UFMG estréia na TV Universitária

Se essa rua, se essa rua fosse minha...

Conflitos entre moradores e a rua em Santa Tereza é tema de pesquisa na Escola de Arquitetura

O sociólogo Roberto DaMatta dizia que a rua deveria ser a extensão da nossa casa. Mas, na prática, essa frase soa mais como uma utopia. Enquanto a casa é vista como o espaço privado, a rua é tratada como terra de ninguém. É por isso que as pessoas jogam lixo no chão - o que não costumam fazer em suas próprias residências - danificam telefones públicos e cometem outros vandalismos. Mesmo em Santa Teresa, que tem fama de ser um bairro amado por seus moradores, as condições de habitabilidade das ruas estão cada vez mais difíceis. É o que constata o pesquisador e professor da Escola de Arquitetura, Renato César Ferreira de Souza, que fez um estudo de caso de um trecho da rua Mármore, bem no início do bairro que serviu de berço para o Clube da Esquina. 

"Com o crescimento desordenado de Santa Tereza, muitas atividades não podem ser desenvolvidas como antigamente", lembra o pesquisador, que é morador do bairro centenário. Nessa situação se estabelece o conflito entre as pessoas e a rua. O pesquisador catalogou 27 conflitos, como congestionamento de automóveis, ruído de bares e poluição visual provocada pelos anúncios dos comerciantes locais. Tudo isso transforma em dor de cabeça a simples tarefa de comprar pão na padaria do outro quarteirão.

Inserção

Para o arquiteto, a grande inovação desse tipo de estudo é a viabilização de uma leitura dos espaços urbanos baseada em experiências, observação participante e entrevistas mais flexíveis. "A racionalidade deixou de ser o único parâmetro de análise", diz. Ele afirma que o arquiteto, seja na concepção de casas e prédios ou de projetos de urbanismo e paisagismo, deve se empenhar em conferir condições de habitação ao espaço delimitado pela rua: "Não dá para construir uma casa sem pensar na sua inserção com a via pública." 

Renato Ferreira defende que a pesquisa se estenda a outros espaços da cidade, para subsidiar a adoção de políticas públicas que favoreçam a habitabilidade, suprindo carência que não é exclusiva de Santa Tereza e se estende a grande parte da Região Metropolitana. O pesquisador acredita que será possível resgatar certas práticas que "recuperem a humanidade perdida pela rua", como deixar janelas abertas sem temer os perigos que possam entrar por elas; as animadas conversas entre vizinhos nas portas das casas; e o inocente footing dos casais pelas praças e calçadas.

Alexandra Leite