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Entregadores de aplicativos reivindicam melhores condições de trabalho

Professora da Faculdade de Direito da UFMG analisou, em entrevista à Rádio UFMG Educativa, as relações trabalhistas assimétricas impostas à categoria

Entregadores de aplicativos: condições justas de trabalho?
Entregadores de aplicativos: condições justas de trabalho? Roberto Parizotti/FotosPublicas CC BY-NC 2.0

Entregadores de aplicativos organizaram uma paralisação nesta quarta-feira, primeiro de julho, em todo o Brasil, com a proposta de chamar a atenção para as condições precárias de trabalho, que se agravaram durante a pandemia da covid-19. Uma pesquisa da Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista, ligada à Universidade Federal do Paraná, comprova: a jornada dos entregadores aumentou e a remuneração diminuiu nos últimos meses. Além disso, a maioria precisa providenciar equipamentos de proteção contra o novo coronavírus, como máscaras e álcool em gel, por conta própria. A pesquisa foi realizada a partir de 298 questionários on-line respondidos por entregadores das principais plataformas digitais no Brasil, como iFood, Uber Eats, Rappi e Loggi, em 29 cidades, inclusive Belo Horizonte. 

O percentual de entregadores que afirmam trabalhar mais de nove horas diárias aumentou de 57% para 62%. Os trabalhadores atribuem o aumento da jornada às novas contratações durante a pandemia, o que teria provocado a redução das chamadas para entregas. Dessa forma, eles passaram a trabalhar mais horas para tentar manter a remuneração. Mesmo assim, o estudo mostra que 58,9% dos entregadores tiveram queda nos rendimentos. Antes, eles ganhavam entre 261 e 650 reais por semana. O número de trabalhadores nas maiores faixas de remuneração caiu para quase um terço. 

Uma das principais disputas do campo judicial relacionadas à classe de motoristas de aplicativo diz respeito à caracterização dos serviços que eles prestam: se eles devem ser considerados trabalhadores autônomos ou se o vínculo com as empresas de plataformas digitais, ainda que virtual, deveria garantir a eles direitos trabalhistas. Para a professora de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da UFMG, Daniela Muradas, ocorre sim uma subordinação desses trabalhadores às companhias de entrega de aplicativo: “Essas empresas adotam plataformas que, por meio de programações algorítmicas, pré-ordenam aspectos da prestação de serviços, como tempo, modo, local, tarifamento… caracterizando o que chamamos de Subordinação Algorítmica. Assim, se dá uma falsa percepção de autonomia ao trabalhador, mas os programas são pré-ordenados de forma a induzir jornadas exaustivas, estabelecer valores tarifários pouco transparentes, realizar transferências de custos da atividade para o próprio prestador de serviços, que em regra, atua em operações pouco ou nada vantajosas”, afirma a professora.

Em entrevista ao programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa, a professora Daniela Muradas ressaltou que a pandemia do novo coronavírus trouxe à tona uma outra discussão relacionada à questão dos entregadores de aplicativo: a da saúde ocupacional. Com a falta de uma legislação regulamentando a atividade no país, as empresas transferem a responsabilidade de segurança e redução de riscos no trabalho aos próprios trabalhadores. “No contexto da pandemia, observamos essas companhias tentando se ocultar de suas responsabilidades, ao mesmo tempo que ampliam os lucros, sem corresponder à qualquer incremento nos padrões sociais dos motoristas que estão vivendo situação de exposição a riscos”, analisa Muradas. “É de extrema importância que as empresas se responsabilizem pelo direito fundamental à saúde desses trabalhadores, para que eles não se contaminem ou se tornem veículos de contaminação na sociedade. É um caso que vai além da questão trabalhista: é um problema de saúde pública”, afirma a professora.

A força da coletividade
A professora da Faculdade de Direito da UFMG Daniela Muradas considera oportuna a paralisação organizada pelos entregadores de aplicativos: “O movimento de hoje marca o despertar de uma consciência coletiva desses trabalhadores, de que todos eles participam de uma mesma classe, com reivindicações e pautas semelhantes. A falta de uma vivência coletiva, e a exaltação à autonomia e ao individualismo promovida pelas empresas, muitas vezes impedia que os entregadores pudessem se organizar para reivindicar mudanças na relação de trabalho assimétrica que lhes é imposta”, observa Muradas.

Durante o programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa, a professora também lembrou do papel dos consumidores na paralisação: “são eles quem pagam a alta taxa de lucro dessas empresas. Quando nos percebemos como peças nesse jogo, temos a oportunidade de reconhecer e apoiar as pautas dos trabalhadores, no sentido de buscar um equilíbrio maior nessa atividade tão relevante e necessária para a sociedade”, defendeu a professora, em entrevista que abordou diversos aspectos relacionados às reivindicações da categoria de entregadores de aplicativos.

Ouça a conversa com Luíza Glória