Pesquisas buscam novas formas de tratar a leishmaniose
Às voltas com injeções dolorosas e que provocam reações adversas, os portadores de leishmaniose tegumentar e cutânea podem estar ganhando um novo alento com as mais recentes pesquisas desenvolvidas na UFMG. Estudos em andamento na Faculdade de Farmácia e Instituto de Ciências Biológicas buscam alternativas para aperfeiçoar o tratamento da doença, baseadas na melhoria da forma tópica (aplicada no local das lesões) e na associação com a imunoterapia, que estimula reações do sistema imunológico.
Para um dos coordenadores do projeto, o professor Lucas Antônio Miranda Ferreira, do Departamento de Produtos Farmacêuticos da Faculdade de Farmácia, o tratamento tópico viabiliza a redução de efeitos adversos e a aplicação do medicamento pelo próprio paciente. "Só que a única formulação comerciali- zada atualmente, a pomada, permite absorção de apenas 15% da paromomicina, antibiótico usado para combater a leishmania", ressalva Ferreira.
Uma alternativa promissora, segundo o professor, é a forma creme, que permite a absorção de 40% do medicamento. Essa descoberta foi possível graças a uma ferramenta inédita usada por sua equipe, o teste de absorção in vitro, feito com fragmentos de pele de camundongo. O pesquisador parte agora para experiências com gel. "É uma formulação que certamente possui poder de absorção ainda maior", acredita Lucas Ferreira.
Os testes empreendidos pelo grupo também avaliam o uso de lipossomas, pequenas bolsas ou vesículas que, colocadas num creme, por exemplo, podem levar o medicamento ao interior das células tomadas pelos parasitas.
Imunoterapia
Os testes com seres vivos já começaram. Seu objetivo é verificar se a eficácia do medicamento é diretamente proporcional à sua capacidade de absorção. A professora Ana Paula Fernandes, do Departamento de Análises Clínicas da Faculdade de Farmácia, acredita que a relação entre absorção e efeito clínico seja, de fato, muito grande.
Nos testes, os camundongos são tratados com pomada ou creme contendo o antibiótico paromomicina. As lesões somem, mas retornam alguns dias depois, muitas vezes com o parasita disseminado pelo corpo e presente em órgãos como fígado e baço. A partir daí, começa a ser utilizada a citocina, proteína que age sobre o sistema imunológico. Segundo Ana Fernandes, esse estímulo faz as células de defesa dos animais diminuírem a carga parasitária, mesmo quando as lesões já estão bem desenvolvidas. "O tratamento nesse estágio é muito importante, pois os pacientes geralmente chegam ao médico com grandes úlceras na pele e com o parasita já disseminado", explica a pesquisadora.
Nos camundongos observados durante 120 dias, a equipe constatou, em média, 60% de cura. Nos grupos em que as doses de citocina foram maiores, esse índice atingiu 80%. Os pesquisadores pretendem, agora, associar a aplicação de vacinas ao tratamento convencional, já que elas se mostraram eficientes na prevenção da leishmaniose cutânea. Essa combinação vem sendo usada pela equipe do professor Wilson Mayrink, do ICB, no tratamento da leishmaniose tegumentar.
Para Ana Fernandes, o grande desafio é encontrar formulação e tratamento adequados às doenças causadas por parasitas mais freqüentes no Brasil. Já estão em curso, por exemplo, os testes com a leishmania mexicana amazonensis, variedade que tem se revelado mais resistente e com maior poder de disseminação.
Pesquisa: Desenvolvimento das formulações contendo paromomicina e da imunoterapia com a IL12 para o tratamento tópico da leishmaniose cutânea experimental
Financiamento: Fapemig
Equipe: Ana Paula Fernandes, Lucas Antônio Ferreira, Sérgio Gomes e Gisele Castro ( Faculdade de Farmácia), Carlos Alberto Pereira Tavares, Ricardo Gazzinelli, Fernando de Amorim Carvalho e Wagner Luiz Tafuri (ICB).
Urbanização da doença é preocupante
As leishmanioses tegumentar e cutânea são transmitidas por espécies do mosquito Lutzomyia. A doença caracteriza-se por lesões na pele, que podem estar localizadas ou espalhadas pelo corpo, podendo atacar mucosas ou vísceras.
A doença ocorre em todos os estados brasileiros, exceto no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Distrito Federal. A incidência é maior nas regiões Norte e Nordeste. No Sudeste, Minas Gerais lidera as estatísticas de casos cerca de 450 em 1998. Um fator que preocupa é a crescente urbanização da doença. "Ela é cada vez mais freqüente em regiões metropolitanas, como as de BH, Rio e Salvador", diz o professor Ricardo Gazzinelli, do departamento de Bioquímica e Imunologia e integrante da equipe.