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Vera Menezes e Jacyntho Brandão recebem título de professor emérito

Contribuições da dupla transcenderam os limites da Faculdade de Letras

Vera e Jacyntho: muito além dos muros da Fale
Vera e Jacyntho: muito além dos muros da Fale Foca Lisboa / UFMG

Ele construiu uma vida acadêmica marcada pelo esforço em “ensinar a eterna vigência da literatura antiga”. Ela “ensinou a ensinar com novas tecnologias em permanente estado de inovação”. Foi dessa forma que a diretora da Faculdade de Letras, Graciela Inés Ravetti de Gomes, saudou os dois novos professores eméritos da UFMG em cerimônia realizada na noite desta quinta-feira, dia 27, no CAD2, campus Pampulha.

Ele é Jacyntho Lins Brandão, um dos mais reconhecidos especialistas em língua e literatura grega no Brasil. Ela é Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva, uma das pioneiras em educação a distância no país. De acordo com Graciela, além de terem construído trajetórias únicas e bem-sucedidas como professores, pesquisadores e formadores de novos docentes, os dois legaram contribuições que transcendem os limites da Fale e de suas áreas de atuação. “Eles participaram de decisões fundamentais da Universidade, foram atores importantes na administração geral da UFMG e ajudaram a encontrar soluções corretas durante épocas pacíficas – se é que as houve – e em inúmeras situações de crise”, analisou. E afiançou: “Com esta homenagem, a Faculdade de Letras alcança um novo patamar. Somos melhores com e por nossos professores eméritos”.

Sandra: amizade e influência acadêmica
Sandra: amizade e influência acadêmica Foca Lisboa / UFMG

A reitora Sandra Regina Goulart Almeida manifestou sua satisfação em presidir a cerimônia de outorga do título a dois professores desta que ela considera "sua Casa”. “São pessoas amigas que não apenas fazem parte da história da Faculdade de Letras, mas que tiveram um papel imprescindível para construir a Fale e a UFMG como hoje a conhecemos”.

Conselho e pão de queijo
Sandra afirmou que, embora não tenha sido aluna de Jacyntho, teve sua formação profundamente influenciada por ele. “Fui sua discípula por meio dos meus alunos que faziam seus cursos e me retornavam os ensinamentos, sempre fascinados com as descobertas mais recentes da literatura grega”. A influência não se restringiu ao plano acadêmico, destacou a reitora, que também disse se inspirar na conduta de Jacyntho como gestor universitário. “Quando vice-reitora, ele me deu um dos melhores conselhos que já recebi. Ao comentar que sentia muita falta de estar em sala de aula, algo que também lhe ocorria quando era vice-reitor, ele sugeriu: programe-se de modo que você consiga dar aulas na sexta-feira à tarde e assim se preparar para o fim de semana com algo que lhe dê prazer de fato. Posso dizer que este conselho – que foi seguido – foi imprescindível para trazer certa leveza ao, por vezes, árduo trabalho de gestão administrativa”, relatou.

A reitora definiu a professora Vera Menezes como uma “mestre brilhante, exigente, instigante e generosa para compartilhar os conhecimentos”. Colegas no então Departamento de Letras Anglo-germânicas, as duas cultivam uma longa amizade, temperada por uma tradicional iguaria mineira. Nos idos dos anos 1990, Sandra, então doutoranda em Chapel Hill, nos Estados Unidos, recebeu um pedido para acolher Vera, que se preparava para cursar doutorado-sanduíche na mesma instituição. Sabendo que a anfitriã sentia falta de pão de queijo, Vera Menezes enfrentou os obstáculos da imigração para entrar nos Estados Unidos com polvilho, queijo de minas e os demais ingredientes para preparar a iguaria. “Gentilmente, ela se declinava de comer para que eu pudesse, sozinha, saborear os pães de queijo”, comentou a reitora. Em seu discurso, Vera Menezes também contou sua versão dessa história.

Tomaz:
Tomaz destacou a paixão de Jacyntho por livros e bibliotecasFoca Lisboa / UFMG

Vice-reitor na gestão 1994-1998, Jacyntho Lins Brandão foi saudado pelo companheiro de Reitorado, Tomaz Aroldo da Mota Santos. Em seu discurso, o ex-reitor fez uma apresentação – “sumária, sumaríssima do alentado currículo” – do professor Jacyntho, concentrada em seu trabalho como vice-reitor. De acordo com Tomaz, o novo emérito desempenhou papel determinante na construção da política de moradia da UFMG, teve atuação destacada como coordenador da Comissão de Recursos Humanos da Andifes – entidade que foi presidida pelo ex-reitor – e foi um dos artífices do processo de aperfeiçoamento do Sistema de Bibliotecas da UFMG. 

As bibliotecas e os livros, aliás, são companheiros de longa data de Jacyntho. Segundo Tomaz, ele foi educado em ambiente familiar que valorizava a leitura. A mãe, professora e diretora escolar, estimulava o filho a frequentar a biblioteca do Convento das Carmelitas em Belo Horizonte. “Jacyntho cresceu entre livros e em ambiente de valorização da cultura, certamente determinante de sua vocação e paixão pela escrita, pelo livro e pela biblioteca”, destacou.

