Pesquisa e Inovação

UFMG divulga balanço de caracterização de variantes do coronavírus em BH

Laboratório do ICB detectou a predominância da Gama, a mais letal, nos sete primeiros meses de 2021; vídeos da TV UFMG abordam o tema

Alpha, Beta, Gama, Delta: há um ano, elas eram apenas letras do alfabeto grego usadas pela matemática, física, química, astronomia e outras ciências. Hoje, elas preocupam: são nomes de variantes do Sars-CoV-2, o vírus que provoca a covid-19. A que foi descoberta mais recentemente é a Delta, objeto de estudo na UFMG. Uma das pesquisas realizadas na Universidade é a de caracterização de variantes em Belo Horizonte, a cargo do Laboratório de Biologia Integrativa (LBI) do Instituto de Ciências Biológicas (ICB).

Desde o ano passado, o LBI trabalha em parceria com a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), em uma frente nacional: a Rede Vírus do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). O laboratório da UFMG produziu balanço de caracterizações das variantes no primeiro semestre deste ano e no mês de julho, na capital mineira. Apesar de a variante Delta, a mais contagiosa, ser a mais noticiada nos últimos dias, em todo o mundo, a variante Gama é a mais presente em BH, nos últimos meses.

Segundo o professor Renan Pedra, coordenador do LBI, estudos científicos validados por pares mostram que a Gama é, atualmente, mais letal do que as demais variantes e a grande responsável pela alta mortandade da chamada segunda onda da pandemia no Brasil: a maior parte das mais de 550 mil mortes por covid-19 no Brasil se deu em decorrência de casos de infecções provocadas pela Gama.

Frequência das variantes do novo coronavírus em Belo Horizonte – jan. a jul. 2021
Frequência das variantes do novo coronavírus em Belo Horizonte (jan. a jul. 2021)Fonte: LBI UFMG (03/08/2021)
Frequência das variantes do novo coronavírus em Belo Horizonte – jan. a jul. 2021
Frequência das variantes do novo coronavírus em Belo Horizonte (jan a a jul. 2021)Fonte: LBI UFMG (03/08/2021)

A prévia do balanço cujos dados principais integram esta reportagem foi divulgada hoje, 3 de agosto, em primeira mão, à reportagem da TV UFMG. O relatório será disponibilizado na íntegra, ainda nesta semana, pela Rede Vírus do MCTI.

Dois primeiros casos da Delta em BH
No mês de julho, o LBI fez a caracterização dos dois primeiros casos da variante Delta do Sars-Cov-2, em Belo Horizonte. Na terça, 20, o laboratório da UFMG recebeu as amostras coletadas pela PBH quatro dias antes e confirmou as infecções pela Delta em pacientes vindos do Reino Unido no dia 26. "Recebemos semanalmente amostras do Laboratório de Biologia Molecular da Prefeitura de Belo Horizonte, provenientes de todas as regionais do município, a fim de termos um conjunto representativo. A PBH seleciona amostras diariamente, entre as que possuem carga viral suficiente para a caracterização de variantes. Com o número de amostras que processamos todas as semanas, esperamos detectar todas as variantes relativamente comuns em circulação na capital: aquelas com frequência superior a 6%", explica Renan Pedra.

Enquanto outras cidades do Brasil (incluindo as duas maiores do país, Rio de Janeiro e São Paulo) enfrentam a transmissão comunitária da variante Delta – etapa de maior significância local de transmissão de um vírus –, Belo Horizonte, no momento, tem dois casos identificados. Mas, devido a sua alta virulência, que é a capacidade de multiplicação dentro do organismo – a variante Delta infecta o corpo com mil vezes mais vírus do que o Sars-CoV-2 original –, e a seu potencial de transmissão, é apenas uma questão de tempo para que a capital esteja na fase de transmissão comunitária da variante Delta, caso os cuidados sanitários não sejam tomados, explica o coordenador do Laboratório de Biologia Integrativa.

O que são variantes?
A expressão variante, que antecede o nome Delta, popularizou-se em meio à pandemia de covid-19, declarada pela Organização Mundial da Saúde em março de 2020. Segundo Renan Pedra, cada variante representa uma versão diferente do vírus original: “elas surgem com o acúmulo de mutações ocorridas aleatoriamente, dado que, ao se replicar, o vírus ‘comete erros’, que têm como resultado as mutações. Nossa responsabilidade social está em deixarmos as cadeias de transmissão do vírus e das variantes acontecerem”.

