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Serviços de assistência à saúde mental correm risco no Brasil com "revogaço" do Governo Federal

Em reunião do Conselho Nacional de Saúde, o Ministério da Saúde apresentou um documento que pretende revogar 99 portarias que sustentam a atual Política de Saúde Mental no Brasil

No último dia 04 de dezembro, em uma reunião do Conselho Nacional de Saúde, o Ministério da Saúde apresentou um documento que, caso seja implementado, revogará 99 portarias que sustentam a atual Política de Saúde Mental no Brasil. As portarias foram editadas entre 1991 e 2014 e são resultado de anos de lutas pelos direitos de pessoas que precisam de assistência à saúde mental no país. Em 2001, por exemplo, entrou em vigor a Reforma Psiquiátrica Brasileira. Ela tem base na Declaração de Caracas, de 1990, divulgada pela Organização Pan-Americana de Saúde e a Organização Mundial da Saúde, que propunha uma reestruturação na atenção psiquiátrica na América Latina e a implementação de novas políticas para os serviços de saúde mental. 

Entretanto, todos esses avanços correm o risco de deixarem de existir por causa de uma série de revogações de portarias articuladas pelo Governo. "Nós tínhamos uma série de portarias, de legislações, de construção de serviços e de rede de atenção psicossocial que caminhou durante muitos anos na mesma direção; que era ir fechando progressivamente leitos de hospitais psiquiátricos terceirizados que não são lugares adequados para atender as pessoas. São lugares de muita brutalidade, muita violência e solidão", explica a médica psiquiatra Ana Marta Lobosque, que também é doutora em filosofia e ativista na luta antimanicomial. Só que a eliminação desses leitos não deixou os pacientes desamparados. Cada município desenvolveu uma rede de acompanhamento. Em Belo Horizonte, por exemplo, há os Cersams, Centros de Referência em Saúde Mental, que conta com atendimento de urgência 24 horas por dia. 

As dificuldades em continuar com os avanços positivos na assistência em saúde mental começou em 2017, no governo Michel Temer. "Surgiram novas portarias muito retrógradas. Elas não revogam as anteriores, mas imprimem uma outra direção que não é legal, como, por exemplo, aumentar o financiamento de hospitais em vez de aumentar os dos serviços para a rede", destaca Ana Marta. 

Diante desses fatos, que podem prejudicar as políticas de assistência, mais de mil psiquiatras assinaram um manifesto, que ficou conhecido como "Manifesto dos Mil", protestando contra a Associação Brasileira de Psiquiatria, o Conselho Federal de Medicina e o Ministério da Saúde. De acordo com Ana Marta Lobosque, a Associação Brasileira de Psiquiatria nega a participação no documento com as portarias que podem ser revogadas, mas no texto consta o nome da entidade. "Por isso, estamos em uma ampla mobilização para evitar que esse revogaço aconteça, porque ele seria muito catastrófico para o cuidado em saúde mental no Brasil", completa a psiquiatra Ana Marta.  

Ainda sobre a Associação Brasileira de Psiquiatria, Ana Marta Lobosque faz outras observações. “É uma associação que há anos está na mão de pessoas muito retrógradas, que não dispõem de conhecimento científico. Inclusive uma das questões que o nosso manifesto critica é a falta de embasamento epidemiológico, demográfico, conceitual e teórico para propor”.  A médica participou do programa Conexões e comentou ainda sobre a importância dos direitos das pessoas que precisam de assistência em saúde mental e contextualizou como é a atual situação dos serviços, dos profissionais e dos pacientes.

Ouça a conversa com Luíza Glória

Produção: Jaiane Souza e Luiza Glória

Publicação: Jaiane Souza