Cursos da saúde abrem discussões sobre retorno das atividades acadêmicas
Fórum on-line reuniu, nesta quarta-feira, gestores, estudantes e representantes de hospitais e da Secretaria Municipal de Saúde
O planejamento de retorno às atividades acadêmicas impõe o desafio de olhar com cuidado as necessidades de cada área do conhecimento e de cada curso. Esse é o eixo que perpassou as discussões do Fórum on-line Cursos da saúde: o planejamento da retomada de atividades de ensino com segurança, equidade e qualidade, o segundo organizado no âmbito do Programa Integração docente – ações formativas para as práticas pedagógicas. O evento, realizado por videoconferência na tarde desta quarta-feira, dia 10, reuniu gestores e estudantes de cursos da área de saúde, profissionais dos hospitais da UFMG e da Prefeitura de Belo Horizonte, que mantêm estreita interface com a Universidade.
O primeiro evento, ocorrido no fim de maio, promoveu reflexões gerais sobre a questão da retomada. O fórum de ontem inaugurou a série de discussões por campo de conhecimento, e a área da saúde foi escolhida porque “já vinha se organizando antecipadamente, trabalhando numa perspectiva interprofissional e realizando discussões em fóruns próprios”, afirmou a pró-reitora de Graduação, Benigna de Oliveira, na abertura do encontro.
“Consideramos também a simbologia da área que, no momento da pandemia, atua em defesa da vida”, acrescentou a pró-reitora. Ela disse que, apesar do momento difícil vivido pelo país, com crescimento do número de casos de Covid-19, sentia-se feliz com a mobilização da Universidade em prol do programa Integração docente, que, além dos recursos tecnológicos para o ensino remoto, preza pelos princípios da qualidade e da equidade.
“Agora, mais do que antes, temos de trabalhar de forma colaborativa”, defendeu a pró-reitora, que também enalteceu a participação no fórum de representantes dos hospitais Risoleta Tolentino Neves e das Clínicas e da Secretaria de Saúde de Belo Horizonte. “Isso mostra nosso compromisso com o SUS”, registrou Benigna.
Construção coletiva
A professora Cristina Alvim, assessora de Saúde da Reitoria e presidente do Comitê Permanente para Enfrentamento ao Coronavírus da UFMG, expôs um panorama do trabalho realizado pelos 14 cursos da área da saúde. Eles reúnem 7.551 estudantes, e suas atividades perfazem 55.410 horas de carga horária. “Trata-se de referências nacionais em suas áreas. São todos bem avaliados no Sinaes [Sistema Nacional da Avaliação Superior], no Enade [Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes] e nas visitas in loco”, afirmou.
De acordo com Cristina, o planejamento de retomada desses cursos está sendo feito em conjunto, pois compartilham recursos humanos, financeiros, infraestrutura, campos de estágio e políticas de ensino, extensão e pesquisa. “A pandemia revelou, com enorme força, que os problemas contemporâneos são extremamente complexos e não podem ser resolvidos apenas por uma área ou profissão”, disse a professora.
Subcoordenadora do curso de Biomedicina, a professora Maria Gabrielle de Lima Rocha tratou das possibilidades de construção do ensino remoto emergencial e projetou que não haverá um único formato. “No entanto, todas as propostas deverão primar pelos princípios da qualidade e equidade”, ela reforçou, rechaçando a migração para o modelo de ensino a distância. “EAD requer planejamento específico, profissionais capacitados, aulas on-line e gravadas, com regulamentação própria. A educação remota, por sua vez, não pretende ser definitiva, mas temporária", argumentou.
Gabrielle Rocha indicou questões sensíveis. “O padrão de aulas de 50 minutos, com duas aulas seguidas de 100 minutos, já era desafiador para professores prenderem a atenção dos alunos. Agora, certamente não poderão ter o mesmo formato. Professores deverão planejar e estruturar melhor suas aulas, transmitir informações em menos tempo e criar blocos de conhecimento”, sugeriu.
Os desafios que as aulas práticas representam no caso das formações da área de saúde foram abordados pelo professor Ênio Lacerda Vilaça, coordenador do curso de odontologia. “A prática clínica é fundamental, porque, além de espaço de ensino-aprendizagem, é também espaço de experimentação de sentimentos, vivências, relatos e construção de identidades”, afirmou.
Vilaça defendeu que cada professor avalie a particularidade de sua disciplina, sem perder de vista que se trata de uma situação emergencial e excepcional e que as soluções não devem ferir os princípios normativos. E sustentou que as condições de segurança de professores, estudantes, servidores – em especial os de grupo de risco –, de usuários dos serviços e acompanhantes precisam ser consideradas. “O curso de odontologia é exemplo de prática em que há alta exposição dos estudantes à geração de aerossóis. Por isso, é necessário repensar desde o fluxo de pacientes até o fluxo dos prontuários, que são manuseados por vários profissionais”, disse.
