Helena Nader defende retomada urgente dos investimentos em educação e ciência
Presidente da Academia Brasileira de Ciências abriu a 31ª Semana do Conhecimento em mais uma conferência do ciclo 'Futuro, essa palavra'
“Não se produzem mudanças de paradigma sem o empuxo de políticas públicas. Ou seja, o grande jogo da geopolítica será decisivo para o nosso destino”, afirmou a biomédica Helena Nader, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), citando o ativista urbano Philip Yang.
Helena Nader ministrou a conferência de abertura da 31ª Semana do Conhecimento da UFMG, ocorrida na manhã desta segunda-feira, dia 17, no âmbito do ciclo Futuro, essa palavra. A edição deste ano, com o tema UFMG, 95; Brasil, 200: Interseções, insere-se nas comemorações do aniversário da universidade e do bicentenário da independência.
A concepção de educação como “investimento” e não como “gasto” foi o ponto central de sua exposição. Segundo Helena Nader, que é professora na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), “o governo continua achando que o recurso colocado em ciência é somente gasto”. “Chegamos ao ponto de um ministro da Educação declarar que no Brasil temos doutores demais. O país precisa de políticas de Estado — para educação, ciência, inovação e tecnologia — e não de políticas de governo. Não podemos continuar à mercê de quem tem a caneta na mão”, afirmou a cientista, que aprofundou essa reflexão na sessão de perguntas, quando lembrou que o senso comum associa investimento às bolsas de valores, o que é uma ideia equivocada. Bolsa é ambiente de risco, argumentou ela, enquanto o emprego de recursos na ciência representa retorno garantido.
Recorrendo a um documento publicado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Helena Nader apresentou o gráfico de evolução do financiamento nas universidades federais, que cresceu vertiginosamente a partir de 2004 e atingiu seu ápice em 2011 — mas despencou a partir de 2015 e, hoje, assinala seu pior nível em 18 anos.
A biomédica também compartilhou algumas das conclusões do relatório do Fundo Monetário Internacional, segundo o qual o investimento em pesquisa básica, além de impactar a produtividade e a inovação, “ajuda a criar um futuro mais verde e a enfrentar as mudanças climáticas”.
“Os alunos de hoje serão os cidadãos, líderes, trabalhadores e pais do amanhã. Portanto, uma boa educação é um investimento com benefícios duradouros”, observou, apropriando-se de ideia contida no Relatório de Desenvolvimento Mundial, publicado em 2018 pelo Banco Mundial.
Sociedade do conhecimento
Conceito que tem ganhado relevância desde os primeiros anos do atual milênio, sociedade do conhecimento denomina um tipo de corpo social que, em vez de balizar seu progresso nos índices de produção agrícola ou industrial, passou a atrelar a prosperidade à capacidade de pesquisar, inovar e produzir informação.
Para Helena Nader, as políticas atuais do governo federal têm sido conduzidas na contramão dessa ideia. “Sociedades do conhecimento devem se basear em quatro pilares: liberdade de expressão, acesso universal à informação e ao conhecimento, respeito pela diversidade cultural e linguística e educação de qualidade para todos”, enumerou.
O Brasil é dotado, em seu entendimento, de potencial ambiental, alimentar, energético, territorial e humano para consolidar sua soberania e melhorar as condições de vida da população — mas isso depende das escolhas dos agentes governamentais. “Nossos recursos de poder, que não são poucos, precisam ser articulados em torno da construção do que queremos ser: uma sociedade justa e próspera, diversificada, tolerante, antirracista e ecologicamente sustentável”, concluiu.
Currículo
Helena Bonciani Nader graduou-se em ciências biomédicas (1970) pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em biologia (1971) pela Universidade de São Paulo (USP) e fez doutorado (concluído em 1974) em ciências biológicas pela Unifesp. Concluiu estágio de pós-doutoramento, na mesma área, pela Universidade do Sul da Califórnia, Estados Unidos (1977). Suas pesquisas abrangem glicoquímica e glicobiologia, com ênfase na estrutura e função biológica dos proteoglicanos heparina e heparam sulfato. É professora titular da Unifesp.
A professora integrou a coordenação de Biologia da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), de 2006 a 2018, presidiu a Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular (SBBq), de 2009 a 2010, e foi vice-presidente (2007-2011) e presidente (2011-2017) da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), onde atualmente ocupa a função de presidente de honra. Foi vice-presidente da ABC de 2020 a 2022 e assumiu, em maio último, o cargo de presidente. Ela também integra a Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp) e a Academia Mundial de Ciências (Twas).