Pesquisa e Inovação

Epidemiologista vê dificuldades na incorporação de vacinas contra a dengue pelo SUS

Em conferência do Medtrop-Parasito, o médico José Geraldo Ribeiro falou sobre as possibilidades de imunização em massa

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José Geraldo Ribeiro: alto custo e baixa efetividade seriam inconvenientesFotos: Foca Lisboa / UFMG

A necessidade de proteger a população contra os quatro subtipos de dengue e o enorme contingente de potenciais vítimas do mosquito Aedes aegypti estão entre as razões que, na visão do médico e professor José Geraldo Leite Ribeiro, tornam difícil a incorporação da vacina contra a doença pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

“As vacinas que vêm sendo pesquisadas têm perfil aceitável. Mas a proteção contra os quatro sorotipos é necessária. Isso porque, além de haver o revezamento de prevalência entre eles, existe o temor de que a imunização contra somente um tipo possa agravar os riscos dos demais”, justificou José Geraldo, durante a conferência Vacinas para a dengue: um futuro próximo para o SUS?, realizada na manhã desta quarta-feira, dia 31, integrando a programação do congresso Medtrop-Parasito.

O tamanho do público-alvo é visto como um obstáculo pelo epidemiologista, especialmente porque é difícil mobilizar adolescentes e adultos para receberem doses repetidas. “O público visado seria em torno de 100 milhões de pessoas, o que implicaria enorme custo. Além da incerteza quanto à viabilidade de financiamento da empreitada, não estou certo de que ela seria efetiva, a ponto de reduzir consultas, hospitalizações e óbitos”, avalia José Geraldo, graduado e mestre em Medicina pela UFMG e professor da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e da Faculdade de Saúde e Ecologia Humana.

De acordo com o professor, sua experiência em campanhas de imunização demonstrou que, fora da faixa etária pediátrica, a vacinação só gera adesão satisfatória quando as equipes de saúde “vão aonde o público está: fábricas ou universidades, por exemplo”. “Por essas e outras razões, não me sinto seguro, por enquanto, para afirmar que há possibilidade de incorporação das vacinas contra a dengue em nossa agenda”, considera.

Contexto
Segundo José Geraldo, mais de 1 milhão de casos prováveis de dengue são registrados por ano no Brasil, e a circulação de vários tipos de vírus torna o contexto ainda mais preocupante. “Há dengue tipo 2 circulando na nossa região, onde a população, há pouco tempo, vivenciou uma grande epidemia do tipo 1. Isso vem sucedendo ano após ano”, afirmou.

Outro problema para o qual têm sido dedicados “reiterados esforços” diz respeito ao atendimento adequado aos casos de dengue. Segundo ele, o elevado rodízio de profissionais da saúde básica torna sem efeito os programas de treinamento, por exemplo, quanto à classificação do tipo da doença. “Recém-graduados são contratados como médicos da família, posto no qual permanecem por seis ou oito meses, até que saem para cursar a residência”, observa José Geraldo.

O despreparo dos profissionais também é considerado pelo professor como um dos fatores responsáveis pelo elevado número de óbitos. “Não falta equipamento nem oportunidades de atendimento, mas é comum o paciente ser liberado depois de seis horas recebendo hidratação. Quando a febre diminui, ele pensa que melhorou, mas no quinto dia fica ‘chocado’ [termo usado para se referir a pacientes com deficiência de suprimento sanguíneo em órgãos e tecidos]”, alerta José Geraldo Ribeiro.

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Conferência integrou último dia da programação do Medtrop-Parasito
Fotos: Foca Lisboa / UFMG


Balanço
O Medtrop-Parasito 2019, que se encerra nesta quarta-feira, dia 31, unificou o 55º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical e o 26º Congresso Brasileiro de Parasitologia. Ao todo, cerca de 100 horas foram dedicadas à discussão de doenças negligenciadas. No Brasil, há prevalência de 18 das 21 listadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Os palestrantes abordaram resultados ou o andamento de pesquisas científicas para desenvolver vacinas, novos tratamentos, novos testes de diagnóstico para doenças como leishmanioses, hanseníase, dengue, zika, febre chikungunya, febre amarela, doença de chagas, as helmintoses (ascaridíase, teníase e esquistossomose), sífilis e HIV, entre outras. 

O público estimado chegou a três mil pessoas, entre profissionais da saúde, pesquisadores e estudantes.

Matheus Espíndola / Com Assessoria de Imprensa do Medtrop-Parasito