UFMG tem sete projetos em andamento na corrida pela vacina brasileira contra a covid-19

São vários os vetores e plataformas usados nas pesquisas, todas em fase pré-clínica

Pfizer/BionTech, Oxford/AstraZeneca, Moderna, Sinopharm, Sputnik V, Coronavac e Covaxin são algumas das vacinas que já estão sendo aplicadas em todo o mundo como estratégia de combate à pandemia de covid-19. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), uma vacina leva cerca de 10 anos para ser desenvolvida. No caso da infeção pelo novo coronavírus, os estudos focados no desenvolvimento de imunizantes ocorreram em tempo recorde – cerca de um ano depois do início da pandemia, já existem vacinas comprovadamente eficazes sendo aplicadas.

Com o objetivo de agilizar a vacinação no Brasil, universidades brasileiras e institutos de pesquisas também estão na corrida para o desenvolvimento de um imunizante nacional. Hoje, a UFMG trabalha com sete projetos: cinco no Centro de Tecnologia em Vacinas (CT-Vacinas), parceria estabelecida entre a UFMG, o Instituto René Rachou da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz-Minas) e o Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC), e duas no Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

Segundo Ana Paula Fernandes, uma das coordenadoras do CT-Vacinas e professora da Faculdade de Farmácia da UFMG, a busca por uma vacina nacional que previna a covid-19 é importante para frear a pandemia e ajudar o país a criar as bases para a produção de imunizantes contra outras doenças no futuro. “Todo o conhecimento adquirido nos estudos para a vacina contra a covid-19 será útil para que possamos criar vacinas contra outras doenças, visto que alguns processos se repetem em todo o percurso de desenvolvimento de um imunizante. Além disso, desenvolver os passos de uma vacina no Brasil é fundamental para a soberania nacional, pois nos garante certa independência no combate às doenças”, diz.

No CT-Vacinas, são três imunizantes que utilizam plataformas de vetores virais, um baseado em proteína recombinante e outro que utiliza DNA. Já no ICB, uma das vacinas desenvolvidas utiliza RNA, e a outra, bacilos de Calmette-Guérin (BCG).

As sete vacinas, que serão explicitadas a seguir, estão na fase de estudos pré-clínicos, que é quando os pesquisadores avaliam a sua imunogenicidade, ou seja, a capacidade da substância de provocar uma resposta imune do organismo por meio do desenvolvimento de anticorpos que combatem a doença. Essa fase também atesta os níveis de proteção e segurança do imunizante em animais.

Segundo Ana Paula Fernandes, todas as plataformas utilizadas nas pesquisas feitas na UFMG já são usadas no desenvolvimento de vacinas contra outras doenças, o que ajuda a garantir a segurança dos imunizantes. Além disso, apesar de todas essas vacinas ainda estarem na fase pré-clínica dos estudos, cada uma delas apresenta complexidades distintas e seria produzida, caso comprovadamente eficiente, de maneira diferente. 

“Precisamos lembrar que a produção de uma vacina é um processo complexo. Para ganharmos tempo, embora ainda estejamos na fase de testes em animais, o CT-Vacinas já está conversando com as fábricas que poderão produzir os imunizantes para as fases de testes clínicos em humanos. Também estamos conversando com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que, quando autorizadas as fases clínicas, isso seja feito o mais rapidamente possível. O Brasil tem pressa para vacinar a sua população, então é importante que consigamos financiamento para as próximas etapas dos estudos”, diz.

Conheça os sete imunizantes

Vírus MVA usado como vetor: utiliza, como plataforma, o vírus MVA, que já é empregado como vetor na vacina contra a varíola. O vírus MVA recebe genes do Sars-CoV-2 e passa a produzir as proteínas S (Spike) e N (do nucleocapsídeo viral) do novo coronavírus, que são utilizadas por ele para infectar as células humanas. Em contato com as células do paciente, o vírus induziria o organismo à resposta imune contra a covid-19. Essa vacina prevê a imunidade por meio de duas doses, aplicadas em via intramuscular. Os estudos que podem dar origem ao imunizante estão sendo financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio de edital do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

Vírus Influenza usado como vetor: também prevê a aplicação em duas doses, porém por via intranasal. Nesse estudo, foram feitas alterações genéticas no vírus H1N1, que causa a gripe. Depois dessas alterações, o vírus da gripe tornou-se capaz de transportar parte da proteína S do Sars-CoV-2, que possibilita que o vírus infecte as células humanas. A intenção é que, depois de inserido no organismo, o vírus dotado dessa parte dessa proteína estimule o corpo humano a produzir os anticorpos para a covid-19, ao mesmo tempo que protege o organismo da influenza, tornando-se assim uma vacina ambivalente. Essa pesquisa é feita em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Universidade de São Paulo (USP), com financiamento do CNPq, do MCTI e da Fundação Oswaldo Cruz.