Deise:
Deise: gratidãoFoca Lisboa / UFMG

A professora Deise Prina Dutra iniciou sua saudação a Vera Menezes projetando na tela uma das flores que a homenageada cultiva em casa, um gesto, segundo ela, de reconhecimento a seu zelo em relação a tudo a que se dedica: família, animais, flores e carreira. Deise fez uma breve exposição do currículo de Vera que, antes de ingressar na Universidade, foi docente na Faculdade Isabela Hendrix e na PUC-Minas. “Mas foi aqui na UFMG, onde atua desde os anos 80, que se tornou uma das pioneiras – e com certeza – uma das referências no ensino e na pesquisa em educação a distância na área de Letras”.

Ainda segundo Deise Dutra, a professora Vera Menezes não se limitou a teorizar sobre a importância da educação a distância e se envolveu diretamente na criação de materiais para serem utilizados no ensino superior e na educação básica. Deise, que é professora da UFMG desde 1998, também expressou sua gratidão pela forma como foi recebida por Vera. “A partir de então, minha carreira foi permeada por muitas oportunidades que tive de convivência profissional e pessoal com Vera”, lembrou.

‘Não é coisa à toa’
Em seu discurso, Jacyntho Lins Brandão revelou que, por ocasião de sua aposentadoria, em dezembro do ano passado, vivenciou uma “crise de identidade”: não sabia se deixava de ser ou se continuava sendo professor a partir da nova condição. Só teve certeza de que preservara o status de docente quando recebeu a notícia de que seria homenageado com o título de emérito: “Pude voltar a dizer simplesmente, sem complexos, que ‘sou professor’, como fui e serei daqui para adiante, sem limites, mercê do gesto generoso de vocês", afirmou.

O novo emérito manifestou seu orgulho em pertencer a uma geração que contribuiu com o avanço e o aprimoramento da UFMG e recorreu a um verso de Folhetim, canção de Chico Buarque, para expressar esse sentimento: “Eu sou dessas mulheres que só dizem sim”. Mas, contrariando o verso seguinte da própria canção – “por uma coisa à toa” –, Jacyntho salientou que “dizer sim” à Universidade “jamais foi ‘por uma coisa à toa’”.

Jacyntho:
Jacyntho: sempre em obrigaçãoFoca Lisboa / UFMG

Lins Brandão citou dezenas de nomes de pessoas na Universidade que cruzaram o seu caminho em 40 anos de carreira acadêmica e foi muito aplaudido quando lembrou que o mais importante – "não foi coisa à toa" – foi ter passado “todos esses anos na sala de aula, com a juventude, a curiosidade, a inteligência e o deslumbramento dos meus alunos com o mundo”.

Ao fim do pronunciamento, disse que sua vida sempre “esteve mesclada” à UFMG, inclusive no plano pessoal. Foi no antigo prédio da Fafich, no bairro Santo Antônio, que ele conheceu a esposa, Magda, então estudante de filosofia. Além disso, seus três filhos cresceram, segundo ele, “em volta da UFMG e mesmo dentro dela”. E agradeceu mais uma vez a distinção com um “muito obrigado”, detendo-se no significado mais exato e profundo da expressão: “É assim que me sinto e me sentirei sempre em obrigação, amorosamente obrigado com todos vocês”.

Vera da UFMG
Vera Menezes citou Spinoza – “A alegria é um afeto pelo qual a potência de agir do corpo é aumentada ou estimulada” – para manifestar sua satisfação com a homenagem. Ela relembrou sua trajetória na UFMG, iniciada há 50 anos, quando ingressou como estudante da Faculdade de Direito, onde conheceu o marido, José Eduardo de Paiva.

Vera:
Vera: liberdade para experimentar e inovarFoca Lisboa / UFMG

A nova emérita plagiou a ex-reitora Ana Lúcia Gazzola – “sou Vera Lúcia Menezes de Oliveira de Paiva ‘da UFMG’” – e rememorou os tempos em que ela e seus colegas, românticos, resistiam às investidas da ditadura militar. “Nossas armas para defender a UFMG eram apenas nossos corpos e nossos sonhos de liberdade”.

Vera Menezes também recordou a solidariedade de amigos e colegas quando o marido, e depois ela própria, fizeram “estágios” no CTI de um hospital.  Também mencionou pessoas, como o ex-reitor César Barreto e o professor Alfredo Gontijo, que a ajudaram a enveredar pelo universo da teoria da complexidade e citou colegas de quem se aproximou em razão da causa dos direitos dos animais.

Em tom firme, Vera fez referência às atuais investidas sofridas pela Universidade. “Não podemos tolerar o arbítrio, a ameaça gratuita aos nossos dirigentes, o ataque à autonomia da universidade, as calúnias e a difamação contra nosso fazer científico e pedagógico”.

Ela concluiu sua mensagem relembrando o conteúdo do e-mail que enviou à  comunidade da Fale quando anunciou sua aposentadoria: “Foi na UFMG que me constituí como pesquisadora e onde tive muitas oportunidades e liberdade para experimentar e inovar no ensino, na pesquisa e na extensão. Só terei boas lembranças desse tempo e serei sempre muito grata à Universidade", agradeceu Vera Menezes.