Morre Ramayana Gazzinelli, pioneiro da física experimental em Minas Gerais
Professor fundou a pós-graduação em Física da UFMG, que hoje é reconhecida internacionalmente
O professor Ramayana Gazzinelli, do Departamento de Física da UFMG, pioneiro e protagonista no desenvolvimento da física experimental em Minas Gerais, morreu nesta segunda-feira, dia 2 de setembro. Ele tinha 91 anos e há alguns anos lutava contra a doença de Alzheimer. O corpo de Ramayana será velado nesta terça-feira, 3 de setembro, das 8h30 às 16h, no Cemitério do Bonfim (capela 1), onde será sepultado em seguida.
Nascido em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, em 1933, Ramayana completou o curso primário em Belo Horizonte, onde fez também o secundário e a universidade. Formou-se em 1956 em Engenharia Civil pela UFMG e, em 1958, especializou-se em Engenharia Nuclear. Cursou mestrado (1962) e doutorado (1964) em Física na prestigiada Universidade Columbia, de Nova York.
Na condição de primeiro doutor em Física atuante em Minas Gerais, retornou ao Brasil logo após o golpe militar e ajudou a criar um grupo de pesquisas em Física da Matéria Condensada e a iniciar a pós-graduação em Física na UFMG, onde implantou um laboratório de ressonância magnética eletrônica responsável pela formação de várias gerações de físicos em nível de mestrado e doutorado.
Na avaliação da reitora Sandra Regina Goulart Almeida, Ramayana foi uma das pessoas mais influentes na história da UFMG. “Ele nos deixou um legado muito importante e levou o nome da nossa universidade para vários lugares do mundo. A UFMG deve muito a ele, e o seu legado será honrado”, afirmou.
Fisgado
Um de seus discípulos, o professor Marcos Pimenta, também do Departamento de Física da UFMG, era um jovem estudante de engenharia civil quando conheceu Ramayana no fim dos anos 1970. “Ele mudou minha vida. Na época, eu assistia às suas aulas de introdução à Teoria da Relatividade e Física Quântica. Abandonei a engenharia para fazer física”, diz Pimenta, ao revelar que se sentiu “fisgado” não só pelo tema das aulas, mas pela própria figura marcante do professor.
Pimenta, hoje um reconhecido pesquisador na área de nanomateriais de carbono, foi orientado na iniciação científica e no mestrado por Ramayana. Entre as contribuições do mestre, cita o trabalho que desenvolveu para montar uma infraestrutura de pesquisa experimental em física na UFMG. “Ele elaborava projetos, captava recursos, foi um pioneiro. Eu e vários outros pesquisadores fomos beneficiados pela estrutura que ele criou. Seu trabalho foi fundamental para a pós-graduação em Física [nota 7 na avaliação da Capes] ter hoje reconhecimento internacional”, analisa Pimenta, que elogia também a capacidade didática de Ramayana. “Além de grande pesquisador, era também um excelente e dedicado professor e mantinha seu quadro nas salas de aula extremamente organizado”, recorda-se.
Em família
“Papai vivia a universidade. Na mesa do jantar, em casa, as discussões sobre a escolha de reitor tinham precedência, por exemplo, sobre a eleição para presidente”, testemunha um de seus quatro filhos, o professor Ricardo Gazzinelli, do ICB, e coordenador do CTVacinas.
Embora tenha trilhado uma carreira científica distinta da do pai – graduou-se em Medicina Veterinária e depois tornou-se uma autoridade em imunologia das doenças parasitárias e no desenvolvimento de vacinas contra doenças negligenciadas –, Ricardo não deixou de ser influenciado pela figura do físico, um “homem que lia muito sobre ciência, sobre política cientifica e sobre filosofia da ciência”.
Ramayana também participou ativamente da vida institucional. Ele integrou os órgãos colegiados superiores da UFMG (conselhos Universitário e de Ensino, Pesquisa e Extensão), coordenou a pós-graduação em Física, da qual foi um dos fundadores, e chefiou o Departamento de Física. Professor titular desde 1974, recebeu, em 1990, o Prêmio Fundep. Aposentou-se em 1995 e foi agraciado com o título de professor emérito da UFMG.
O professor deixou a esposa, Alzira Gazzinelli, que foi docente do Departamento de Matemática da UFMG, os filhos Ricardo, Gustavo, Letícia e Elisa, além de 11 netos e um bisneto. Ramayana também era tio das professoras Andrea e Flávia Gazzinelli, da Escola de Enfermagem.
Em dezembro de 2013, quando completou 80 anos, Ramayana Gazzinelli foi homenageado pelo Departamento de Física. Parte de sua trajetória foi relatada em perfil publicado no Boletim UFMG. E em depoimento para a série 90 anos de história, da TV UFMG, o físico falou sobre a reforma dos anos 1960 que transformou a configuração institucional e acadêmica das universidades brasileiras.