Adenovírus (Ad5) usado como vetor: também de administração intramuscular e aplicada em duas doses, essa vacina consiste na modificação genética do Adenovírus 5, que provoca infecções respiratórias. Os cientistas inserem partes do genoma do Sars-CoV-2 no adenovírus, que se torna capaz de produzir as proteínas S e N do coronavírus (as utilizadas pelo vírus para infectar as células humanas). O produto será então introduzido no organismo humano, estimulando-o a produzir anticorpos contra a covid-19. O mecanismo é o mesmo empregado no desenvolvimento da vacina Oxford/AstraZeneca. A pesquisa é financiada pelo CNPq, por meio de edital do MCTI.

Proteína recombinante (‘quimera’) usada como plataforma: bastante versátil, essa vacina é considerada a mais fácil de ser produzida. A administração é intramuscular, em duas doses. A pesquisa que deu origem ao desenvolvimento desse imunizante baseou-se na modificação genética da bactéria E.coli, que recebeu pedaços do genoma do Sars-Cov-2 para que se conseguisse produzir as duas proteínas que o coronavírus utiliza para infectar as células humanas (as proteínas S e N). O composto, chamado de ‘quimera’, é então injetado no corpo humano e induz à resposta imune. Por ter um método de produção mais simples, essa vacina poderia ser produzida na Fundação Ezequiel Dias (Funed), em Minas Gerais. A pesquisa é financiada pelo CNPq e pelo MCTI.

DNA: é o imunizante mais adiantado entre os que estão sendo desenvolvidos no CT-Vacinas. Os antígenos do Sars-Cov-2 são incluídos em um plasmídeo, o que promove sua expressão nas células do organismo e apresentação ao sistema imune, induzindo à resposta celular de defesa. Mais estável que o RNA, o DNA viabiliza que essa vacina seja mais facilmente trabalhada, uma vez que ela pode ser armazenada em freezers comuns, facilitando, assim, o armazenamento e a logística de distribuição. O processo de produção se assemelha ao das vacinas de RNA, porém com o acréscimo de uma etapa, a de transcrição do DNA em molécula de RNA. A pesquisa é financiada pelo CNPq e pelo MCTIC.

RNA mensageiro: o mRNA (ou RNA mensageiro sintético) é encapsulado por um elemento transportador de proteínas, o lipossomo. Tal estrutura tem fácil acesso às células do corpo humano depois de inoculada porque é reconhecida como um elemento do organismo. Já dentro da célula, o composto mimetiza a proteína S do vírus Sars-Cov-2, incentivando a resposta imune do organismo. Essa vacina, que pode ser facilmente adaptada para eventuais mutações do coronavírus, tem aplicação intramuscular, em duas doses. O projeto é financiado pelo CNPq, por meio de edital do MCTI. 

Bacilos de Calmette-Guérin (BCG) usados como vetores: de aplicação intramuscular, essa vacina baseia-se na inserção de sequências do genoma do Sars-Cov-2 em bacilos de Calmette-Guérin (BCG), os causadores da tuberculose. O objetivo é que a modificação genética induza os bacilos a produzirem as proteínas S e N do Sars-Cov-2. A vacina é ambivalente, pois, depois de inserido no organismo, o composto o estimula a produzir anticorpos contra covid-19 e a própria tuberculose. Esse imunizante é considerado muito seguro porque parte de uma vacina já bem conhecida, a BCG. Isso gera expectativa de mais rapidez nas fases de testes em humanos. A vacina está sendo desenvolvida em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o Instituto Butantan, com financiamento do CNPq e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Texto de Luana Macieira para o Portal UFMG

Fonte

Assessoria de Imprensa UFMG