Boletim

Nº 1941 - Ano 42 - 23.05.2016

Ciência em quadrinhos

HQs para ensinar e aprender ciência

Pesquisa desenvolvida na FaE analisa impacto da linguagem dos quadrinhos na fixação de conceitos científicos

Engajar os alunos na leitura sobre ciências é um desafio para professores dos primeiros anos escolares. Por outro lado, crianças e adolescentes costumam apreciar e dedicar seu tempo à leitura de gêneros lúdicos como as histórias em quadrinhos (HQs). Com base nessas impressões, a educadora Adriana Araújo Dutra Rodrigues, da Faculdade de Educação (FaE), desenvolveu estudo sobre a viabilidade de ensinar ciência lançando mão de HQs na sala de aula em lugar dos textos científicos convencionais. 

“Procurei averiguar se a HQ predispõe o aluno ao aprendizado e se sua linguagem permeia o ensino a ponto de ser relembrada mais tarde, em contexto avaliativo”, afirma a autora da dissertação O impacto da linguagem dos quadrinhos no ensino de ciências, defendida no Programa de Pós-graduação em Educação da FaE.

Uma turma de primeiro ano do ensino médio, da qual Adriana havia sido professora em 2014, foi escolhida para participar da investigação. Produzida pela própria pesquisadora, uma HQ que trata do conceito de densidade foi usada no trabalho, que se deu em três momentos e foi registrado em vídeo. ­Conforme o enredo da HQ em questão, a mensuração da densidade foi necessária para identificar o material de que um objeto é feito.

 “A princípio, os alunos leram a HQ, foram convidados a recontá-la e a resolver uma situação-problema nela inspirada. Três semanas depois, foi aplicada uma avaliação escrita e, passados mais dois meses, foi feita uma atividade de revisão da prova”, descreve Adriana.

De acordo com a autora, a solução presente na HQ foi aludida pelos alunos em diferentes momentos da investigação. “Ficou visível que os estudantes recorreram a elementos da história carregados de valor sentimental e deles se lembraram em aulas subsequentes. Esses elementos eram justamente aqueles que ajudariam os estudantes a compreender o procedimento experimental e o conceito de densidade”, relata Adriana.

Em uma das histórias criadas por Adriana Rodrigues, quatro adolescentes, com precários recursos de laboratório, tentam descobrir se uma estátua de ouro maciço fora falsificada
Em uma das histórias criadas por Adriana Rodrigues, quatro adolescentes, com precários recursos de laboratório, tentam descobrir se uma estátua de ouro maciço fora falsificada Adriana Rodrigues

Segundo documentação produzida pela pesquisadora, durante a primeira etapa da pesquisa, 15 dos 25 estudantes participaram com comentários – comportamento, segundo ela, pouco comum na turma investigada. Na prova escrita, 20 jovens utilizaram corretamente o conceito de densidade. Na atividade posterior de retomada do conteúdo, dois entre cinco grupos de alunos mencionaram a HQ em suas respostas. 

Interações humanas

“Percebi que os alunos recuperaram a solução proposta pelos personagens da HQ sempre que depararam com um problema semelhante. Possivelmente, a história ficou presente na memória dos alunos porque sua natureza narrativa se assemelha à linguagem das interações humanas”, observa Adriana. 

Impregnados de valor emocional, os elementos da narrativa são retidos de forma mais duradoura

Mais do que um meio atrativo para incorporação dos conceitos científicos, a autora acredita que as HQs funcionam como mecanismo de desenvolvimento de uma narrativa interior, que auxilia na acomodação do conhecimento. “Impregnados de valor emocional, os elementos da narrativa são retidos de forma mais duradoura”, acrescenta. 

Adriana Rodrigues acredita que sua pesquisa pode ser útil para quadrinistas interessados em contribuir com o ensino de Ciências. “Os resultados podem fomentar a criação de materiais cada vez mais adequados”, argumenta a educadora, que informa ter obtido efeitos ainda mais satisfatórios com a incorporação das HQs em sala de aula no ano de 2016. “Tenho expectativa de que a mídia dos quadrinhos seja aperfeiçoada e futuramente esteja mais presente nas aulas de ciências, contribuindo não só para aumentar o interesse e a motivação dos alunos, mas também para melhorar o processo de aprendizagem em si”, considera.

Vampiros e nerds

Desde 2006, Adriana mantém o blog de tirinhas Bram & Vlad, “com narrativas de viés humorístico sobre vampiros, voltadas para o público nerd e pessoas apaixonadas”, como ela define. Segundo a professora, a página costuma receber de 30 a 50 visitas diárias, e muitos de seus seguidores são jovens em idade escolar. O endereço é bramevlad.blogspot.com.br.

Matheus Espíndola