Arte e Cultura

Luis Alberto Brandão lança ‘Espaços da obra literária’ neste sábado, em BH

Na fronteira entre crítica, teoria e criação literárias, livro desdobra reflexões que o ensaísta apresentou em ‘Teorias do espaço literário’, finalista do Prêmio Jabuti

'Espaços da obra literária', de Luis Alberto Brandão
'Espaços da obra literária', de Luis Alberto Brandão Imagem: Reprodução de capa

“Um livro de intensidades”. Assim o escritor e professor da Faculdade de Letras Luis Alberto Brandão define Espaços da obra literária, livro que ele lança em Belo Horizonte neste sábado, dia 9. Publicado pela Chão da Feira, o volume avança nas investigações que Brandão iniciara em Teorias do espaço literário (Perspectiva, 2013), obra que já é considerada um dos marcos dos estudos literários brasileiros contemporâneos. O lançamento de Espaços da obra literária – livro que o autor entende como um “irmão mais novo” do anterior – será às 11h na livraria Jenipapo, na rua Fernandes Tourinho, 241, na Savassi.

No livro de 2013, finalista do Prêmio Jabuti na categoria Teoria/Crítica literária, Luis Alberto Brandão propôs – tendo a teoria em si mesma como o ponto de convergência para a sua investigação – uma sistematização dos principais modos como a “categoria” espaço é utilizada nos estudos literários. Agora, no novo volume, ele aprofunda essa reflexão trazendo o conceito de obra – que ele caracteriza como uma “noção-problema”, em razão de suas ambivalências – para o centro de suas atenções. Sob essa modulação (e retomando o postulado de pensadores como Barthes e Foucault, entre outros), o professor da Fale recoloca em cena a indagação do que é, propriamente, uma obra – e também do que é um livro.

Em dado momento, o autor vai tratar especificamente do caráter ambivalente do livro “como ‘artefato corpóreo’ e, ao mesmo tempo, um ‘discurso a um público’”. Nisso, seu argumento dialoga com reflexões que o historiador francês Roger Chartier expôs na UFMG na série de conferências realizadas em setembro último. Nelas, Chartier falou sobre livros serem ao mesmo tempo um “bem material” (o produto físico, propriedade do comprador) e um “bem imaterial” (o discurso, propriedade do autor). Em seus ensaios, que conversam com a obra de Chartier e de outros autores, Luis Alberto Brandão vai perscrutar justamente essa dupla natureza do livro, isto é, a sua ambivalência como objeto e obra – assim como as ambivalências da própria “noção-problema” de obra.

Organização espacial do volume
O professor organizou seu livro em 17 capítulos, que se distribuem em duas grandes seções. Apesar de tematicamente consequentes, esses capítulos também podem ser compreendidos como ensaios de relativa autonomia, como se fossem variações em torno de um tema comum.

‘Espaços da obra literária’ desdobra e faz avançar reflexões que Luis apresentou em ‘Teorias do espaço literário’, finalista do Jabuti de 2014
‘Espaços da obra literária’ desdobra e aprofunda reflexões que o autor apresentou em ‘Teorias do espaço literário’, finalista do Jabuti de 2014 Foto: Arquivo pessoal

Denominada Pensar os espaços da obra, a primeira seção reúne oito capítulos, nos quais Brandão menciona a produção de autores como Marcílio França Castro, Zulmira Ribeiro Tavares, Orides Fontela e William Carlos Williams. Nesses capítulos, o pesquisador avança na investigação de conceitos como arte, ciência, matéria, corpo, espaço, substância, autoria, livro e obra e discute o papel dos vários agentes configuradores da obra que se situam além do autor, como o crítico, o editor, o leitor, o tradutor e o “curador literário”.

