Roberto Martins, da UFMG, publica em livro tese que provocou reviravolta na história da economia escravista mineira

Lançamento será no dia 26 de novembro às 19h30, na Academia Mineira de Letras

Numa madrugada, quando cursava o doutorado na Vanderbilt University (EUA), em fins da década de 1970, o professor Roberto Borges Martins, aposentado da Faculdade de Ciências Econômicas (Face), recebeu do irmão Amilcar Martins Filho, também professor da UFMG, uma novidade que alteraria o rumo de suas pesquisas: a análise do Recenseamento do Império de 1872 revelava que a grande maioria dos escravos da província não residia nas áreas cafeeiras da Zona da Mata, como rezava a história tradicional.

A descoberta e seus desdobramentos foram transformados na tese que mudou profundamente a interpretação da história econômica de Minas Gerais. Numa época em que, para a historigrafia, era ponto pacífico que o fim do ciclo do ouro provocara forte declínio da economia mineira, a tese, defendida em 1980, contestava a convicção consagrada que remetia a colapso econômico, ruína das cidades e exportação dos escravos para as nascentes regiões cafeeiras do Vale do Paraíba.

“No início do século 19, a economia mineira era muito próspera, e Minas, o maior importador de escravos africanos do Brasil”, afirma Roberto Martins. Ainda neste mês, ele publica o trabalho, pela primeira vez na íntegra, no livro Crescendo em silêncio: a incrível economia escravista de Minas Gerais no século XIX (Icam e ABPHE). O volume contém ainda um post scriptum concluído em 2018, em que o autor acrescenta novas evidências e revisita seu trabalho com olhar crítico.

Segundo Martins, a escravidão da era moderna (que se define como o cativeiro de negros africanos a partir da descoberta da América) sempre foi associada exclusivamente às grandes monoculturas de exportação, como o açúcar no Caribe e no Nordeste brasileiro, o algodão nos Estados Unidos e o café no Sudeste do Brasil. “Minas Gerais foi a única grande economia escravista que não se baseava na exportação. Além do ouro, produzia alimentos, fumo, toucinho, queijos, artefatos de ferro, tecidos e muito mais, visando sobretudo ao mercado interno”, explica o professor, ressaltando que Minas teve mais escravos do que qualquer outra província brasileira, em qualquer época.

‘Exercício de ficção’

“Esse trabalho aprofunda substancialmente nossa compreensão sobre a complexidade da escravidão moderna”, escreveram sobre os achados de Roberto Martins dois dos maiores historiadores da escravidão, Stanley Engerman e Eugene Genovese. Na tese, divulgada por meio de artigos e exposições em seminários, o economista e professor da UFMG ousou contradizer alguns dos intelectuais mais respeitados do século 20, como Roberto Simonsen e Celso Furtado. No post scriptum, ele sustenta que a visão sombria sobre a economia mineira, que chama de “falso apocalipse”, foi inaugurada pelo português Joaquim Pedro de Oliveira Martins, “cuja narrativa histórica [de 1880] era um exercício de ficção”, fruto de “grosseira ignorância sobre fatos básicos da história do Brasil” e de “um rancor atávico contra uma colônia que, tendo sustentado o luxo e a ostentação, de repente passara a negar oxigênio a um Portugal sufocado”.

A segunda parte do livro incorpora dados e pesquisas publicados nas últimas décadas, sobretudo por historiadores mineiros do século 21, que focam aspectos como a diversificação precoce da economia do Estado. Roberto Martins dedica-se a demonstrar, com novos dados, que a expressão “ciclo do ouro” retrata uma noção equivocada, que conduz a distorções sérias de interpretação. “A mineração de ouro era apenas um setor entre vários outros. A propalada decadência de Minas no fim dos anos 1700 não passa de uma lenda; são falsas também histórias como a da alforria em massa e a da transferência dos escravos para o café no declínio da mineração”, afirma Roberto Martins, que foi presidente da Fundação João Pinheiro e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Livro: Crescendo em silêncio – A incrível economia escravista de Minas Gerais no século XIX
Autor: Roberto Borges Martins
Edição: Instituto Cultural Amilcar Martins (Icam) e Associação Brasileira de Pesquisa em História Econômica (ABPHE)
629 páginas / R$ 70
Lançamento: 26 de novembro, às 19h30, na Academia Mineira de Letras (Rua da Bahia, 1466). No evento, os livros serão vendidos por R$ 50.

Itamar Rigueira Jr. - Boletim UFMG 2.041

Fonte

Assessoria de Imprensa da UFMG

Serviço

Lançamento do livro 'Crescendo em silêncio – A incrível economia escravista de Minas Gerais no século XIX'

Dia 26 de novembro de 2018

19h30

Academia Mineira de Letras - Rua da Bahia, 1.466, Centro - Belo Horizonte