Pesquisa e Inovação

​Fábio Duarte, da Fale, lança livro sobre sintaxe de línguas indígenas brasileiras

Evento ocorre nesta quarta, 29, na Escola de Engenharia, durante seminário do Ieat

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Fábio Duarte em comunidade indígena: perda de diversidade linguísticaFoto: Laboratório de Línguas Indígenas da Fale

Em 1500, a população brasileira – algo entre três e cinco milhões de pessoas – falava mais de mil línguas diferentes. Com a chegada dos portugueses ao Brasil e o extermínio contínuo que veio sendo promovido dos falantes dessas línguas, a maior parte delas também desapareceram. Hoje, calcula-se que a população indígena brasileira perfaça menos de 200 mil pessoas, e 160 mil delas (isto é, aquelas com as quais já se teve contato e cujos idiomas puderam ser documentados) falam algo em torno de 180 línguas diferentes.

Curiosamente, ainda assim, mais da metade dessas línguas restantes ainda não conta com uma descrição gramatical satisfatória – e, menos ainda, com estudos teóricos suficientemente capazes de abarcar a complexidade delas. Se, por si só, esse fato já justifica a importância das tentativas de descrição, documentação e revitalização dessas línguas, esse trabalho ainda se reveste de um aspecto revolucionário – ou, mais especificamente, de resistência – se o pensamos à luz do recrudescimento que ocorre hoje do genocídio indígena no país, sobretudo na região amazônica.

Esse, pois, é o contexto em que sai do prelo, nesta semana, o livro Ergatividade e sistemas de alinhamentos em línguas indígenas, de Fábio Bonfim Duarte, professor da Faculdade de Letras da UFMG que tem dedicado sua carreira ao estudo sistemático da sintaxe das línguas indígenas brasileiras, com aporte de teorias advindas da tipologia e da gramática gerativa. Duarte coordena o Laboratório de Línguas Indígenas e o Laboratório de Línguas Africanas da UFMG.

Nesse seu novo livro, Fábio Duarte trata dessa especificidade da sintaxe de algumas línguas indígenas brasileiras (a “ergatividade”, palavra que vem do grego ergátés, “o que trabalha, o ativo”, que por sua vez deriva do grego érgon, “ação, trabalho”) que distingue as línguas ergativas das línguas nominativas. O lançamento ocorre nesta quarta-feira, 29 de junho, às 16h, na Sala de Seminários 1012 da Escola de Engenharia da UFMG, no campus Pampulha. O evento integra a programação da edição de 2022 do Seminário Anual do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (Ieat) da UFMG, que terá atividades durante todo o dia.

“A publicação deste livro se insere neste contexto de risco de perda de diversidade linguística no Brasil e em várias partes do mundo. Por essa razão, essa pesquisa se alinha ao chamado que vem sendo feito pela comunidade científica em relação à urgente necessidade de pesquisas voltadas para as línguas minoritárias, em especial para as línguas indígenas brasileiras, uma vez que mais da metade dessas línguas ainda precisa de descrições gramaticais mais detalhadas”, escreve o autor na introdução do seu livro.

Como expõe o pesquisador em sua obra, a preocupação com a perda de diversidade linguística no Brasil se justifica, entre outras razões, pelo fato de essas línguas, em particular, contarem com inúmeras possibilidades gramaticais inexistentes em línguas europeias, seja no campo da fonética (o conjunto de sons de que se servem), seja no campo da fonologia (as regras por meio das quais esses sons são combinados), da morfologia (as regras de formação e variação das palavras), da sintaxe (as regras de associação das palavras na constituição das frases) e da semântica (o modo como essas frases refletem sentidos a respeito do mundo e da imaginação que fazemos dele).

“Muito conhecimento sobre as línguas e sobre as implicações de sua originalidade para o melhor entendimento da capacidade humana de produzir línguas e de comunicar-se ficará perdido para sempre com cada língua indígena que deixa de ser falada”, alerta o autor. Nesse sentido, ele explica, “um dos principais objetivos deste livro é investigar até que ponto os sistemas ergativos encontrados nas línguas indígenas do Brasil se diferem dos sistemas nominativos encontrados nas línguas indo-europeias, como o italiano, o alemão, o francês, o inglês, o português, entre outras”. Na obra, Fábio analisa os modos de ergatividade de diversas línguas indígenas brasileiras, como os das línguas Jê, Tupí-Guaraní, Guajajára, Ka’apór, Maxacali e Kuikuro.

“O livro em pauta é certamente uma importante contribuição para os estudos gerativistas voltados para os sistemas de alinhamento nas línguas naturais na perspectiva da Teoria de Caso, com contribuições de línguas indígenas brasileiras ainda pouco ou não contempladas em estudos dessa natureza e que apresentam sistemas de alinhamento que fogem aos padrões elencados na literatura especializada”, explica Ana Suelly Arruda Câmara Cabral, professora do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas da Universidade de Brasília (UnB), no prefácio do volume. 

O livro está disponível para compra no site da editora Mercado de Letras.

Livro: Ergatividade e sistemas de alinhamentos em línguas indígenas
Autor: Fábio Bonfim Duarte
Editora: Mercado de Letras
R$72 / 204 páginas
Lançamento: Quarta-feira, 29 de junho, às 16h, na Sala de Seminários 1012 da Escola de Engenharia

Fábio Bonfim Duarte em atuação em campo, em uma comunidade indígena brasileira
Fábio Duarte defende a urgência de se pesquisar as características das chamadas línguas minoritáriasFoto: Laboratório de Línguas Indígenas da Fale

Ewerton Martins Ribeiro