Universidade quer voar mais longe com nova aeronave

Encarte

                             COMISSÃO ESPECIAL PARA ADAPTAÇÃO DOS ESTATUTOS DA UFMG 

                                                           EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1. HISTÓRICO

A Comissão Especial, indicada pela Comissão de Legislação e nomeada pela Reitoria para oferecer proposta de adaptação do Estatuto e Regimento da UFMG às diretrizes emanadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9394/96, iniciou seus trabalhos em agosto de 1997, tendo como parâmetro o prazo inicial para conclusão de seus trabalhos o mês de dezembro de 1997, dado o prazo limite indicado pela lei.

A exiguidade de tempo e competências então colimados não permitia outra condição para além de uma simples revisão do Estatuto de modo a proceder aos ajustamentos necessários às exigências da lei. Para a consecução desse objetivo, a Comissão enviou a todas as Unidades da Universidade e aos diversos setores que a compõe, informes sobre a tarefa que lhe era cometida, abrindo espaço e tempo para a recepção de sugestões para o seu trabalho. Recebeu inúmeras contribuições, algumas incorporadas, outras rejeitadas, mas todas cuidadosamente examinadas, tendo retornado a seus proponentes justificativas a respeito de sua decisão.

Dois fatos alteraram esse objetivo inicial. O primeiro se refere à extensão da data limite por decisão do Conselho Nacional de Educação, através da Resolução 02 de 13 de agosto de 1997 que estendeu o prazo até 21 de agosto de 1998. O segundo pela mudança na Reitoria da Universidade, o que exigiu da Comissão uma nova rodada de debates com os novos gestores da Universidade, com o objetivo de examinar as expectativas do reitorado para com o trabalho da comissão.

Uma reunião inicial com a nova Reitoria ocorreu quando a primeira versão do Estatuto a ser proposto se encontrava em seu formato final. A proposta então elaborada procurava implementar igualmente alguns ajustes no Estatuto para melhor facilitar a gestão universitária, apesar de perceber que a tarefa não era simples, pois não se tratava apenas de adaptar o Estatuto à Lei de Diretrizes e Bases referida mas de um amontoado de decretos, medidas provisórias, portarias, resoluções e pareceres que a sucederam, bem como a um conjunto significativo de outras normas emanadas da própria Instituição.

Dessa reunião surgiu a proposta para que a Comissão não se limitasse aos estreitos limites anteriormente anunciados, mas que procurasse elaborar uma proposta de Estatuto um pouco mais ambiciosa em dois sentidos: primeiramente, flexibilizar o Estatuto de tal modo a retirar do mesmo amarras institucionais ou de funcionamento que pudessem ser remetidas para normas infra-estatutárias. E em segundo lugar, mas com primazia do ponto de vista conceitual, que oferecesse uma norma estatutária apta a acolher uma possível legislação de Autonomia conforme a intenção do próprio governo e acima de tudo, independentemente dessa possibilidade futura, que abrisse à Universidade condições práticas para o exercício de sua autonomia.

Deste modo, a Comissão voltou a trabalhar em obediência a essas novas diretrizes e possibilidades de revisão estatutária. E após diversas outras reuniões com dirigentes da Universidade e re-exame dos textos estatutários já elaborados, chegou-se a esta versão (quinta), que agora entregamos à consideração da Universidade.

Gostaríamos nesta oportunidade de oferecer à consideração dos órgãos competentes da Universidade uma rápida exposição dos princípios que orientaram a feitura desta proposta.

OS PRINCÍPIOS QUE ORIENTARAM A CONSTRUÇÃO DO PROJETO

aO princípio da flexibilização

Seguindo uma tendência presente hoje nas concepções da moderna Legislação, a Comissão buscou desde o primeiro instante flexibilizar as normas estatutárias tendo por horizonte oferecer uma proposta capaz de promover uma organização básica da Universidade suficiente para que ela persiga os seus fins bem como elaborar as regras internas que permitam maior mobilidade na gestão e na administração dos seus meios. A flexibilização não pode ser entendida como perda de identidade legal abrindo-se a uma concepção fluida na estrutura e funcionamento da Universidade.

