Universos em expansão

Reflexões para a cidade

Décima segunda edição do Festival de Verão põe em cena poder do conhecimento de transcender limites

Nada – nem ninguém – se mantém igual para sempre: instante após instante, seres e universo ampliam permanentemente as suas fronteiras, ideia que teria sido sintetizada pelo filósofo pré-socrático Heráclito na expressão “a única constante é a mudança”. Essa noção de que intelectos, corpos, identidades, tecnologias, matrizes culturais e arte se expandem é o mote que orienta as atividades do 12o Festival de Verão da UFMG, que será realizado nesta semana (5 a 8 de fevereiro), em Belo Horizonte. Com a temática, a Universidade espera chamar a atenção para a forma como o conhecimento expande a existência e a própria percepção que se tem dela. 

Universos expandidos é um desdobramento do tema do ano passado, Universos (in)visíveis”, informa o professor Juarez Guimarães Dias, coordenador geral do Festival. Em 2017, a intenção era revelar os aspectos da realidade que, mesmo ao alcance dos olhos, ficam invisibilizados. “Agora, queremos pensar a forma como se entende a produção de conhecimento e como as tecnologias têm expandido a percepção que temos da nossa própria vida”, diz.

Segundo Juarez Dias, que é professor do Departamento de Comunicação Social da Fafich, a ideia é, também, pôr em discussão os investimentos que a UFMG faz no sentido de expandir, em direção à cidade, o conhecimento que ela mesma produz. “Retomando como ponto de partida a ideia de ‘universos’, vamos falar da expansão das
identidades de gênero, das culturas, das etnias e do teatro”, ilustra.

As atividades do 12o Festival de Verão da UFMG estão distribuídas entre o Centro Cultural, o Espaço do Conhecimento, o Conservatório de Música e o campus Saúde, na região centro-sul de Belo Horizonte. A programação cultural inclui espetáculo teatral, de dança e música, além de exposição e intervenção artística. O eixo mais acadêmico do evento está estruturado em oficinas e palestras. A novidade da edição fica por conta da Residência criativa, oferecida exclusivamente para crianças 

Festa de encerramento visa à transcendência por meio da dança, sem uso de qualquer tipo de droga.
Festa de encerramento visa à transcendência por meio da dança, sem uso de qualquer tipo de drogaDivulgação

Além dos campi
Por meio de palestras, o Festival de Verão tem levado o ensino da Universidade a se expandir para além de sua comunidade acadêmica, de forma a alcançar o público da cidade que não frequenta os campi da instituição. Mais uma vez, uma série de comunicações será realizada no miniauditório do Conservatório, para possibilitar o diálogo da comunidade da cidade com algumas das mais arrojadas reflexões engendradas no ambiente universitário e fora dele.

“A ideia é levar o conhecimento até outros espaços e públicos que não sejam os exclusivamente acadêmicos. Queremos que a cidade tenha acesso a uma mostra exemplar de nossas atividades. Nesse sentido, o que promovemos com as palestras é uma expansão do conhecimento”, afirma Juarez Guimarães Dias.

A ideia é levar o conhecimento até outros espaços e públicos

Serão duas palestras por dia, reunidas por temáticas, que guardam afinidade entre si. As comunicações da terça-feira, 6, vão tratar da noção de sagrado no cotidiano indígena e do lugar do negro nas artes cênicas. No dia seguinte, quarta, serão abordados o aspecto físico-quântico do processamento, armazenamento e
transporte das informações e a ideia de ordenação de saberes em busca do entendimento de nossa relação com o universo e a vida, o chamado “antropocosmos”.

O ciclo de palestras se encerra no dia 8 com duas comunicações. Na primeira sessão, o fotógrafo ativista Gael Benitez vai apresentar seu relato pessoal e convocar outros relatos de pessoas transmasculinas, de forma a promover discussões acadêmicas sobre o assunto. Na sessão seguinte, a professora Maria da Conceição Vieira Moreira, da Faculdade de Medicina, falará sobre a experiência brasileira e mundial de transplante de órgãos. “Pouca gente sabe, mas o Brasil é um dos países com experiências mais bem-sucedidas nessa área”,
afirma o coordenador geral.

As palestras serão ministradas em duas sessões consecutivas, às 10h e às 11h. O Conservatório UFMG fica na Avenida Afonso Pena, 1.534, Centro. O Centro Cultural está localizado na Avenida Santos Dumont, 174, em frente à Praça da Estação. O Espaço do Conhecimento fica na Praça da Liberdade, 700, Savassi.

