Pesquisa e Inovação

Medicamento protege coração de mulheres em tratamento contra o câncer

Revisão feita por pesquisadora da Faculdade de Medicina revela que dexrazoxano pode reduzir risco de insuficiência cardíaca em 80%

Carol Morena / UFMG
Medicamento reduz em 70% o risco de perda da função cardíaca nas mulheres que fazem quimioterapia
Carol Morena / Faculdade de Medicina

O diagnóstico de câncer de mama pode provocar mudanças significativas na vida da mulher, que precisa lidar com questões que fogem à rotina, como os efeitos colaterais de medicamentos. Alguns quimioterápicos, por exemplo, podem trazer problemas para o bom funcionamento do coração, preocupação a mais para quem já enfrenta os desgastes do tratamento. Para alívio do coração, pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina revisou o benefício de um medicamento que pode reduzir em torno de 80% o risco de insuficiência cardíaca em mulheres com esse tipo de câncer.

A pesquisa desenvolvida pela cardiologista Ariane Vieira Scarlatelli Macedo comprova a eficácia do dexrazoxano na proteção ao coração da mulher. Em pacientes com câncer de mama, o tratamento pode incluir o uso de quimioterápicos, como a antraciclina, associada ou não ao trastuzumabe, um tipo de anticorpo. Esses dois medicamentos podem gerar complicações cardiológicas, que impedem a continuidade do tratamento oncológico.

“A prevalência de pacientes que desenvolvem insuficiência cardíaca, secundária ao uso de quimioterapia como antraciclinas, gira em torno de 3% a 5%, a depender da dose utilizada”, informa a cardiologista. Segundo ela, esse percentual torna-se expressivo ao considerar o universo de milhares de pacientes que fazem quimioterapia.  “Além disso, essa complicação, por vezes, pode ser grave, podendo resultar em morte”, completa. O Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima que, somente em 2018, 59,7 mil novos casos de câncer de mama serão diagnosticados.

O uso do dexrazoxano, no entanto, pode reduzir em quase 80% a chance de a paciente desenvolver insuficiência cardíaca sintomática e em 70% a chance de apresentar quadro de evento cardíaco (queda da função do coração sem sintomas, detectada por ecocardiograma).

Ariane Macedo: ampla revisão bibliográfica
Ariane Macedo: ampla revisão bibliográfica Carol Morena / Faculdade de Medicina

Ao analisar os desfechos oncológicos do tratamento, a pesquisadora não encontrou diferença na taxa de resposta oncológica (redução do tumor) com o uso do medicamento. O tempo de vida da paciente e de sobrevida livre de progressão (tempo que a pessoa vive sem que a doença volte) também não se alterou. “Com esses dados, os oncologistas e cardiologistas podem mudar a história de tratamento da paciente, permitindo que ela seja medicada, e mantendo a segurança do coração”, defende Ariane Macedo.

O estudo foi realizado com base em revisão bibliográfica que reuniu os estudos mais atuais ao redor do mundo. Também foi feita uma meta-análise, que consiste na compilação e análise estatística de vários dados de pesquisas diferentes. “Fornecendo mais dados para os cardiologistas e oncologistas, acredito que possamos ampliar a utilização da droga”, explica Ariane Macedo.

Incorporação pelo SUS
Diferentemente das antraciclinas e do trastuzumabe, o dexrazoxano ainda não é disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o que aumenta o custo do tratamento quimioterápico. Por isso, a droga deve ser prescrita para pacientes com maior risco de complicações, como idosas, mulheres que já tiveram problemas cardíacos e pessoas que voltaram a se submeter ao tratamento com antraciclina em doses acima das consideradas seguras.

A cardiologista acredita que os resultados de seu estudo sinalizam a importância de a medicação ser incorporada pelo Sistema Único de Saúde. “Existe todo um protocolo técnico de incorporação de medicação pelo SUS. No entanto, pelo impacto que essa droga pode trazer e por suas implicações significativas para a prática clínica, esperamos que isso aconteça um dia", afirma.

Antraciclinas e trastuzumabe
As antraciclinas constituem um grupo de agentes quimioterápicos altamente eficazes na destruição de células tumorais. No entanto, dependendo da dose utilizada, elas podem levar a paciente a desenvolver insuficiência do coração, doença em que o órgão não bombeia o sangue como deveria.

O trastuzumabe, por sua vez, é um anticorpo utilizado como tratamento adjuvante contra alguns tipos de câncer de mama. Associado ao antracíclico, também pode aumentar o risco de as pacientes apresentarem toxidade cardíaca.

TeseEficácia do dexrazoxano na prevenção de cardiotoxicidade em pacientes com câncer de mama expostos a quimioterapia com antraciclina, associado ou não ao trastuzumabe: revisão sistemática e metanálise
Autora: Ariane Vieira Scarlatelli Macedo
Orientador: Antônio Luiz Pinho Ribeiro
Coorientadora: Angélica Nogueira Rodrigues
Defesa: 10 de maio de 2018, no Programa de Pós-graduação em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto

Raíssa César / Assessoria de Comunicação da Faculdade de Medicina