Por isto cuidou a Comissão de retirar do Estatuto quaisquer normas que fossem mais adequadas ao Regimento Geral e definir com maior clareza o tipo de normatização poderia se tornar mais eficaz quando remetidas ao instituto das Resoluções Complementares, Resoluções Comuns e em Normas Gerais. Deste modo, em consonância com esses princípios e as aberturas oferecidas pela própria Lei 9394/96, que possibilita, por exemplo, formas diversas de organização das Instituições de Ensino Superior, a proposta acolhida pela Comissão transfere ao Conselho Universitário a responsabilidade de aprovar na forma de Resolução Complementar, que tem força estatutária, desde a estrutura funcional e organizacional da Reitoria até a estrutura funcional de todas as unidades acadêmicas, bem como a estrutura da carreira do pessoal docente e técnico-administrativo.

Tal formato permitirá à Universidade decidir tanto reformular, quanto experimentar e consolidar formas alternativas de organização, sem que a cada iniciativa dessa natureza se veja obrigada a operacionalizar uma nova reforma estatutária. Consequência idêntica ocorre ao se retirar do Estatuto a definição das unidades que compõem a Universidade. São transferidas para Resoluções complementares essa definição. A Universidade através de seus órgãos decisórios e por Resoluções com força estatutária poderá criar, extinguir, fundir ou simplesmente suspender o funcionamento de qualquer unidade, sem que com isto se veja obrigada a promover reformulação do Estatuto.

Ganham igualmente maior flexibilidade a própria organização das Unidades acadêmicas. Por força da Lei 5540/68 a Universidade era obrigada a manter uma estrutura rígida de organização departamental. A nova L.D.B. oferece à Universidade a responsabilidade de estabelecer as regras de sua organização interna. Deste modo a proposta que agora entregamos retira do estatuto a definição da estrutura organizacional das Unidades Acadêmicas, atribuindo a cada uma a competência para propor ao Conselho Universitário através de sua Congregação sua proposta de estruturação. Isso permitirá, se o Conselho assim decidir, que haja mais de uma forma organizacional no interior da Universidade, produzindo os Institutos e as Unidades organização que atenda às suas próprias necessidades e possibilidades.

Há de se observar que toda essa reformulação implica em sensíveis mudanças em diversos órgãos colegiados e nas formas de sua representação. Não estabelecendo o estatuto a definição da estrutura da carreira docente, por exemplo, e nem a forma de organização departamental, ficam em aberto a constituição dos órgãos colegiados que dependem de representações diversas. Por consequência, não se pode definir de antemão a composição das Congregações nem a forma de representação docente nos órgãos colegiados. Para que a gestão colegiada da Universidade possa prosseguir sem rupturas, devem ser elaboradas Resoluções Complementares e Comuns para o pleno funcionamento da Instituição a partir da aprovação do Estatuto.

Deve-se observar que a Comissão não descurou desta questão. Assegurou no item das Disposições Transitórias, especialmente no art. 88 e parágrafos que haverá um prazo de 90 (noventa dias) a contar da vigência do Novo Estatuto para a completa regulamentação do mesmo, bem como, e principalmente, que até a sua devida regulamentação nos termos desse artigo, a estrutura atual da Universidade ficará mantida, inclusive assegurando os mandatos vigentes na data de sua entrada em vigor.

Convém anotar que o prazo real para que tal fato produza seus efeitos é muito mais extenso do que os 90 (noventa) dias previstos, pois, após a aprovação do Estatuto pelo Conselho Universitário, deverá o mesmo ser remetido aos órgãos da Administração Federal para ser devidamente aprovado, só entrando em vigor após sua publicação oficial. Isto indica que a Universidade terá todo o tempo anterior a essa aprovação oficial e mais os 90 (noventa) dias aludidos para operacionalizar as mudanças necessárias.

