisadas e classificadas como tal", diz Murai.

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Ilustração: Camila Nolasco | UFMG

Regulação do Banco Central
Segundo Vinícius Teodoro de Castro, o desenvolvimento do Delator vai ao encontro das normas do Banco Central (Bacen) que exigem que toda instituição financeira precisa dispor de métodos de regulação de lavagem de dinheiro. As áreas dos bancos responsáveis por esse tipo de controle analisam as transações e reportam aquelas consideradas suspeitas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Em 2019, o Relatório Global de Fraude & Risco da Kroll mostrou que o Brasil é líder mundial em lavagem de dinheiro.

"A lavagem de dinheiro financia diversos crimes. Uma pesquisa como essa contribui para que os bancos entendam as ameaças e as reportem aos órgãos competentes. É preciso evitar que operações criminosas sejam financiadas por dinheiro que circula dentro do banco", analisa o pesquisador.

Artigo: Delator: detecção automática de indícios de lavagem de dinheiro por redes neurais em grafos de transações
Autores: Henrique S. Assumpção, Fabrício Souza, Leandro Lacerda Campos, Vinícius T. de Castro Pires, Paulo M. Laurentys de Almeida e Fabrício Murai
Disponível on-line.

 
 

Luana Macieira