Declaração inspiradora

Rede de direitos

Grupos de extensão da UFMG trabalham para fazer valer os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos

Nesta segunda-feira, 10 de dezembro, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), um dos documentos mais importantes produzidos no século passado, completa 70 anos. A Declaração defende a igualdade e a dignidade das pessoas e condena a discriminação por raça, cor, gênero, idioma, nacionalidade, religião ou opinião política.

Para contribuir com a efetividade da DUDH, a Pró-reitoria de Extensão mantém, há pouco mais de dois anos, a Rede Direitos Humanos UFMG, que promove discussões sobre violações ao reunir e articular cerca de 20 grupos, laboratórios e núcleos de extensão, ensino e pesquisa para tratar da temática. De caráter interdisciplinar, a Rede propõe a construção de uma agenda de troca, interlocução e cooperação continuada entre seus membros em diálogo com políticas públicas, movimentos, coletivos e organizações sociais. Atualmente, apoia projetos que lidam com temáticas ligadas às populações vulneráveis, ao gênero e sexualidade, à cidade, a populações de rua e a questões raciais.

A pró-reitora de Extensão, Claudia Mayorga, lembra que a Declaração menciona a importância da educação para a construção de uma cultura de direitos humanos. “A universidade pode e deve contribuir por meio de ações de extensão, de ensino, de pesquisa e também de suas práticas institucionais para que os saberes e práticas aqui produzidos se juntem aos esforços de construção de um mundo mais justo e democrático”, afirma a professora. “Felizmente, a UFMG tem muitas iniciativas nesse sentido, com grande impacto em grupos vulneráveis, instituições e políticas públicas”, acrescenta.

Algumas dessas iniciativas estão descritas a seguir.

Gênero e sexualidade
Uma adolescente negra, moradora da periferia da capital mineira, que ocupava o “cargo” de gerente do tráfico e era conhecida como “homem do tráfico”, foi cobrar uma dívida relacionada à venda de drogas. O devedor a recebeu com desdém: “Nem homem de verdade você é”. A garota irritou-se com a provocação e agrediu a vítima, o que a levou a cumprir medida socioeducativa de internação. 

Casos como esse são passíveis de acolhimento pelo projeto de extensão Gênero e sexualidade: ações interdisciplinares, coordenado pela professora Lisandra Espíndula Moreira, do Departamento de Psicologia da Fafich. A ação mobiliza estudantes dos cursos de Psicologia e Direito em parceria com a Clínica de Direitos Humanos da UFMG, que também integra a Rede. 

“Completamos dois anos de projeto e concentramos a atuação em duas frentes de trabalho: uma referente à discussão sobre maternidades em contextos de vulnerabilidade social e outra relacionada à discussão de sexualidade no sistema socioeducativo. Acompanhamos casos específicos e construímos debates ampliados como estratégia para a mudança de contextos gerais de desigualdades em relação a marcadores de gênero, sexualidade, raça e pobreza, entre outros”, explica Lisandra.

Troca de saberes
O projeto de extensão Sistemas Elétricos Experimentais (Selex), que envolve estudantes das engenharias de Sistemas e Elétrica, e de Psicologia, estimula os laços escolares e o reposicionamento sociopolítico de jovens com idade de 12 a 18 anos que cumprem medidas socioeducativas. “A ação é baseada em oficinas de trocas de saberes entre esses jovens e os extensionistas”, afirma a professora Lisandra Moreira, que também participa da iniciativa coordenada pelo professor Lucas de Souza Batista, do Departamento de Engenharia Elétrica da Escola de Engenharia. Em funcionamento desde 2010, o projeto conta com parceria da Prefeitura de Belo Horizonte. 

Cidadania
Um dos programas de extensão mais tradicionais da UFMG, o Polos de Cidadania dedica-se à identificação de violações. “Há mais de 20 anos, o Polos tem como meta a promoção dos direitos humanos por meio da formação, do empoderamento, das ações em comunidades de Belo Horizonte e nos municípios de Conceição do Mato Dentro e Dom Joaquim. São ações jurídicas, sociais e educativas que possibilitam o diagnóstico, a identificação e o combate às violações”, explica a coordenadora, professora Marcella Furtado, da Faculdade de Direito. 