Informações sobre o Festival também podem ser obtidas no Facebook, no Twitter e no Instagram.

Para não perder
A programação cultural será aberta nesta segunda, 5, às 20h, com o show The Pulso in Chamas, com músicas e discursos que põem em cena o empoderamento negro e LGBTQIA (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexuais, Assexuais) e a representação da mulher na sociedade. No dia seguinte, 6, terça-feira, o Centro Cultural receberá o espetáculo Territórios, da companhia Teatro 171, às 20h. Sob a perspectiva do teatro-documentário, a peça aborda temas complexos, como as invasões de território, a questão dos refugiados e o crime ambiental que resultou na tragédia de Bento Rodrigues.O espetáculo terá nova sessão no dia seguinte, 7, quarta-feira, no mesmo horário e local.

No dia 8, quinta, às 19h, no Conservatório, será apresentado o solo Corporeidades afro-brasileiras e africanas, da artista Júnia Bertolino, sucedido por Encorpore-se, espécie de festa-ritual focada na dança, que convida os participantes a buscar a transcendência por meio da música e do corpo, sem o uso de qualquer tipo de drogas
– nem mesmo as lícitas, como o álcool. Na manhã do mesmo dia, às 9h, o campus Saúde vai sediar a intervenção artística O nada e várias atoíces, com concepção e curadoria da mediadora em arte e cultura Ana Marthinica.

Residência criativa
Uma das novidades desta edição é a Residência criativa, que está sendo oferecida para meninos e meninas de sete a 12 anos. Em Cartografias afetivas para crianças – 90 anos UFMG, esses pesquisadores-mirins serão levados a percorrer a região centro-sul de Belo Horizonte com o objetivo de investigar e inventar modos de cartografar os edifícios mantidos pela UFMG, como o Conservatório, a Escola de Arquitetura, o Centro Cultural, o Espaço do Conhecimento, a Escola de Medicina e a Faculdade de Direito. As inscrições são abertas ao público amplo.

“Nossa ideia é explorar, em cada edifício, algo que tenha a ver com as atividades nele desenvolvidas”, explica o professor Adriano Mattos, da Escola de Arquitetura. “Na Medicina, vamos levar as crianças à área de necrópsia, enquanto no Conservatório faremos atividades relacionadas com o som. Na Arquitetura, pretendemos discutir questões estruturais por meio de exercícios, como especular que estrutura arquitetônica seria necessária para que se pudesse soltar um ovo do segundo andar de um prédio, de forma que ele chegue ao chão sem se quebrar”, exemplifica Mattos.

No primeiro dia, as crianças serão levadas à ocupação Carolina Maria de Jesus, localizada na esquina da Avenida Afonso Pena com a Rua Rio Grande do Norte, na mesma região. “Vamos promover uma interação das crianças da oficina com as da ocupação. Em seguida, faremos o convite para que as crianças da ocupação participem das demais atividades da oficina. Na Faculdade de Direito, nossa intenção é simular, com todas as crianças, uma espécie de julgamento, de forma que elas possam discutir temas relacionados às ocupações e entender melhor o universo em que estão inseridas”, explica.

Durante intervenção, mediadores oferecem laranjas aos transeuntes.
Durante intervenção 'O nada e suas atoíces', mediadores oferecem laranjas aos transeuntesFernanda Falabella

Adriano Mattos Corrêa ministra a Residência criativa junto do ator Gabriel Castro Cavalcante, que pesquisa performances urbanas.Uma mostra final da atividade será apresentada na quinta-feira, 8,às 17h, no Conservatório UFMG. 

Júnia Bertolino vai ministrar oficina sobre corporeidades afro-brasileiras e apresentar espetáculo solo no Conservatório.
Júnia Bertolino: corporeidades afro-brasileirasTatiane Martins


Em todas as direções
As oficinas vão expandir os conhecimentos dos participantes nas mais distintas direções, como a da espiritualidade indígena, da escrita poética, das histórias em quadrinhos, das artes visuais, dos movimentos corporais de referência afro-brasileira, dos ciclos lunares e da coreografia para além da visão.

Duas oficinas tratam especificamente de questões relacionadas ao universo das deficiências: Criação de material didático para práticas de musicalização para surdos, destinada a estudantes e profissionais da música, e Meios de comunicação utilizados com a pessoa surdocega, aberta ao público amplo. Os ambientes que abrigam as oficinas são o Centro Cultural, o Conservatório e o Espaço do Conhecimento. 

Ewerton Martins Ribeiro