Pastilha criada na UFMG reduz proliferação de larvas do mosquito da dengue em ambientes inóspitos, como bueiros e ralos
Uma parceria do campus Saúde com o Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas (ICEx) da UFMG possibilitou a criação de nova tecnologia, de baixíssimo custo, capaz de combater larvas e ovos do mosquito Aedes aegypti mesmo em águas extremamente sujas, como a de esgotos. Trata-se de uma pastilha feita com tijolo de cerâmica tratado quimicamente, que é eficaz em locais inóspitos, como bueiros e ralos, onde não há luz ou água limpa. O larvicida, desenvolvido por equipe coordenada pelo professor Jadson Belchior, reduziu, em mais de 80%, a população do mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika no campus Saúde.
O dispositivo foi criado para atender demanda do campus, que tem os bueiros como principal foco de proliferação desses vetores. Esse comportamento foge do habitual, uma vez que o Aedes aegypti costuma depositar ovos em recipientes com água limpa. “Nas unidades do campus, os vasinhos de plantas foram reduzidos. O mosquito provavelmente está fora dos prédios e migrando para dentro. Os bueiros acumulam água parada e nutrientes gerados por folhas secas. E é justamente disso que os ovos precisam para virar larvas”, detalha Jadson Belchior.
A pesquisa teve início no começo deste ano, em continuidade a estudos desenvolvidos em 2018, também em parceria com o campus Saúde. Essas pastilhas têm como suporte uma cerâmica impregnada com moléculas nocivas à larva, mas com nível de concentração que não faz mal ao ser humano.
O material larvicida é liberado de forma lenta e controlada depois de entrar em contato com a água, por cerca de seis a sete semanas, o que inibe o desenvolvimento dos ovos na fase larvária, impedindo-os de eclodir ou matando as possíveis larvas que surgirem. Assim, o processo reduz drasticamente a proliferação dos mosquitos em locais inóspitos como bueiros, bocas de lobo, sifões de pias e ralos. A tecnologia também consegue eliminar larvas e ovos de outros mosquitos, como o vetor da malária e febre amarela, e inibe a proliferação de escorpiões e baratas, afastando-os dos locais onde o larvicida é depositado.
Belchior explica que a pastilha foi criada com base em outra tecnologia também desenvolvida sob sua coordenação, em parceria com a Vértica Tecnologia e Inovação Ltda., e já patenteada pela UFMG. “Reestruturamos o projeto que tínhamos de tijolos para água potável e com substância atóxica e fotocatalítica, isto é, ativada pela radiação solar. Com base nessa experiência, propusemos outro dispositivo de liberação controlada e que não precisa de luz, apenas da presença de água para ser ativado”, conta.
Sachês com cerca de quatro pastilhas cada foram instalados em 85 bueiros próximos a lâminas de água ou em contato com elas. “Se o nível de água sobe, alcança o sachê, e o material larvicida começa a atuar. Não importa a quantidade de água, o material libera o princípio ativo da substância nocivo à larva”, explica o professor. Cada sachê tem custo aproximado de R$1,00.
Monitoramento
Para garantir a eficácia do novo dispositivo, a equipe do campus Saúde faz monitoramento semanal por meio da coleta de água parada dos bueiros ou com fluxo contínuo proveniente de minas. “Em cerca de seis semanas, trocamos todos os materiais”, conta o professor Jadson Belchior.
O professor explica que o monitoramento da proliferação do Aedes aegypti é feito por outro projeto, o Controle de Aedes na UFMG, iniciativa da Pró-reitoria de Administração da UFMG, por meio do Departamento de Gestão Ambiental (DGA), em parceria com o Laboratório de Inovação e Empreendedorismo em Controle de Vetores (Lintec). Esse projeto, orientado pelo professor Álvaro Eduardo Eiras, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), tem dezenas de armadilhas GAT (Gravid Aedes Trap) distribuídas pelo campus Saúde para capturar o inseto. As armadilhas recebem vistorias semanais para coleta dos mosquitos capturados, que são enviados para análise em laboratório, onde se verifica se estão infectados com dengue, zika ou chikungunya.
“Esses dois projetos se complementam. Monitorar milhares de bueiros é complicado, e os tijolos ajudam a combater criadores em locais que acumulam água de chuva. E conseguimos acompanhar a efetividade dos tijolos com a captura dos mosquitos”, enfatiza o diretor do DGA, Tulio Vono Siqueira.
Menos Aedes
Os dados de monitoramento de mosquitos demonstram que o maior número de vetores capturados coincide com o período em que o larvicida tem sua eficácia reduzida. Ou seja, se a ação do dispositivo diminuiu, a proliferação do Aedes aumenta. No período chuvoso, por exemplo, de janeiro a março, o número de mosquitos reduziu-se de 64 para 13 no campus Saúde, nas semanas seguintes à troca de material. “É muito mais fácil combater o ovo e a larva, porque sabemos onde encontrá-los, do que tentar eliminar depois que se transformam em mosquitos e podem voar para qualquer lugar”, sustenta o professor Jadson Belchior.