UFMG participa da primeira circum-navegação do Brasil na Antártica
Expedição leva 61 cientistas, dos quais 27 são brasileiros; projeto 'Extremófilos', da UFMG, está representado por pesquisadores parceiros
O imponente navio quebra-gelo russo Akademik Tryoshnikov, do Instituto de Pesquisa Ártica e Antártica de São Petersburgo (AARI), zarpou do porto de Rio Grande, no litoral sul do Rio Grande do Sul, a caminho da Antártica, o “continente gelado”, na sexta-feira, dia 22 de novembro. A bordo dele estão 61 cientistas, dos quais 27 brasileiros, todos vinculados a instituições associadas ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera (INCT da Criosfera) e a projetos de pesquisa do Programa Antártico Brasileiro (Proantar). Esse conjunto de pesquisadores faz parte da primeira circum-navegação costeira antártica chefiada pelo Brasil, um marco na história da pesquisa de campo nacional.
“Essa é, de fato, a maior expedição antártica já liderada pelo Brasil”, destaca Luiz Henrique Rosa, professor do Departamento de Microbiologia da UFMG e coordenador do núcleo de microbiologia do INCT da Criosfera. “O navio vai circular a Antártica inteira e voltar. São 14 milhões de quilômetros quadrados”, informa o professor, que já participou de mais de uma dúzia de expedições antárticas e foi um dos pesquisadores que estiveram à frente da reativação da Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF), em 2020, oito anos após o incêndio que atingiu a base brasileira. Ao todo, a atual expedição vai percorrer trajeto de mais de 20 mil quilômetros, em uma viagem de 60 dias. O retorno está programado para 25 de janeiro.
'Testemunhos de gelo'
A expedição conta com 16 pontos de parada para coleta de “testemunhos de gelo”, conforme informações da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que coordena a expedição. “Durante a travessia, os cientistas enfrentarão tempestades, temperaturas extremas e as difíceis condições das águas antárticas, um desafio não apenas para a resistência física, mas também para o foco no trabalho de coleta e pesquisa. A bordo do Akademik Tryoshnikov, a equipe tem à sua disposição laboratórios de ponta e instrumentação científica avançada para análises atmosféricas, biológicas e geofísicas, todos adaptados para operar em condições polares”, anota-se.
Luiz Rosa lembra que o navio conta com um helicóptero, para facilitar o trânsito dos pesquisadores para a parte mais central do continente. “Isso é importante, porque os pesquisadores não ficam apenas no mar, eles também acessam a área continental, assim como lugares que estão sofrendo muito a influência climática, isto é, as geleiras que vão se soltar no futuro próximo”, explica o pesquisador. Para Rosa, a missão consolida o Brasil como um dos principais líderes em pesquisa polar na América Latina e representa um marco para a ciência brasileira, no que diz respeito à sua atuação no continente antártico.
Geleiras e mudanças climáticas
O coordenador da expedição é Jefferson Cardia Simões, do Centro Polar e Climático (CPC) da UFRGS. Segundo ele, a expectativa é que a missão possibilite compreender melhor o impacto das mudanças climáticas nas geleiras e nos ecossistemas costeiros da Antártica, mapear novos hotspots de biodiversidade marinha e coletar dados da resposta dada pela fauna polar às variações climáticas, à circulação oceânica e ao aumento da poluição marítima, como os microplásticos e os contaminantes emergentes. “Esperamos reunir dados sobre a linha de flutuação dessas geleiras e, simultaneamente, apoiaremos um levantamento geofísico dessas frentes de geleiras para entender como elas respondem ao aquecimento da atmosfera e do oceano”, ele explica.
Segundo Jefferson, o pioneirismo da expedição reside no fato de ela ser realizada o mais perto possível da costa da Antártica, se comparada a expedições realizadas anteriormente. Ele explica que, na missão, serão coletadas diversas amostragens ao longo da costa para estudos biológicos, químicos e físicos, com foco em dados atmosféricos, geofísicos, glaciológicos e oceanográficos do manto de gelo antártico e de seu entorno. A expedição também inclui um inédito levantamento aéreo das massas de gelo, com o objetivo de monitorar o comportamento das geleiras diante das mudanças climáticas. Uma tecnologia avançada de satélite possibilita a troca de informações via texto, áudio e vídeo e acesso à internet durante o percurso, possibilitando a transmissão de dados em tempo real.
Legenda completa da foto 1: A equipe “GeoExtremoBiologia”: Luiz Rosa, Fábio Bones, Micheline Carvalho, Gregory (encarregado logístico do navio russo), Paulo Câmara, Márcio Francelino e José João Lelis. Mesmo os pesquisadores que não embarcaram estiveram no navio às vésperas da viagem para montar seus experimentos e organizar o material científico. Foto: Arquivo Projeto Extremófilos / UFMG