Apoio internacional
Intelectuais franceses se posicionaram contrariamente à operação, e pesquisadores americanos endossaram manifesto de colegas brasileiros
Mais de 100 intelectuais franceses ou radicados na França assinaram manifesto internacional de solidariedade à comunidade universitária da UFMG devido à operação da Polícia Federal deflagrada no dia 6 de dezembro. Nomes como os de François Jost, professor emérito em Ciências da Informação e Comunicação da Universidade de Sorbonne, Jacques Aumont, diretor do Centro de História do Cinema da Cinemateca Francesa, e do físico e filósofo Michel Paty, diretor de pesquisas do Centro Nacional e Pesquisas Científicas da França (CNRS), assinam o documento criado por iniciativa da historiadora Maud Chirio, da Universidade de Marne La Vallée, estudiosa da ditadura militar brasileira.
No documento, professores e pesquisadores de diferentes nacionalidades afirmam que “condenam firmemente o tratamento infligido aos nossos colegas da Universidade Federal de Minas Gerais. Consideramos que a instrumentalização da coerção policial e dos processos judiciais para fins de perseguição política, ou lawfare, é incompatível com o estado de direito. Esses processos afetam dramaticamente a imagem do Brasil no exterior e a sua identificação como uma verdadeira democracia pela comunidade internacional”.
Com milhares de assinaturas, manifesto de intelectuais brasileiros foi traduzido para o inglês e está circulando nos Estados Unidos por iniciativa do grupo Acadêmicos e Ativistas para a Democracia no Brasil, que tem entre os seus membros o historiador James Green. Um dos signatários do documento é o linguista e filósofo Noam Chomsky. O grupo de Green também traduziu e está disseminando nos Estados Unidos o manifesto francês encabeçado por Maud Chirio.
Os intelectuais lembram que, nos últimos meses, as ações policiais passaram a ter como alvo as universidades públicas brasileiras, ainda que, diferentemente de muitas instâncias do sistema político, elas estejam submetidas ao controle da CGU e do TCU, respeitando as normas legais e os princípios da contabilidade pública em suas atividades e procedimentos. “Portanto, não existe nenhum motivo pelo qual devam se estender a elas as ações espetaculares de combate à corrupção”, sustentam.
A Rede Ibero-americana de Investigadores sobre Globalização e Território, baseada na Cidade do México, foi outra entidade a se posicionar sobre as operações da Polícia Federal nas universidades brasileiras. Em mensagem, a Rede destacou que os pesquisadores ibero-americanos “se sentem também afetados por tais medidas e se manifestam contra qualquer ato que impeça a liberdade de exercício das atividades acadêmicas”.
Imprensa
A operação da PF na UFMG também recebeu críticas de setores da imprensa brasileira. A jornalista Miriam Leitão escreveu em sua coluna de 10 de dezembro, no jornal O Globo, que “a Polícia Federal cometeu evidentes abusos e truculência ao executar a ordem de levar o reitor Jaime Ramírez e a vice-reitora Sandra Goulart para depor”.
A jornalista relatou as dificuldades enfrentadas pela Universidade para executar o projeto do Memorial da Anistia, alvo da investigação. “O fato é que a decisão, tomada na gestão anterior da UFMG, foi de construir esse memorial aproveitando um antigo prédio da universidade, chamado de Coleginho, porque abrigou o colégio de aplicação. A construtora JRN, contratada para fazer a obra, na qual constava também um prédio de dois andares, para a parte administrativa, cometeu um erro grave. Não avaliou se a fundação do Coleginho suportava a obra. Quando colocou o novo telhado, as paredes começaram a ruir. A UFMG entrou na Justiça contra a construtora. Aí veio a mudança para o governo Temer, e o repasse dos recursos do Ministério da Justiça foi suspenso, e, por isso, a obra está parada”, detalhou.
O jornalista e cientista político André Singer, em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo, no sábado, dia 9, chamou a atenção para o que chama de “ação orquestrada e arbitrária” para desmoralizar o sistema de ensino superior público no Brasil. “Reparem nos nomes das operações sequenciais da PF: PhD, Ouvidos moucos, Esperança equilibrista, Torre de marfim”, observou.
Em sua edição de domingo, 10, a Folha de S. Paulo voltou a abordar o assunto por meio dos jornalistas Elio Gaspari e Paula Cesarino Costa. No texto Caçar reitor virou um hobby exibicionista, Gaspari criticou o caráter midiático da ação. “Levados à sede da Polícia Federal, os professores depuseram e foram libertados, com a imprensa na porta para entrevistá-los e fotografá-los na condição de suspeitos. Os professores viram-se expostos, mas não se apresentou qualquer acusação específica contra eles. Tipo ‘A’ é acusado disso, ‘B’ é acusado daquilo”, destacou.
Paula Cesarino, ombusdman da Folha, analisou a cobertura do jornal nos seguidos episódios de operações da PF nas universidades brasileiras. “É preciso tirar do chamado piloto automático a cobertura das operações policiais, de seus agentes e de seus métodos. Tais ações têm evidente interesse público. Cabe à imprensa cobrar de investigados e investigadores. Leitores questionam como lidar com as operações de modo a analisá-las também por eventuais inconsistências, arbitrariedades e objetivos políticos, além de avaliar sua divulgação ou não”, escreveu a jornalista.