Arte e Cultura

Festival de Inverno examina relação território-cultura e projeta parceria com outras federais

56ª edição do evento compartilha programação com a 34ª Reunião Brasileira de Antropologia e retoma debate sobre parceria com os festivais culturais da Ufop e da UFSJ

Exposição 'Iló. Coletivo de Colagens Antropo(i)lógicas', em cartaz no hall do CAD 3, é um dos frutos da parceria entre o Festival de Inverno e a Reunião Brasileira de Antropologia
Exposição 'Iló. Coletivo de Colagens Antropo(i)lógicas', em cartaz no hall do CAD 3, é um dos frutos da parceria entre o Festival de Inverno e a Reunião Brasileira de Antropologia Imagem: Divulgação Procult

Com mais de meio século de história, os festivais de inverno das universidades federais mineiras são um verdadeiro patrimônio do estado. Marcos anuais de convergência da vasta produção de cultura empreendida em nossas paragens, esses eventos têm origens e trajetórias imbricadas. É o caso sobretudo do Festival de Inverno da UFMG, do Festival de Inverno da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e do Inverno Cultural da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), cujas histórias remontam, em maior e em menor grau, a uma mesma origem.

Oficialmente, a UFSJ realiza o seu Inverno Cultural desde 1988, sempre nas férias letivas do meio de ano, como é a praxe. A Ufop, por sua vez, responde pelo Festival de Inverno, em sua principal cidade-sede, desde 2004. Contudo, as histórias de ambos os eventos retornam anos e décadas mais e alcançam as origens do próprio Festival de Inverno UFMG: criado em 1967, ele teve algumas das suas primeiras edições nessas cidades, além de também ter passado por Diamantina, Tiradentes, Cataguases e Poços de Caldas. Dessa forma, pode-se dizer que o festival da UFMG arou a terra para que os eventos próprios dessas localidades germinassem e florescessem.

Mencarelli: festivais em parceria, circulação de produções
Mencarelli: festivais em parceria, circulação de produções Foto: Foca Lisboa | UFMG

Esse trânsito de identidade entre os festivais sempre fez pairar sobre a tríade de universidades uma questão: e se seus eventos passassem a ser construídos e realizados em parceria formal, potencializando, em sinergia, toda essa história e o seu próprio propósito comum? Quantos, então, não seriam os ganhos, se fosse realmente possível estabelecer uma lógica processual para tudo isso ocorrer? Essas questões começaram a ser discutidas mais fortemente nos últimos anos e ganharam forma objetiva na edição deste ano do Festival de Inverno UFMG, que será realizado de 18 a 27 de julho em Belo Horizonte e em Tiradentes, com o tema Cultura e territórios.

A discussão sobre a possibilidade de formalização da parceria entre as instituições dominará a programação de sábado, dia 20, em rodas de conversa no Conservatório UFMG, de que vão participar os pró-reitores de Cultura das três universidades: Chico Brinati, da UFSJ, Sandra Nogueira, da Ufop, e Fernando Mencarelli, da UFMG. “A gente quer pensar um futuro verdadeiramente em parceria”, destaca Mencarelli. Ele lembra que, por diferentes razões, uma delas a greve de professores e servidores técnico-administrativos, nem a Ufop, nem a UFSJ puderam realizar seus eventos neste ano. “Então estamos inaugurando, no festival da UFMG, uma iniciativa de circulação das produções entre as universidades. Vamos receber, por exemplo, três espetáculos da federal de São João. É uma iniciativa conjunta e experimental, que a rigor não é inédita, pois já houve no passado aproximações desse tipo, mas que agora alcança um novo patamar”, destaca.

Na avaliação da reitora Sandra Regina Goulart Almeida, essas aproximações são uma prova da vitalidade do Festival de Inverno UFMG e de seus coirmãos: “O Festival se aproxima de seu 60º aniversário e mantém viva a sua vocação de vanguarda. As parcerias com a reunião anual de antropologia [leia mais ao fim desta reportagem] e com os outros festivais de inverno, que, em certa medida, nasceram sob a inspiração no nosso festival, atestam a sua capacidade de se reinventar”.

Duas rodas de conversa vão tratar do tema. A primeira ocorre na parte da manhã, às 9h30. Nela, os representantes das pró-reitorias de cultura das três universidades se reunirão com representantes do escritório do Ministério da Cultura (MinC) em Minas Gerais, do Comitê de Cultura de Minas Gerais e da rede de Pontos de Cultura de Minas Gerais para discutir a possibilidade de compartilhamento de programas, projetos e ações e para debater possíveis articulações interinstitucionais na implementação de políticas públicas culturais. “A proposta é construir um diálogo sobre o modo como nos organizamos e atuamos, sobre como podemos interagir de forma a potencializar nossas ações”, descreve a sinopse do encontro.

A segunda roda ocorre às 14h, com mediação de Mônica Ribeiro, pró-reitora adjunta de Cultura da UFMG. Na descrição desse evento, os organizadores adiantam que devem ser apresentadas, na ocasião, novas propostas de “itinerância” de artistas entre os festivais das universidades, com foco nas próximas edições. A baliza para esses debates é a “noção ampliada de cultura” que atravessa, como diretriz, a Pró-reitoria de Cultura (Procult) da UFMG e o seu festival – noção “forjada na transversalidade de saberes e de conhecimentos”, como se descreve no site do evento. Segundo Mencarelli, foi confirmada a presença, no festival, de Maria Marighella, presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte), o que promete potencializar ainda mais os debates.

As exposições ‘MetropoliTRAMAS’ têm foco na exibição do RMBH
Exposição MetropoliTRAMAS, em cartaz no Espaço do Conhecimento, é uma das atrações do festivalFoto: Fernando Silva

O nosso Festival
Com o tema Cultura e territórios, o 56º Festival de Inverno UFMG tem programação presencial e virtual. Ela é integralmente gratuita, como de praxe.