Consulta
As professoras Adriane de Medeiros e Sônia Viana, coordenadoras, respectivamente, dos colegiados dos cursos de Fonoaudiologia e de Gestão de Serviços da Saúde, fizeram apresentação conjunta dos resultados de questionários aplicados aos estudantes. A consulta buscou identificar condições de acesso digital, ambiente de ensino, situações de risco e saúde mental, entre outros aspectos.
“Entre os cursos de saúde, a taxa de resposta variou de 70 a 100%. Houve um grande esforço, feito inclusive por telefone, para contatar alunos e convidá-los a participar da pesquisa”, disse Adriane.
A exemplo do professor Vilaça, da Odontologia, Sônia Viana afirmou que as particularidades de cada curso precisam ser consideradas, e pessoas de grupos de risco deverão ter atenção especial. “Alunos com deficiência precisarão de apoio, e será necessário cuidar para evitar a evasão”, afirmou.
Estágios
A UFMG é parceira da Prefeitura de Belo Horizonte em várias políticas públicas. O município gerencia mais de 300 equipamentos de saúde, com cerca de 14 mil vagas de estágio ocupadas por 19 instituições parceiras – a UFMG é responsável pelo preenchimento da maioria delas. Diego Pereira, coordenador das ações de integração da saúde e serviço da Secretaria Municipal de Saúde, garantiu, no encontro, que a Prefeitura não poupará esforços para que os estudantes da Universidade realizem seus estágios curriculares obrigatórios. “Isso será feito com base no princípio de segurança máxima para todos os envolvidos nos processos de atendimento”, afirmou Pereira, informando que os estudantes engajados nas atividades de internato, que cumprem uma carga horária maior nos serviços de urgência e complementar, deverão retornar primeiro.
A volta de estudantes às atividades de estágios no Hospital das Clínicas e no Risoleta Tolentino Neves também foi avaliada durante o encontro. “A pandemia modificou o nosso fluxo de atendimento, tanto no hospital quanto nos ambulatórios, reduzindo o número de visitantes e a realização de cirurgias eletivas”, destacou Fabiana Kakehasi, do HC.
Ela informou que o planejamento para a volta dos estudantes está sendo feito em conjunto com as unidades acadêmicas, a direção do hospital, os comitês e Núcleos Docentes Estruturantes (NDEs). “O retorno tem de ocorrer com segurança física e emocional”, afirmou. A prioridade, segundo Fabiana, são os estudantes dos últimos períodos.
Rafael Calvão Barbuto, do Risoleta, indicou uma série de providências para garantir o retorno dos estudantes. “Temos de identificar alunos em situação especial, familiarizá-los com normas e formas de atuar e comportar-se, promover treinamentos e definir como será feito o acompanhamento de alunos com suspeita de Covid-19”, exemplificou.
Visão dos discentes
O estudante Marcus Vinicius Cruz, do 6º período de Medicina e integrante do Diretório Acadêmico Alfredo Balena (DAAB) e da atual gestão do Diretório Central dos Estudantes (DCE), destacou a iniciativa da UFMG de ouvir os vários setores da comunidade no processo de retomada e defendeu que os discentes participem dos comitês encarregados da elaboração das diretrizes.
Cruz lembrou que o espaço conquistado na Universidade por estudantes negros e populações vulneráveis não pode ser perdido no contexto da pandemia. “Essas pessoas que lutaram tanto para estar aqui não podem ficar para trás”, disse ele, que defendeu melhorias no acesso a sistemas digitais, como o Moodle, a adoção de mecanismos para contemplar estudantes no fim do curso, “que sofrem a pressão de entrar no mercado”, e a flexibilização de normas acadêmicas para evitar a evasão.
Raul Chaves, do oitavo período de Psicologia e integrante do DCE e do DA Fafich, fez uma defesa do Sistema Único de Saúde, “que tem livrado o Brasil de viver uma catástrofe ainda maior”. Ele concordou que é muito importante planejar as condições de retorno das aulas, mas ressaltou que o objetivo fundamental “é salvar vidas”.
No encerramento do evento, a professora Maria Flores, titular da Diretoria de Inovação e Metodologias de Ensino da Prograd (GIZ), apresentou o Programa Integração docente, parceria com o Centro de Apoio à Educação a Distância (Caed), com a Diretoria de Tecnologia da Informação (DTI) e com o Núcleo de Acessibilidade e Inclusão (NAI). As três instâncias já estão promovendo ações como oficinas, minicursos, fóruns on-line e webinars destinados à formação de docentes, discentes e servidores técnico-administrativos. As iniciativas estão reunidas na página do programa.
O fórum on-line, que durou quase três horas, foi transmitido em Libras e já teve cerca de 2,8 mil visualizações. O vídeo está disponível no canal da Coordenadoria de Assuntos Comunitários no YouTube.