Novo marco legal do saneamento vai na contramão do que se vê hoje no mundo, afirma Leo Heller
Em entrevista à UFMG Educativa, relator especial da ONU para os Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário comentou pontos da nova legislação e analisou vetos de Bolsonaro
O novo marco legal do saneamento básico está gerando muita discussão. A lei foi sancionada nessa quarta-feira, 15, pelo presidente Jair Bolsonaro, que fez 11 vetos em trechos do projeto aprovado pelo Congresso Nacional. Entre outros objetivos, o texto prevê que, até o fim de 2033, haja o fornecimento de tratamento e coleta de esgoto para 90% da população e o de água potável para 99% dos brasileiros. A nova lei pretende ampliar a presença do setor privado na área. Atualmente, o saneamento é prestado majoritariamente por empresas públicas estaduais.
O relator especial dos Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário, da Organização das Nações Unidas (ONU), Leo Heller, tem se manifestado publicamente de forma bastante crítica à lei. Segundo o especialista, que atua como professor voluntário do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG e pesquisador do Instituto René Rachou, unidade regional da Fundação Oswaldo Cruz em Minas Gerais, o texto da lei é totalmente orientado no sentido de privatizar os sistemas de água e esgoto.
Governadores anunciaram que vão pressionar o Congresso para a derrubada de vetos de Bolsonaro, principalmente o veto ao artigo que permitia a renovação por 30 anos dos chamados contratos de programa, modalidade usada atualmente na prestação de serviços pelas companhias estaduais de saneamento. O presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (Democratas-AP), declarou apoiar a derrubada do veto.
De acordo com Leo Heller, caso esse veto presidencial não seja derrubado, toda delegação da administração dos sistemas de água e esgoto no Brasil deverá ser feito por meio de licitação, o que deve tornar os serviços de distribuição de água e saneamento ainda mais desiguais em todo o país.
“[Essa medida] abre espaço para uma ampla participação privada, principalmente naqueles municípios com maior atratividade econômica. O cenário que vislumbramos é: o setor privado atuando em municípios atraentes financeiramente e deixando os demais nas mãos do poder público”, afirmou em entrevista ao programa Conexões, da Rádio UFMG Educativa, nesta sexta-feira, 17.
Ainda de acordo com Leo Heller, a legislação aprovada vai na contramão do que se vê hoje em grande parte dos países do mundo, nos quais os serviços anteriormente privatizados estão sendo novamente estatizados.
Agora o novo marco legal do saneamento retorna ao Congressmio, que vai analisar os vetos assinados por Bolsonaro e poderá derrubá-los e retomar os itens inicialmente aprovados.