As atividades serão realizadas em diversos espaços da Universidade, mas principalmente no Centro Cultural UFMG, no Conservatório UFMG, no Espaço do Conhecimento UFMG, na Praça de Serviços e no campus Cultural Tiradentes. A íntegra da programação já pode ser consultada em seu site. Ela é composta por apresentações musicais, espetáculos teatrais, exibições de filmes, exposições, oficinas, performances e mesas-redondas, além de colóquios.

A abertura do evento ocorre nesta quinta-feira, 18, às 19h30, no Centro Cultural UFMG, com a presença da reitora Sandra Regina Goulart Almeida e de outros gestores da Universidade, em especial da área de cultura. Na sequência, às 20h, serão inauguradas três exposições no local: Síntese - derivações poéticas: som, espaço e a imagem, na grande galeria; Em teoria, na sala Ana Horta; e Aeris cor, no Hall.

Na sequência, terá vez uma roda de conversa com os curadores e os artistas participantes da Síntese, que é desdobramento de uma parceria do festival com a Associação de Universidades do Grupo de Montevidéu (AUGM). Questões relativas a essa parceria serão discutidas em um colóquio internacional homônimo, realizado também no Centro Cultural, no dia 19, às 9h.

O encerramento do festival ocorre dia 26, às 19h30, com um show de choro do grupo Toca de Tatu, também no Centro Cultural. A participação em todas as atividades é gratuita.

Mostra de Fotografias 'Olhares metropolitanos'
Mostra de fotografias 'Olhares metropolitanos', no Espaço do Conhecimento, compõe programação do FestivalFoto: Ricardo de Oliveira Correia

Reunião Brasileira de Antropologia

Neste ano, o Festival de Inverno UFMG fez uma parceria inédita com a 34ª Reunião Brasileira de Antropologia, cujo tema é Territórios vivos, corpos plurais: antropologia e saberes críticos. O mote do evento alude às “diferentes lutas sociais e resistências em defesa da vida, dos territórios e dos corpos plurais diante dos contextos de crise e violências vividos e observados no Brasil e no mundo, na contemporaneidade”, conforme se informa no seu site. Nele é possível consultar a íntegra da programação, que terá lugar em diferentes espaços do campus Pampulha e também em espaços fora do campus, em Belo Horizonte.

A realização da RBA coincide com os quatro últimos dias do festival, 23 a 26 de julho, período em que serão realizadas as atividades conjuntas dos dois eventos. Essas atividades ocorrerão na Praça de Serviços, no campus Pampulha, sempre na hora do almoço e no fim da tarde. Elas reunirão nomes como Rubinho do Vale, Fabinho do Terreiro, Nath Rodrigues e Pereira da Viola. “Estamos muito felizes por termos podido realizar mais essa parceria, que é muito relevante para nós. Temos buscado fazer parcerias com eventos nacionais, como ocorreu no ano passado”, lembra Mencarelli. Em 2023, o festival partilhou sua programação com o 22º International Congress of Aesthetics, também realizado na UFMG.

Outra vertente da parceria com a Reunião Brasileira de Antropologia são as exposições que estão sendo instaladas em diferentes espaços da Universidade. O grande destaque nessa seara é a mostra do Prêmio Pierre Verger. Promovida pela Associação Brasileira de Antropologia (ABA), a iniciativa é um dos principais festivais competitivos de obras fílmicas, fotográficas e gráficas produzidas no âmbito de pesquisas antropológicas na América Latina.

A mostra de ensaios fotográficos e de desenhos do Pierre Verger estará exposta no saguão da Reitoria, no campus Pampulha, a partir do dia 22 de julho. (A mostra de filmes, com 27 obras, será exibida no Cine Santa Tereza, no bairro homônimo, do dia 19 ao dia 26.) “O interessante é que é que essa exposição, como várias outras, não se limitará ao período do festival. Essa, especificamente, fica em cartaz até outubro”, destaca Mencarelli. Todas as exposições em cartaz no Festival de Inverno UFMG podem ser conferidas no site do evento.

RBA de volta ao presencial
Da perspectiva da Reunião Brasileira de Antropologia, esta é uma edição especial não apenas pela parceria com o Festival de Inverno, mas também porque, após seis anos de intempéries (crise política, desmonte institucional da educação, pandemia etc.), o evento finalmente pôde voltar, neste ano, ao formato presencial. Para fazer valer o marco, a programação da RBA sugere um evento recheado de atividades.

Essa programação inclui dezenas de simpósios, mais de setenta mesas-redondas, quatro minicursos, dez oficinas e oito prêmios. O destaque vai para as conferências magnas que serão ministradas por Gersem Baniwa, professor de antropologia da Universidade de Brasília (UNB), Alpa Shah, professora de antropologia da Escola de Economia e Ciência Política de Londres, na Inglaterra, e Christen A. Smith, professora de antropologia da Universidade do Texas, em Austin, nos EUA. Além disso, a RBA sediará reuniões de mais de cem grupos de trabalho.

A coordenação geral da reunião é feita por Aderval Costa Filho, que também foi o responsável por curar os eventos culturais realizados em parceria com o Festival de Inverno, e Ana Flávia Moreira Santos. Ambos são professores do Departamento de Antropologia e Arqueologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG. Já a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), entidade que realiza a RBA e promove o Prêmio Pierre Verger, é presidida por Andréa Zhouri, vinculada ao mesmo Departamento.

Integrantes do Toca de Tatu, grupo premiado em festivais de música instrumental
Show do premiado grupo mineiro de choro Toca de Tatu faz o encerramento do festivalFoto: Lucca Mezzacappa

Ewerton Martins Ribeiro