Apesar de as pessoas não gerarem as mutações, que resultam em novas variantes do Sars-CoV-2, elas contribuem indiretamente para isso. Quanto menos se respeitam as regras básicas de contenção da pandemia, mais o vírus se replica e, em meio a essas cadeias de transmissão descontroladas, como a vivenciada pelo Brasil, maior é a chance do surgimento de uma nova variante.

Flexibilizações na chegada da Delta
A cada período, não apenas surgem novas variantes do novo coronavírus, mas, também, avançam medidas de flexibilização do distanciamento social destinado a conter a pandemia. Nesta semana, em Belo Horizonte, estudantes da educação infantil e do ensino fundamental retornam às aulas presenciais, em dias alternados, no chamado modelo híbrido. Além disso, a capital mineira autorizou a ampliação do horário de funcionamento de bares e o aumento da quantidade de pessoas que podem se reunir em shows e eventos (800 pessoas). 

A situação não é exclusiva de BH. Grande parte das cidades brasileiras também têm optado pelo avanço das flexibilizações, ainda que, de acordo com as secretarias municipais e estaduais de saúde, apenas 19,89% da população no Brasil esteja completamente imunizada, depois de receber duas doses ou dose única das vacinas contra a covid-19. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a vacinação da maior parte das populações é estratégia fundamental de controle da pandemia.

Para o professor Renan Pedra, é preciso responsabilidade ao se flexibilizar o distanciamento social, tanto para ajudar a controlar o espalhamento da variante Delta quanto para evitar o surgimento de novas variantes, mais transmissíveis do que a Delta e/ou mais letais do que a Gama. “É claro que as ações de flexibilização colaborarão, em algum nível, para a dispersão da variante Delta, e, aí, nos resta ver qual seria o resultado disso, já que, pela primeira vez, a variante Delta está entrando em um país em que é majoritária a dispersão da variante Gama”, alerta o coordenador do LBI.

CT-Vacinas caracteriza variantes em Minas

Além do trabalho de caracterização de variantes do vírus da covid-19 em BH, realizado pelos pesquisadores do LBI, a Universidade mantém outra iniciativa de apoio ao monitoramento e combate à pandemia: a caracterização de variantes em Minas Gerais feita pelo CT Vacinas. Na última semana, o Centro identificou dois novos casos da variante Delta no estado, no município de Virginópolis, no Vale do Rio Doce, região leste de Minas. A atuação do CT Vacinas se dá em parceria com a Fundação Ezequiel Dias (Funed-MG), vinculada ao governo estadual.

A TV UFMG fez três perguntas acerca da variante Delta ao pesquisador do CT Vacinas Flávio da Fonseca. As respostas estão no vídeo.

Pesquisadores, pandemia e saúde mental

O trabalho dos pesquisadores do LBI e do CT Vacinas se soma ao de pesquisadores do mundo todo, que, desde o início do último ano, dedicam-se a encontrar vacinas, tratamentos e medidas eficazes contra a covid-19. Se, para as pessoas em geral, tem sido difícil manter a saúde mental, em meio a tantas notícias sobre a pandemia, para quem tem como tarefa diária estudar o vírus não é diferente. Segundo Renan Pedra, “manter minimamente a saúde mental está pesado demais. Os dias são exaustivos no laboratório”.

Uma forma de expressar gratidão ao trabalho de cientistas do mundo todo e simultaneamente diminuir o tempo de estado de pandemia, que afeta tanto a todos, é ajudar a conter o vírus, respeitando os protocolos sanitários. “Fica um alerta para a população: mantenha a higienização das mãos, o uso de máscaras ao sair de casa, o isolamento social, sempre que possível, e tome a vacina, tão logo ela esteja disponível para cada faixa etária”, finaliza Renan Pedra.

Flávio da Fonseca, do CT Vacinas, concorda: “é uma exaustão profunda, que engloba tudo, compromete saúde física e mental. O que sintetiza tudo é: enquanto grande parte das pessoas trabalhavam de forma remota, nos piores momentos da pandemia, nós, cientistas, que lidamos diretamente com a covid-19, estávamos trabalhando de forma presencial. Tivemos medo, insegurança, além de estarmos extremamente pressionados e ocupados, com um volume de trabalho que não tínhamos em situações normais. Eu mesmo sofri as consequências desses momentos tão únicos e difíceis: tive um infarto no fim do ano passado, por tanto estresse”.

Equipe: Ruleandson do Carmo (produção, reportagem e edição de conteúdo), Antônio Soares (imagens) e Otávio Zonatto (edição de imagens)