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Perfis de três professoras da UFMG compõem e-book que celebra mulheres cientistas

Santuza Teixeira, Vivian Costa, ambas do ICB, e Michelle Murta, da Letras, estão entre as dez pesquisadoras escolhidas para terceiro volume de 'Mulher faz ciência', publicado pela Fapemig

Michelle Murta:
Michelle: primeira professora surda efetiva da UFMGAcervo pessoal

O terceiro volume do e-book Mulher faz ciência, recém-lançado pela Fundação de Apoio à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig), que perfila mais dez mulheres cientistas, traz histórias e depoimentos de três professoras da UFMG. Elas são Michelle Murta, da Faculdade de Letras, primeira docente surda efetivada na Universidade, Santuza Teixeira e Vivian Vasconcelos Costa, ambas do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

A iniciativa marca o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, comemorado em 11 de fevereiro desde 2015, quando a data foi instituída pela Organização das Nações Unidas. O objetivo da publicação, que pode ser baixada gratuitamente, é inspirar jovens mulheres, despertar o interesse delas para a carreira científica e valorizar o trabalho de cientistas do sexo feminino. A publicação apresenta profissionais atuantes em diferentes áreas e que também representam as mulheres em sua diversidade.

Santuza e Vivian estão entre as cientistas escolhidas com atuação relevante no combate à pandemia de covid-19 no Brasil, ao lado da biomédica da USP Jaqueline Goes de Jesus, uma das responsáveis pelo sequenciamento do genoma do novo coronavírus em tempo recorde, e da presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Nísia Trindade Lima, primeira mulher a ocupar o cargo em quase 120 anos.

Aulas e pesquisa
“Houve uma mudança de entendimento das pessoas, elas têm menos medo de lidar com pessoas surdas e pessoas sinalizantes, e minha presença como professora contribui para isso”, afirma Michelle Murta em depoimento para o ebook. Graduada em Letras-Libras pela Universidade Federal de Santa Catarina, ela é mestre em Linguística pela PUC Minas e cursa o doutorado na UFMG, na mesma área. Michelle ingressou como docente em 2016 e passou a atuar no curso de Letras-Libras em 2019, quando a graduação teve seu primeiro vestibular.  

Em seu perfil no e-book, Michelle conta que usa muitos elementos visuais em suas aulas e que discussões são acompanhadas pelos intérpretes do Núcleo de Acessibilidade e Inclusão (NAI) da UFMG. A professora, que pesquisa, entre outros temas, a aprendizagem do português como segunda língua por surdos, considera crucial “mostrar para os pares que uma limitação não impede o trabalho de um professor e pesquisador”. “Minha presença na UFMG, e especificamente na Faculdade de Letras, contribui para a quebra de muitos preconceitos que rondam as línguas de sinais e também estimula os professores a se prepararem para atender o aluno surdo”, disse a professora ao Portal UFMG.

Michelle diz sonhar com uma sociedade bilíngue, embora isso pareça muito distante, ainda mais agora por causa da pandemia e do uso de máscaras, que dificulta a leitura labial e a comunicação. Mas se diz otimista quando fala da presença crescente de pessoas surdas nos espaços públicos. Muitas de nós, mulheres surdas, temos conquistado novos espaços, o que é imprescindível, “Como podem querer falar de nós sem nós?”, ela questiona. “Uma decisão tomada sem que sejamos ouvidas vai fracassar.”

Vivian Costa:
Vivian: dengue, zika e covid-19Acervo pessoal

Vivian Costa contou à produção do e-book que, durante a iniciação científica, passava horas no ICB, após as aulas de graduação em outra instituição. Cursou mestrado e doutorado na UFMG, quando enveredou pelas pesquisas sobre dengue, o que lhe valeu o Grande Prêmio de Teses da Universidade. Com estudos sobre os fatores que levam a diferentes quadros da doença, Vivian venceu em 2020 o Prêmio Para Mulheres na Ciência (Unesco, ABC e L’Oréal).

Vivian, que fez residências pós-doutorais na UFMG e na Universidade Nacional de Cingapura, em centro associado ao Massachusetts Institute of Technology (MIT), estuda atualmente processos de inflamação em diferentes contextos, abrangendo doenças como a dengue, a zika e a covid-19. “Sempre fui muito curiosa, queria saber mais das coisas, não apenas seguir protocolos”, afirma em seu perfil.

‘Teto de vidro’
“Infelizmente, iniciativas como essas [publicações como o e-book Mulher faz ciência] são ainda necessárias, e devemos nos perguntar por quê”, disse a professora Santuza Teixeira, em entrevista ao portal UFMG. Ela lembrou que, apesar dos avanços na participação de mulheres em atividades de ciência e tecnologia no Brasil e em outros países, ainda existe o "teto de vidro" que dificulta a ascensão delas a posições de maior relevância.

Santuza:
Santuza: mulheres são 25% de bolsistas 1A do CNPqSomos UFMG

“Somos, sim, presentes em grandes proporções nas estatísticas que retratam os níveis iniciais da carreira – estudantes de pós-graduação, pesquisadoras bolsistas de pós-doutorado e líderes de grupos de pesquisa. Entretanto, enquanto 58% dos bolsistas de Iniciação Científica são mulheres, somente 35% dos bolsistas de produtividade do CNPq (25%, no nível máximo [bolsista 1A]) são mulheres”, exemplifica a pesquisadora, que integra a coordenação do Centro de Tecnologia em Vacinas (CT-Vacinas) da UFMG.  

Para Santuza, preocupa especialmente que esses números não se alteraram de forma importante na última década. Ela cita também dados de 2020 da Open Box da Ciência, que revelam que 46% dos docentes de ensino superior no Brasil são mulheres, mas elas representam somente 17% dos membros titulares da ABC. “Precisamos pensar em formas ainda mais eficazes de atuação para que um dia, não muito distante, não sejam mais necessárias iniciativas para valorizar o trabalho das mulheres na ciência”, conclui a cientista, que no ano passado se tornou membro titular da Academia Brasileira de Ciências.

Vinculada ao Departamento de Bioquímica e Imunologia do ICB, Santuza Teixeira é doutora em Bioquímica pela Universidade de Lausanne (Suíça) e cursou pós-doutorado na Universidade de Iowa (EUA), onde começou sua dedicação às doenças parasitárias e tropicais.

O e-book Mulher faz ciência retrata também a diretora executiva do Centro Tecnológico de Desenvolvimento Regional de Viçosa (Centev), Adriana Ferreira de Faria, a professora do curso de Letras do Cefet-MG Ana Elisa Ribeiro, escritora indicada ao Prêmio Jabuti em 2020, a astrônoma Duilia de Mello, vice-reitora da Universidade Católica da América, em Washington (EUA), a paleontóloga Luciana Carvalho, uma das coordenadoras do resgate do acervo atingido pelo incêndio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e a física Zélia Maria da Costa Ludwig, uma das coordenadoras do Centro de Pesquisa de Materiais da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), também engajada em iniciativas para a redução das desigualdades nas ciências.

Com 48 páginas, o terceiro volume de Mulher faz ciência foi produzido por Alessandra Ribeiro, responsável também pela redação, e tem projeto gráfico de Camila Aringhieri.

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O e-book contempla cientistas de Minas Gerais e outros estados 
Reprodução

Itamar Rigueira Jr. / Com Assessoria de Comunicação da Fapemig)