Poder às mulheres
O combate a violações também é um dos eixos do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem), da Fafich, especificamente em relação aos direitos das mulheres negras, pobres e lésbicas. “Nossos projetos e programas de extensão mantêm estreita relação com a Declaração Universal dos Direitos Humanos”, comenta a professora Marlise Matos, coordenadora do Nepem.

Um exemplo é o projeto Mulheres construindo cidadania: iniciativas para o empoderamento econômico de mulheres e construção da igualdade de gênero em Minas Gerais, do qual participam 12 grupos de mulheres com seus empreendimentos econômicos, acompanhados durante mais de um ano. “Foram cerca de 600 mulheres, e cada empreendimento contava com, ao menos, 20 pessoas, metade delas residentes na Região Metropolitana de Belo Horizonte e a outra, no Vale do Jequitinhonha”, explica Marlise. Segundo ela, o principal critério de seleção desses grupos foi a situação de vulnerabilidade social e econômica, além do papel de liderança que desempenham em suas comunidades quilombolas, indígenas ou em assentamentos rurais, mas com risco permanente de terem seus direitos violados.

Manifestação apoiada pelo Polos de Cidadania: ações em BH e no interior de Minas Gerais
Manifestação apoiada pelo Polos de Cidadania: ações em BH e no interior de Minas Gerais Acervo Polos de Cidadania

Outra iniciativa que compõe a Rede Direitos Humanos UFMG é o Grupo Gênero, Sexualidade e Sexo (GSS), da Faculdade de Educação, sob a coordenação da professora Adla Betsaida Martins Teixeira. “Nosso grupo tem desenvolvido várias iniciativas na promoção dos direitos de mulheres, meninos e homossexuais”, conta a professora.

Algumas ações do GSS são realizadas em escolas públicas. Uma delas estimula a difusão do conhecimento científico como direito humano, estimulando o interesse dos estudantes pelo universo da ciência. “A discussão sobre gênero, apesar de todo esse preconceito contra a ‘ideologia de gênero’, deve ser feita. Gênero não se limita apenas a meninas e mulheres, mas à condição das pessoas nas instituições escolares. Nossa proposta é promover educação para todos”, enfatiza Adla Betsaida. 

A professora destaca estudo recente desenvolvido pelo GSS, segundo o qual mulheres pesquisadoras na UFMG são mais produtivas que os homens. “Apesar disso, a instituição ainda precisa incentivar mudanças na sua organização e nos métodos de ensino a fim de melhorar o ambiente acadêmico para a atuação das mulheres”, defende a professora Adla Betsaida.

Nepem acompanhou empreendimentos conduzidos por mulheres
Nepem acompanhou empreendimentos conduzidos por mulheres Acervo Nepem


Vacina contra a barbárie


Proposta pela Organização das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos surgiu no contexto do pós-segunda guerra mundial, quando a humanidade viveu os horrores do nazismo, e a superação da barbárie era urgente. “Houve outras atrocidades ao longo da história, como a escravidão, mas a Segunda Guerra Mundial foi um marco importante”, avalia a professora Cláudia Mayorga. Ela lembra que, em seus 30 artigos, o documento sintetiza a proteção de direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais e reconhece como supremos os valores da igualdade, liberdade e fraternidade, já presentes na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa (1789).

As violações contra a Humanidade não cessaram e devem ser preocupação constante dos povos e sociedades. “Os direitos previstos na Declaração, universais e imprescritíveis, têm sido ampliados e relidos com base na atuação contínua de grupos e sujeitos que reivindicam a sua própria humanidade. O documento é marco fundamental para a garantia da liberdade, da dignidade e dos direitos de todos os povos e para a diminuição das desigualdades sociais”, conclui Claudia Mayorga.

A TV UFMG produziu um vídeo sobre o Centro de Estudos de Justiça de Transição (CJT/UFMG).

Entrevistados: Emílio Meyer, coordenador do CJT/UFMG, Raquel Gonçalves, pesquisadora do Centro, e Salvio Penna, ex-preso político
Produção: Marden Ferreira
Reportagem: Gabriele Álvares, Renato Temponi
Imagens: Antônio Soares
Edição de imagens: Kennedy Sena

Zirlene Lemos, jornalista da Pró-reitoria de Extensão