Pesquisa e Inovação

'Iara' vai purificar as águas do Rio Doce

Equipamento desenvolvido no Departamento de Química beneficiará ribeirinhos afetados pelo desastre ambiental de Bento Rodrigues

Equipamento pode purificar 1 mil litros de água por hora
Equipamento pode purificar 1 mil litros de água por hora Arquivo do projeto

Há quase dois anos, foi registrado no subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, o maior acidente da mineração brasileira. A tragédia ocorreu após o rompimento da barragem do Fundão, da mineradora Samarco, que é controlada pelas empresas Vale e BHP Billiton, e provocou uma enxurrada de lama que atingiu várias cidades ao longo do Rio Doce. Cerca de 62 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração tornaram as águas da bacia impróprias para consumo.

Um grupo de estudantes de cursos de graduação da UFMG, liderado pelo professor do Departamento de Química Rochel Montero Lago, desenvolveu um protótipo de purificador de água capaz de limpar 1 mil litros de água em apenas uma hora. O aparelho é capaz de transformar a água do Rio Doce, que ficou lamacenta após o desastre, em água potável e própria para o consumo. O protótipo foi batizado de Iara, em alusão à lenda da sereia que habita as águas limpas do Rio Amazonas, e é abordado em reportagem publicada na edição 1996 do Boletim UFMG

“A água purificada pelo aparelho pode ser usada para beber, cozinhar, tomar banho e para a agricultura das famílias atingidas pelo desastre de Mariana. É um processo de tratamento para situações críticas, como catástrofes e acidentes ambientais”, afirma a estudante Maria Paula Duarte de Oliveira, do 6º período do curso de Química Tecnológica, uma das envolvidas no projeto.

O purificador conta com dois contêineres de 1 mil litros que realizam o tratamento da água de forma semelhante àquela feita pelas empresas de saneamento. Segundo Maria Paula, a diferença reside na velocidade do processo. “Enquanto a companhia de água realiza a purificação em três etapas, nosso aparelho é capaz de executar o processo completo em apenas uma etapa. Além disso, desenvolvemos um protótipo facilmente manipulado pelos ribeirinhos, que só precisam adicionar o produto no equipamento e aguardar enquanto a água é tratada”, diz.

O insumo ­aplicado no aparelho para purificar a água é o ­policloreto de alumínio. Em contato com a água poluída, ele desencadeia dois processos: coagulação e floculação. O primeiro agrega as impurezas presentes na água, e o segundo faz a sujeira decantar no fundo do purificador. Uma equipe de profissionais responsável pela manutenção do aparelho vai realizar o descarte da sujeira. “O aparelho foi desenvolvido para durar oito anos. Além de visitarmos as comunidades ribeirinhas para ensinar as pessoas a operá-lo, também faremos manutenções periódicas nos locais”, afirma a estudante de graduação.

Maria Paula acrescenta que o protótipo mudou o modo como ela vê o seu curso de graduação. “Por meio do projeto Iara, percebi que o conhecimento acadêmico pode, de fato, ser aplicado, e é isso que queremos fazer para o resto de nossas vidas. Resolver um problema que afeta seriamente as pessoas é algo que nos motiva. Queremos impactar positivamente as vidas dos ribeirinhos do Rio Doce”, afirma.

Equipe do projeto às margens do Rio Doce: Rafael Capruni, Sergio Tondato, Rochel Lago, Maria Paula Duarte e Thais Norte
Equipe do projeto às margens do Rio Doce: Rafael Capruni, Sergio Tondato, Rochel Lago, Maria Paula Duarte e Thais Norte Arquivo do projeto

Parcerias

A patente do Iara já foi depositada pela equipe da UFMG. O grupo também formalizou parceria com a H2O Especialidades, empresa que será responsável pela fabricação dos insumos e pela produção dos purificadores. Também está sendo firmada parceria com a Samarco, que pretende adquirir 200 aparelhos para distribuição entre os ribeirinhos.

 “Os moradores mais afetados pelo desastre dependem de caminhões-pipa que, infelizmente, não são enviados todos os dias para as suas comunidades. A Samarco vai financiar a produção e  o transporte de 200 aparelhos, enquanto nós ficaremos responsáveis pela manutenção e por ensinar os ribeirinhos a utilizá-los. A parte mais trabalhosa é a logística, visto que cada aparelho precisa de uma caminhonete para ser transportado”, conta Maria Paula.

A estudante destaca que o protótipo é versátil, pois pode ser adaptado para rios com características diferentes. “Mudando a concentração do insumo, chegamos a um produto que pode purificar rios poluídos por dejetos diferentes. Cada região ribeirinha tem uma necessidade, então visitamos as comunidades para entender o que elas precisavam. Já fizemos testes de campo, e as populações locais gostaram do aparelho. Ele é capaz de mudar a vida daquelas pessoas”, conclui Maria Paula Oliveira.

Luana Macieira / Boletim 1996