Na segunda seção, denominada Em obra: experimentos de leitura-escrita”, a empreitada crítica “expande suas margens”, como o próprio livro expõe em sua orelha, e o autor passa a apresentar o resultado de seus exercícios intelectuais não mais por meio de reflexões diretamente teóricas, mas por meio de exercícios de criação e experimentação. Composta de nove capítulos, esta seção reúne textos de caráter (em diferentes medidas) experimental, nos quais o autor faz esforços “de interpelação às maneiras possíveis de conceber e executar a atividade crítica”. Ali estão reunidos capítulos desenvolvidos de fato “nas margens da crítica, ou nas margens de suas margens, ambivalentemente propondo instituir, como válidos, modos não consolidados e não inusuais de fazer crítico”, conforme o próprio autor anota no capítulo de abertura da segunda seção, dedicado ao modernismo brasileiro.

Os capítulos que se seguem avançam na forma de notações biográficas e autobiográficas, de relatórios de trabalho, de perscrutação de correspondências, entre outras modulações. Neles, o autor investiga e comenta, mais ou menos detidamente, obras e vidas de autores como Augusto de Campos, João Gilberto Noll e Sérgio Sant’Anna. São reflexões de naturezas diversas, mas constantes no mote (o espaço, a obra) e na liberdade que se dão de fluir livres das amarras impostas pelo fazer teórico ortodoxo, como se ele buscasse alcançar justamente aquilo que, de saber, esteja situado além delas. Curiosamente, em razão dessa distinção entre as duas seções e do modo com que cada uma evolui internamente, o livro parece se estruturar como num percurso do direto ao indireto, do objetivo ao subjetivo, do teórico ao performático, do discursivo ao aforístico, do prosaico ao poético.

Do ponto de vista gráfico, o livro surge emoldurado por uma criação que articula cores, formas e espaços à moda de um Piet Mondrian (o mestre moderno dos usos da geometria do espaço nas artes plásticas de viés abstrato) envolvido com o Tetris, o famigerado joguinho de computador. O conjunto imagético de capa e contracapa é composto de bloquetes coloridos que se valem praticamente dos mesmos vermelho, azul e amarelo primários e do mesmo preto que Mondrian usava nos quadros de sua fase mais consagrada. Criação da designer e editora Luísa Rabello, esse projeto gráfico parece particularmente apropriado para um livro que, para debater o espaço na obra literária, encaixa e articula crítica, teoria e a própria criação literária.

Luis e a designer Luísa Rabello, responsável pelo projeto gráfico do livro
Luis Alberto Bradão e a designer Luísa Rabello, responsável pelo projeto gráfico do livro Foto: Arquivo pessoal

Investigação avançada transdisciplinar

O primeiro passo para a consolidação das reflexões que Luis Alberto Brandão apresenta em Espaços da obra literária foi sua residência de pesquisa no Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (Ieat) da UFMG de março de 2013 a fevereiro de 2014. No período, ele empreendeu uma investigação do espaço como categoria transdisciplinar, detentora de uma diversidade de funções e situada entre, através e além de disciplinas como filosofia, física, arquitetura, geografia, semiótica, linguística – e teoria da arte e literatura.

Além do citado Teorias do espaço literário (2013), Luis Alberto Brandão publicou, como ensaísta, Canção de amor para João Gilberto Noll (Relicário, 2019), Grafias da identidade: literatura contemporânea e imaginário nacional (Lamparina, 2005), também finalista do Jabuti, e Um olho de vidro: a narrativa de Sérgio Sant’Anna (Fale/UFMG, 2000), vencedor do Prêmio Nacional de Literatura Cidade de Belo Horizonte.

Como escritor de poesia e ficção, publicou Princípios de cartografia e outros poemas (Impressões de Minas, 2023), Chuva de letras (Scipione, 2008), vencedor do Prêmio Nacional de Literatura João-de-Barro e finalista do Jabuti, Tablados: livro de livros (7Letras, 2004), Manhã do Brasil (Scipione, 2000), finalista do Prêmio São Paulo de Literatura e do Prêmio Portugal Telecom de Literatura, e Saber de pedra: o livro das estátuas (Autêntica, 1999), vencedor da Bolsa Vitae de Artes.

Livro: Espaços da obra literária
Autor: Luis Alberto Brandão
Editora Chão da Feira
R$ 65 / 308 páginas

​Ewerton Martins Ribeiro