Não pretendemos esgotar todas as considerações em torno desta questão, apenas alguns exemplos são aqui levantados a título de explicitação das razões orientadoras seguidas pela Comissão. Tal orientação, pode-se perceber, procurou igualmente e acima de tudo, promover do modo mais extensivo possível, o exercício de Autonomia da Universidade. Obviamente não é possível antecipar a totalidade do que uma futura Lei de Autonomia pode abrir à Instituição, mas deseja-se nos limites e condições hoje existentes, exercitar a Autonomia possível. Vejamos como o princípio da Autonomia orientou o trabalho da Comissão.

b) O princípio da Autonomia

A questão da Autonomia se coloca hoje na ordem do dia da Universidade. De um lado por iniciativa do próprio Ministério da Educação que vem insistindo na intenção de assegurá-la às Universidades. De outro, antecipando a iniciativa do Ministério da Educação, pelo fato de que assim rezam a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases. E ainda mais porque cresce e ganha força essa consciência no pensamento universitário, fazendo coro no seio do movimento estudantil e dos funcionários. Tal consciência nos induz a uma decisão: criar as condições da Autonomia independentemente de qualquer lei reguladora futura.

Parece evidente que o Estatuto pode ser um instrumento para que essa iniciativa seja materializada. Deve-se lembrar que permanece uma exigência de ordem legal e da qual não há como a universidade dela se libertar, e que se refere às determinações de que o Estatuto da Universidade receba a chancela do órgão federal mantenedor. Compreende-se que em circunstâncias pregressas, especialmente frente a um Estado autoritário e centralizador, tenha procurado a Universidade se garantir de interferências externas definindo e detalhando a sua estrutura administrativa, formas de tomada de decisão, instâncias de definição política, estrutura de carreira, regimes de trabalho, concursos, composição dos órgãos administrativos e outros como uma estratégia eficiente para, numa situação de inexistência de Autonomia, pudesse se precaver contra intromissões no seu funcionamento regular.

No entanto, vivemos outro momento histórico. E a permanência dessa regulação se converte num engessamento da liberdade da Universidade para se organizar e para atender ao dinamismo do próprio movimento social. Nesse sentido corre-se o risco de, o que se constituía em defesa tornar-se em instrumento de auto aprisionamento. Deste modo, atendendo aos desafios contemporâneos, pode a Universidade assegurar uma estrutura básica de organização, bem como instituir foro próprio para tomada de decisão que preserve a correspondência entre o seu funcionamento, as demandas sociais e o seu próprio projeto acadêmico e político.

Esta é a razão pela qual a elaboração do novo Estatuto procurou prevenir a Universidade de manter amarras muito estreitas com os órgãos federais que continuam incumbidos de aprovar o texto estatutário. Permanecendo a estrutura ainda hoje existente isso coloca um elemento inibidor à autonomia da Universidade, pois cada nova mudança, cada nova iniciativa da Universidade para se reformar, submete-a à dependência de aguardar a chancela oficial do Ministério da Educação.

Procurou-se pois elaborar um Estatuto que sem ignorar as determinações mais universais das Leis nacionais, deixa para os próprios organismos constituídos pela Universidade a tarefa e responsabilidade final para planejar, executar e avaliar o seu próprio funcionamento.

Assim devem ser consideradas algumas iniciativas que ao longo do novo Estatuto podem ser identificadas. O Estatuto anuncia a estrutura básica da Universidade, como por exemplo, a existência de uma Reitoria, de Conselhos Superiores, de Unidades e de Órgãos colegiados. Também anuncia critérios para concursos tanto para ingresso nas carreiras docentes e administrativas quanto para recepção de novos alunos. No entanto deixa para Resoluções com força estatutária a definição dos órgãos que compõem a Reitoria, a natureza, definição e organização das Unidades, a estrutura da carreira e os regimes de trabalho. Isso significa que a qualquer momento, por decisão interna pode a Universidade alterar, criar novos órgãos, extinguir, estabelecer novos planos de carreira e regimes de trabalho por exemplo, sem a necessidade de autorização por parte do Ministério da Educação.

