Pesquisa da Fiocruz em parceria com UFMG aponta os impactos da pandemia na rotina dos adolescentes brasileiros

Piora na qualidade do sono, falta de atividades físicas e aumento de horas na frente de telas são alguns dos resultados descritos pela segunda et

Durante a pandemia, 48,7% dos adolescentes do país têm sentido preocupação, nervosismo ou mau humor, na maioria das vezes ou sempre. Houve aumento no consumo de doces e congelados, bem como no sedentarismo: o percentual de jovens que não faziam 60 minutos de atividade física em nenhum dia da semana antes da pandemia era de 20,9%, e passou a ser de 43,4%. Setenta por cento dos brasileiros de 16 a 17 anos passaram a ficar mais de 4 horas por dia em frente ao computador, tablet ou celular, além do tempo das aulas online. Além disso, 23,9% daqueles entre 12 e 17 anos começaram a ter problemas no sono, e 59% sentiram dificuldades para se concentrar nas aulas de ensino a distância. Estes são alguns dos resultados da ConVid Adolescentes – Pesquisa de Comportamentos, realizada pela UFMG com jovens do Brasil todo, de junho a setembro de 2020.

O trabalho investigou as mudanças na rotina, nos estilos de vida, nas relações com familiares e amigos, nas atividades escolares, nos cuidados à saúde e no estado de ânimo dos adolescentes entre 12 a 17 anos. Foi coordenado pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict),da Fiocruz, em parceria com a UFMG e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e realizado de forma on-line: 9.470 adolescentes responderam a um questionário virtual, entre os dias 27 de junho e 17 de setembro. Esta é a segunda etapa da ConVid, que em abril e maio abordou os estilos de vida dos adultos durante a pandemia.

“A falta de atividade física entre os adolescentes foi um dos resultados que mais se destacou. Em geral, os jovens brasileiros praticam mais atividades coletivas, como aulas de danças e jogos com bola. Com as medidas de restrição social, tornou-se mais difícil para eles manterem a prática de exercícios”, aponta a pesquisadora do Icict Celia Landmann Szwarcwald, coordenadora do trabalho. “Chama muita atenção também o estado de ânimo desses jovens, que relataram tristeza, ansiedade e a ausência de amigos”.

Diferenças regionais

A pesquisa também abordou aspectos mais diretamente ligados à pandemia, como medidas de prevenção e diagnóstico. O percentual de adolescentes que se declarou como tendo sido diagnosticado com covid-19 foi de 3,9%.Enquanto a Região Sul registrou a menor proporção de jovens com covid-19, com um percentual de 2,1%, a Região Norte registrou 6,1%.

A grande maioria dos adolescentes (71,5%) aderiu às medidas de restrição social, com 25,9% em restrição total e 45,6% em restrição intensa, ou seja, saindo só para supermercados, farmácias ou casa de familiares. Considerando a restrição intensa e a total restrição de contatos com outras pessoas, a maior proporção ocorreu na Região Sul, de 74,1%, enquanto o menor percentual ocorreu no Norte (66,1%).

“A Região Norte se destacou em ter maior número de adolescentes diagnosticados com a covid-19 e menor adesão às medidas de restrição social. Foi um padrão que se repetiu entre os adultos também, como apontado na primeira etapa da pesquisa”, compara Celia.

A professora da Escola de Enfermagem da UFMG, Deborah Malta, destaca que os adolescentes também revelaram boa adesão a práticas de prevenção ao covid, a grande maioria  (71,5%) aderiu às medidas de restrição social, mais elevado entre as meninas (74%),  além disso, mudaram práticas, como lavar as mãos (76%), uso de máscaras (89%), não compartilhar objetos (49%), mostrando que entenderam bem as mensagens de prevenção e estão se cuidando.

Piora na saúde física e mental

A piora da saúde na pandemia é outro ponto de destaque: foi apontada por 30% dos jovens. Diferenças foram encontradas por sexo e faixa de idade, com as meninas relatando maior proporção de piora do estado de saúde (33,8%) do que os meninos (25,8%), e os adolescentes mais velhos (37,0%) do que os mais novos (26,4%).

O percentual de adolescentes que relataram piora na qualidade do sono durante a pandemia foi de 36%, sendo que 23,9% começaram a ter problemas com o sono e 12,1% relataram que tinham problemas e eles pioraram. A qualidade do sono foi mais afetada entre as meninas, e nos adolescentes com 16 a 17 anos, em relação aos mais novos.

