Aumento do número de favelas no Brasil é reflexo da desigualdade crescente, afirma Denise Morado
Pesquisa do IBGE revelou que número de favelas no país dobrou em dez anos e constatou um aumento da insegurança alimentar no país
O número de favelas no Brasil dobrou nos últimos dez anos, de acordo com dados do IBGE. Entre 2010 e 2019, a quantidade de aglomerados subnormais, como favelas e palafitas, foi de 6.329 em 323 municípios para 13.151 em 743 cidades. Essas moradias são caracterizadas por um padrão urbanístico irregular e pela falta de saneamento básico. Apesar de o programa Minha Casa, Minha Vida ter construído cerca de cinco milhões de moradias entre 2009 e 2018, a favelização brasileira ganhou força com a pandemia e o aumento do desemprego.
A pesquisa também observa um crescimento acentuado na insegurança alimentar no país: quase 20 milhões de brasileiros declaram passar 24 horas ou mais sem ter o que comer e outros 64 milhões vivem inseguros sobre a possibilidade de passar por isso. A pobreza extrema no Brasil atinge hoje 27,4 milhões de pessoas, com piora em todos os anos desde 2014. O último reajuste no valor médio dos benefícios do programa Bolsa Família ocorreu em julho de 2018, quando o valor da cesta básica em São Paulo equivalia a 71% do salário mínimo. No fim do último mês de agosto, tal equivalência chegou a 98%. Enquanto os produtos da cesta subiram 52% no período, o salário mínimo aumentou apenas 10,2%.
Esse quadro e a relação entre esses números e o que eles representam para o Brasil foram tema de entrevista com a professora da Escola de Arquitetura da UFMG Denise Morado, coordenadora do grupo de pesquisa Praxis - Práticas Sociais no Espaço Urbano, no programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa, desta segunda-feira, 18. Para a pesquisadora, não se deve pensar o aumento de favelas como um problema, “porque de alguma forma os moradores da cidade precisam morar em algum lugar”. O problema, segundo Morado, é anterior a essa forma de organização urbana. "A pandemia escancarou esse caos urbano, que é existente há décadas, em razão dessas desigualdades sociais, econômicas, territoriais, ambientais e políticas. E essas desigualdades são resultantes da forma que as cidades brasileiras são produzidas”, pontuou.
Morado destacou também o impacto da desigualdade social nesse cenário. “O que estamos vivendo há anos é o aumento da desigualdade no acesso aos direitos constitucionais, em razão da redução das políticas públicas sociais. E não há surpresa nisso. Mas essa condição estrutural de exclusão vai se agravar, se as políticas públicas não forem direcionadas para redução dessas desigualdades. E essa construção de políticas públicas deve se dar de forma efetiva, consistente e coletiva. O maior sintoma dessa exclusão estrutural é a fome, que vem como consequência naturalmente da redução da renda”, avaliou.