Estabeleceu-se um nível hierárquico das leis internas com maior precisão. No primeiro plano se encontram o Estatuto e o Regimento Geral da Universidade. E em seguida as Resoluções Complementares, com força estatutária já que dependentes do voto de 2/3 (dois terços) dos seus membros dos Conselhos Superiores, as Resoluções comuns, algumas exigindo voto de maioria absoluta e outras de maioria simples, conforme o caso, e por fim, as Normas Gerais, através das quais a Universidade poderá estabelecer as regras básicas para a Graduação, a Pós-Graduação, seleção de alunos, avaliação e outras.

Atente-se por último, como elemento inovador na estrutura da Universidade a sugestão para um novo órgão colegiado superior: o Conselho de Integração Comunitária. A comissão acolheu sugestão vinda diretamente de representantes junto ao Conselho Universitário para a criação desse órgão. Ele deverá se constituir como uma ponte institucional entre a Universidade e a Sociedade, exercendo uma espécie de articulação entre a vida interna da Universidade e a comunidade externa destinatária dos seus serviços, bem como das Instituições organizadas com as quais a Universidade se relaciona. Torna-se igualmente o órgão que indicará a representação externa para o Conselho Universitário, constituindo-se como um órgão independente da estrutura funcional da Universidade.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Algumas considerações adicionais devem ser evidenciadas neste instante. Haverá alterações na composição de alguns órgãos, como o Conselho Curador, por exemplo, na medida em que a Legislação estabelece que qualquer órgão colegiado da Universidade deve obedecer à proporção de 70% da representação docente. O mesmo princípio não se aplica, no entanto, ao Conselho de Integração Comunitária, exatamente porque ele se constitui como um órgão independente da estrutura funcional da Universidade.

Em outros lugares a proposta estatutária tentou traçar com maior clareza a competência dos colegiados superiores em relação a Cursos, nomeando com freqüência Cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado, ao invés da fórmula anterior e tradicional Cursos de Pós-graduação. Isto se deu porque pela nova Lei de Diretrizes e Bases, todos os cursos oferecidos a cursistas que já concluíram cursos de graduação, são considerados Cursos de pós-graduação.

Deste modo não apenas Especialização, mas também os diversos considerados como de Aperfeiçoamento e possivelmente qualquer curso de Extensão oferecido como aprimoramento profissional. Se permanecer a atribuição ao Conselho Universitário a responsabilidade para examinar, aprovar e extinguir qualquer curso dessa natureza, concorreria para um enorme congestionamento nas suas tarefas além de pouco flexibilizar as responsabilidades entre os diversos órgãos.

Deste modo, o Estatuto procura hierarquizar os níveis de responsabilidade do Conselho Universitário para com as ofertas regulares e permanentes da Universidade, atribuindo a outros níveis como o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e até mesmo às Congregações das Unidades, a decisão para com cursos restritos ao âmbito de suas competências, obedecidas normas gerais emanadas dos Conselhos Superiores. Entretanto, avoca o Conselho Universitário a responsabilidade para extinguir qualquer curso oferecido na Universidade, em função do seu papel regulador e político.

Espera, esta Comissão, ao entregar este trabalho ao debate na Universidade haver, por um lado, cumprido parte da missão que a ela foi confiada e, por outro, contribuído de maneira efetiva para uma reestruturação adequada da Universidade Federal de Minas Gerais. 

 

                                                Belo Horizonte, 14 de agosto de 1998 

                                                        Prof. Neidson Rodrigues

                                                                 Presidente