Sentir-se preocupado, nervoso ou mal-humorado foi descrito por 48,7% dos adolescentes, na maioria das vezes ou sempre. Entre as meninas, o percentual foi de 61,6%. Os adolescentes de 16-17 anos de idade relataram esse sentimento mais frequentemente (55,3%) do que os de 12-15 anos (45,5%).

“Também é importante destacar a piora na qualidade de sono e os problemas no estado de ânimo. Há um conjunto de fatores como sentimento de tristeza, nervosismo, isolamento, insegurança, medo por familiares, que está afetando diretamente a saúde dos jovens. Não é à toa que 30% deles identifica uma piora em seu estado de saúde”, salienta a Celia.

Deborah destaca o relato da piora do estado de saúde: cerca de 30%, sendo ainda mais elevado entre as meninas: 33% e entre adolescentes mais velhos (16- 17 anos) - 37% reflexo de piora no sono 36,0%, sentir-se isolado dos amigos em 32,8%, sentir-se tristes (31,6%). O que pode ser explicado pela redução do contato social, em função do distanciamento social.

“O sentimento de isolamento e tristeza também mostraram diferenças segundo gênero e idade. As meninas relataram o sentimento de tristeza com frequência duas vezes mais elevada, 43,9% e os meninos 20,5%, e adolescentes mais velhos 37,5% contra 29,6%. Estes aspectos devem ser levados em conta nas famílias e nas medidas de apoio social. Adolescentes mais velhos tendem a ter mais contato social e por isto podem ter sentido mais o isolamento. Ao passo que as meninas também tendem a ter muito contato social e podem estas sentindo com mais intensidade este distanciamento”, destaca a professora.

Mudanças de hábitos alimentares e mais sedentarismo

O consumo de alimentos não saudáveis em dois dias ou mais por semana aumentou: 4% para pratos congelados e 4% para os chocolates e doces. Mais de 40% dos adolescentes não praticaram atividade física por 60 minutos em nenhum dia da semana durante a pandemia. O percentual de jovens que não faziam 60 minutos de atividade física em nenhum dia da semana antes da pandemia era de 20,9%, e passou a ser de 43,4%.

No período, mais de 60% dos adolescentes relataram ficar por mais de 4 horas em frente às telas de computador, tablet ou celular como lazer, além do tempo para as aulas à distância. Entre os adolescentes de 16-17 anos, o percentual alcança 70%. “As telas tornaram-se um meio de eles se conectaram com os amigos via redes sociais ou jogando, mas esse excesso de tempo em frente às telas é preocupante”, aponta Celia.

Deborah Malta relata que o consumo de alimentos saudáveis se manteve estável, o que diferiu em relação a pesquisa de adultos, que mostrou piora deste item. “Os adolescentes mantiveram consumo semelhante de frutas, hortaliças e feijão, o que foi bastante positivo. Houve pequena piora para pratos congelados e consumo de chocolates e doces. Manter-se em casa contribuiu na manutenção da alimentação saudável. Entretanto, a redução da prática de atividade física e aumento do sedentarismo foi muito expressiva, mostrando o grave prejuízo neste hábito”. Ainda segundo a professora, o recomendado é que adolescentes pratiquem pelo menos uma hora diária de atividade física e isto não foi atingido por 15,7% dos adolescentes e antes a prática era frequente em 28,7%. “Um grande alerta para os gestores, professores e famílias”, pontua.

Muita dificuldade em acompanhar as aulas de ensino a distância foram citadas pelos adolescentes: 59% relataram falta de concentração, 38,3% falta de interação com os professores, 31,3% falta de interação com amigos. Em relação ao entendimento do conteúdo das aulas de ensino a distância, 47,8% dos adolescentes relataram estar entendendo pouco, e 15,8% disseram não estar entendendo nada. Apenas 1 em cada 4 adolescentes de 16-17 anos relatou estar entendendo tudo ou quase tudo das aulas presenciais

“Esses resultados são muito importantes para orientar ações de gestores, profissionais de saúde, educação e familiares. A saúde do adolescente não pode ser negligenciada e a pandemia trouxe muitas mudanças no comportamento entre eles”, conclui Deborah Malta.

Assessoria de Imprensa UFMG

Fonte

Assessoria de Comunicação do Icict/Fiocruz e Assessoria de Comunicação da Escola de Enfermagem da UF

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