Pesquisa e Inovação

Editora UFMG publica dossiê sobre o pensamento de Bruno Latour

Para os organizadores da obra, intelectual francês interpreta o mundo movendo-se nos espaços onde a vida se desenrola

Livro 'Dossiê Bruno Latour', lançado em junho de 2021 pela Editora UFMG
ReproduçãoCapa do livro 'Dossiê Bruno Latour', lançado em junho de 2021 pela Editora UFMG

O pensador francês Bruno Latour já escreveu mais de 20 livros e publicou mais de 150 artigos científicos, uma obra que encontra ressonância nas mais variadas áreas de investigação acadêmica, como a antropologia, a sociologia, a filosofia, a história, a comunicação e a educação. Publicado recentemente pela Editora UFMG, o livro Dossiê Bruno Latour colige análises de especialistas brasileiros sobre sua extensa e abrangente trajetória intelectual, apresentando uma espécie de panorama do seu pensamento, que tem na teoria ator-rede a sua pedra fundamental.

Organizado por Joana Ziller e Geane Alzamora, professoras do Departamento de Comunicação Social da Fafich, e por Francisco Ângelo Coutinho, docente da Faculdade de Educação, o dossiê reúne uma visão plural, analítica e crítica dos aspectos conceituais delineadores da obra desse antropólogo da ciência e traz a tradução para o português de uma conferência ministrada por Latour, em dezembro de 2014, na Associação Americana de Antropologia, em Washington, nos EUA.

“Nessa conferência, Bruno Latour apresenta sua visão da antropologia no tempo do Antropoceno, destacando a diferença entre ser ‘moderno’ e 'ser ‘contemporâneo’”, adiantam os organizadores na abertura do volume. “Latour afirma que a grande contribuição filosófica do Antropoceno é destacar a narratividade, que ele chama de geoestória, como aquilo que forma o próprio mundo. Latour sugere que o Antropoceno poderia oferecer uma oportunidade para encontrarmos alternativa à modernidade”, explicam.

Bruno Latour no início da década passada, em 'trabalho de campo'
Bruno Latour no início da década passada, em "trabalho de campo"
Fotos: Knowtex | Flickr CC BY-SA 2.0


Sobre o que possa ser o moderno
Na introdução da obra, os organizadores fazem uma interpretação do modo particular de produzir conhecimento de Bruno Latour. “Ao invés de derivar suas conclusões da hermenêutica dos grandes pensadores e intelectuais, Latour procura entender o mundo moderno como um antropólogo e, enquanto tal, desloca-se para os espaços onde se desenrola nossa vida. É com esse propósito que Latour se instala em laboratórios, em tribunais, em exposições de arte e acompanha cientistas em trabalhos de campo, enquanto estes procuram resolver controvérsias científicas”, destacam.

Por meio desses movimentos intelectuais pouco ortodoxos, Bruno Latour segue há mais de quatro décadas buscando definir a modernidade e o ser moderno. Essa é a questão central em torno da qual suas reflexões orbitam, mas seus interesses empíricos são amplos e variados, como exemplificam os organizadores da obra na apresentação do volume. “Mais recentemente, Latour tem-se dedicado a compreender os desafios políticos e filosóficos do Novo Regime Climático, relacionado às crises ambiental e socioeconômica compreendidas no âmbito das contradições e deficiências da modernidade. Latour afirma que a compreensão acerca desse novo regime é condição necessária para entendermos aspectos cruciais da contemporaneidade, como a explosão das desigualdades, a crítica da globalização e o aumento do populismo."

A atual ‘universalidade perversa’
O dossiê também contém entrevista que Latour concedeu à pesquisadora Débora de Carvalho Pereira, doutora em Ciência da Informação pela UFMG, que fez estágio doutoral e pós-doutorado no Médialab, laboratório interdisciplinar do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po) onde Latour é professor emérito. Na entrevista, realizada em setembro de 2018, o pensador é inquirido, entre outros temas, sobre a sua teoria ator-rede, as relações entre capitalismo e modernidade, as relações entre seu trabalho e o pensamento de intelectuais, como Michel Foucault e Gilles Deleuze, e a articulação entre o seu pensamento teórico e o mundo das artes.

Nessa entrevista, Latour afirma que, hoje, ocorre “o que chamo de ‘universalidade perversa’, de wicked universality. Trata-se do fato de que agora nós compartilhamos com os brasileiros, os bolivianos, os chineses, os turcos, entre outros, uma outra forma de universalidade, completamente imprevisível e distinta da que nós, europeus, havíamos inventado (a universalidade do homem, da cultura e da sociedade): a universalidade de perder a Terra. [...] Agora há um retorno da noção de universalidade em antropologia, que não estava prevista, que é a incerteza em relação à Terra”.

O Dossiê Bruno Latour está disponível nas livrarias.

Livro: Dossiê Bruno Latour
Organizadores: Geane Alzamora, Joana Ziller e Francisco Ângelo Coutinho
Editora UFMG
310 páginas | R$ 64

Ewerton Martins Ribeiro