Migração favorece a multiculturalidade, diz professor refugiado
Fora do seu país há 13 anos, Félix Kaputu relatou sua experiência em palestra do Festival de Verão
Acadêmicos e ativistas políticos forçados a deixarem seus países de origem exemplificam uma nova forma de errância humana e intelectual que transforma o mundo em direção à "multitransculturalidade" e indica a direção de um mundo mais coeso. Essa análise foi feita na manhã desta quarta-feira, dia 13, pelo professor congolês refugiado na UFMG Félix Kaputu, durante o ciclo de debates O refugiado, este outro, realizado no Conservatório UFMG, como parte da programação do 13º Festival de Verão.
Segundo Kaputu, as causas das migrações de acadêmicos africanos e asiáticos são, principalmente, a violência tribal, a declaração de guerra e a perseguição política. “Muitos têm deixado seus países com a intenção de levar uma vida independente e expressar livremente suas opiniões”, observa o professor, que vive em Belo Horizonte graças ao programa International Cities of Refuge Network (Icorn), do qual a UFMG é a única universidade participante na América Latina. A iniciativa concede refúgio a artistas e intelectuais vítimas de perseguição e ameaça de morte em seus países de origem.
O congolês relata que muitos acadêmicos e artistas africanos foram exilados por causa de ditaduras que perseguem, particularmente, intelectuais e instituições democráticas. “Infelizmente, o posicionamento a favor da democracia, dos direitos humanos, das mulheres e das liberdades individuais nos põe em risco”, lamenta ele, para quem o circuito acadêmico funciona como um ambiente de refúgio para o artista que espera pela oportunidade de regressar. “A convite de colegas, especialmente do Hemisfério Norte, intelectuais costumam integrar círculos e associações acadêmicas. Assim, passam um tempo com seus pares e, em muitos casos, conseguem documentos, estada e até a cidadania”, contou ele, lembrando que, acima de tudo, “trata-se de uma questão de proteção da vida, da chance de retornar vivo para casa”.
Kaputu relatou que há mais de 13 anos acumula a experiência de se deslocar para lugares onde possa morar e trabalhar em segurança. Ele já residiu em países como Estados Unidos, Japão, Polônia, Bélgica e Holanda. “Fui levado a esse caminho devido à perseguição política que sofria em meu país, depois de ser preso e correr risco de morte”.
Olhar de fora
Segundo o professor, é comum que artistas exilados escrevam obras literárias que abordem, de alguma forma, a própria experiência. “Trabalhos de ficção têm muitas conexões com o mundo real, suscitando todo tipo de inspiração, sejam elas boas ou ruins”, comentou.
Kaputu afirmou, ainda, que a experiência de refugiado pode ter grande impacto sobre a a produção intelectual. “Quando os artistas conseguem entender o sentido de seus refúgios, eles passam a tirar completo proveito desses momentos para aumentar a produtividade e a capacidade de comunicação. Por isso, cada vez mais, desenvolvem trabalhos que acrescentam um olhar de fora e a sua própria perspectiva como um ser distante”, observou.
O diretor de Ação Cultural da UFMG, Rodrigo Vivas, que mediou o debate, enalteceu a postura de Kaputu, que trata, com um viés positivo, a possibilidade de continuar produzindo. "Isso é admirável", afirmou.
Félix Kaputu nasceu na República Democrática do Congo, mas deixou o país em 2006 após ter sido detido e posteriormente solto mediante pressão da Anistia Internacional, da comunidade acadêmica internacional e da imprensa. É professor universitário, escritor, doutor em Literatura Inglesa e Literatura Comparada.
Com o tema Desaplanando horizontes, o 13º Festival de Verão segue até esta quinta-feira, 14 de fevereiro. As atividades são realizadas no Centro Cultural, no Espaço do Conhecimento e no Conservatório UFMG.