Pesquisa e Inovação

HC é o primeiro hospital de Minas a usar pele de tilápia para tratar doença rara em mulheres

Pacientes portadoras da síndrome de Rokitansky, ou anegesia vaginal, acompanhadas pelo SUS serão encaminhadas para o procedimento

A pele de tilápia para uso cirúrgico é processada pela Universidade Federal do Ceará
A pele de tilápia para uso cirúrgico é processada pela Universidade Federal do Ceará Luna Normand | HC-UFMG/Ebserh

O Hospital das Clínicas da UFMG/Ebserh é o primeiro hospital de Minas Gerais a aplicar a técnica cearense que utiliza pele de tilápia para reconstruir o canal vaginal de mulheres portadoras da síndrome de Rokitansky, doença rara que afeta uma em cada cinco mil nascidas vivas e provoca alterações na formação do útero e da vagina, que ficam ausentes ou pouco desenvolvidos. Duas mulheres foram operadas na semana passada, e agora o HC vai receber outras pacientes de Minas Gerais, com o mesmo diagnóstico e em tratamento no SUS, para realizar o procedimento.

“A pele da tilápia contém grande quantidade de colágeno tipo 1, que a torna tão forte e resistente quanto a pele humana. Além disso, o processo de manufatura da pele de tilápia é rápido e barato”, afirma o idealizador da técnica ginecológica, o professor Leonardo Bezerra, médico na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (MEAC), da Universidade Federal do Ceará (UFC), localizada em Fortaleza, instituição hospitalar que também integra a Rede Ebserh.

Outra grande vantagem destacada por Bezerra é o baixo risco de rejeição. Ele explica que, por se tratar de um animal aquático, não existe cruzamento de infecções entre os seres humanos e a tilápia, diferentemente do que acontece com as próteses industriais, que utilizam materiais bovinos e suínos. As peles chegam ao bloco cirúrgico esterilizadas, embaladas a vácuo e prontas para o uso, após passarem por processo que engloba o beneficiamento, a limpeza e a extração, sob a coordenação do Núcleo de Processamento e Desenvolvimento de Medicamentos da UFC.

Média complexidade
A cirurgiã e coordenadora do Setor de Uroginecologia do HC, Marilene Vale C. Monteiro, explica que a cirurgia, considerada de média complexidade, tem duração de aproximadamente uma hora. O cirurgião cria um espaço entre a vagina e o reto, forrando-o com a pele de tilápia. Um molde em formato de vagina é então colocado nesse espaço para impedir que as paredes da "nova vagina" se juntem enquanto as células dos tecidos da paciente e as células e fatores de crescimento liberados pela pele de tilápia se transformam em um novo tecido com células iguais à de uma vagina real.

“As mulheres com a síndrome de Rokitansky, ou anegesia vaginal, nascem sem o canal vaginal, e os sintomas variam. Se elas não realizarem a cirurgia, não há como a menstruação descer, se a mulher tiver o útero, e elas terão dificuldade em manter relação sexual”, acrescenta.

A técnica, ainda em fase de estudo comparativo pelo Hospital das Clínicas – entre duas abordagens, uma delas utilizando a pele de tilápia –, vem sendo aplicada desde 2017 no Ceará e já beneficiou 25 pacientes em todo o país.  

Regenerador natural
A pele de tilápia também vem sendo utilizada com muito sucesso, no Ceará, no tratamento de queimados, como regenerador natural da pele humana. A técnica foi implantada em 2015 pelo pesquisador e cirurgião plástico Edmar Maciel, presidente do Instituto de Apoio ao Queimado (IAQ), vinculado ao Instituto Dr. José Frota (IJF), na capital cearense.

Na área ginecológica, além de auxiliar no tratamento da síndrome de Rokitansky, a pele de tilápia também é aplicada em cirurgias de redesignação sexual e reconstrução vaginal após radioterapia para câncer de vagina.

Sobre a Ebserh
O Hospital das Clínicas da UFMG, referência em procedimentos de média e alta complexidade, principalmente nas áreas de transplante, reprodução humana, cardiologia, neurologia e oncologia, integra a Rede Ebserh desde 2013. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) foi criada em 2011 e, atualmente, administra 40 hospitais universitários federais, que atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) e, principalmente, apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas.

Luna Normand | HC-UFMG/Ebserh