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Projeto de extensão forma professores da educação infantil em BH para trabalhar a linguagem corporal, apostando na criatividade das crianças

Tecidos, bolas e plásticos favorecem a expressão corporal das crianças
Tecidos, bolas e plásticos favorecem a expressão corporal das crianças Acervo Projeto

Desde 1996, a Educação Infantil é tratada oficialmente como a primeira etapa da Educação Básica. Em 2009, as diretrizes curriculares nacionais para o segmento passaram a preconizar propostas pedagógicas, para a faixa de 0 a 6 anos, que valorizam princípios estéticos, além de éticos e políticos. O espírito que guiou essas determinações é o mesmo que move o projeto de extensão Linguagem corporal na educação infantil – capacitação de professores numa perspectiva teórico-prática, vinculado à Escola de Belas Artes. Há sete anos, o projeto atua nas Umeis, em Belo Horizonte.

O desafio, segundo a professora da Licenciatura em Dança Ana Cristina Pereira, coordenadora do projeto, é oferecer aos professores ferramentas para o trabalho intencional com a linguagem corporal, aproveitando a bagagem levada, desde muito cedo, pelas crianças. “O corpo sempre esteve dentro da escola, mas é preciso estimular a consciência dos professores. Nosso trabalho tem a forma de residência e reúne professores e alunos. Mostramos que é possível fazer – e como se faz – abrindo espaço para a discussão de nossas propostas”, explica Ana Cristina, que está à frente também do Laboratório de Estudos do Gesto e Cognição (GestoLab) e participou da elaboração das proposições para a Educação Infantil no município de Belo Horizonte.

Os fundamentos desse esforço, segundo a pesquisadora, são a autoralidade e a criatividade. Ela lembra que, ao usar a dança, a escola regular, quase sempre, fez os alunos reproduzirem coreografias. “Lidamos com outra concepção da capacidade das crianças, entendemos que elas são propositivas, mas sabemos que os professores não tiveram essa formação”, ressalta Ana Cristina.

A pesquisa e a ação são guiadas por teóricos como o coreógrafo e teatrólogo eslovaco Rudolph Laban, que criou a noção de “fatores do movimento” (peso, tempo, espaço e fluência), o bailarino e coreógrafo mineiro Klaus Vianna (consciência corporal e autoralidade) e a professora de dança e escritora Isabel Marques, que se dedica à inserção da dança na escola. 

O trabalho com as crianças lança mão de materiais como tecidos, com os quais se desenvolve a fluência, bolas (articulações e improvisação) e elásticos (apoios). “Os materiais têm papel essencial para o melhor entendimento dos conceitos”, afirma Ana Cristina Pereira, acrescentando que a equipe faz uso também de recursos disponíveis nas Umeis. 

Práticas transformadas
O projeto Linguagem corporal na Educação Infantil foi iniciado em 2012 e atuou em nove Umeis, atendendo cerca de 200 professores e 850 alunos. As residências têm duração de um ano, período necessário, segundo a coordenadora, para a transformação das práticas. Além das atividades em sala de aula, são realizados encontros para formação mais sintética de outros integrantes da equipe pedagógica da unidade. “Somos bem recebidos, notamos que a proposta é uma demanda importante da Educação Infantil, e o retorno é muito positivo nas avaliações ao fim de cada ciclo”, diz Ana Cristina, que desenvolveu seus estudos de mestrado e doutorado com foco na relação entre arte e educação.

A parceria com a Secretaria de Educação de Belo Horizonte inclui cursos de formação de professores de outras unidades, como mecanismo de ampliação do entendimento da proposta na rede municipal. Ana Claudia Brasil, pedagoga da Gerência da Coordenação de Educação Infantil, afirma que a formação em linguagem corporal tem forte impacto no trabalho educativo realizado nas Umeis: “O reconhecimento da corporeidade como meio de compreensão da criança sobre o mundo e de sua ação no ambiente que a cerca tem trazido mudanças significativas nas práticas em sala de aula. É fundamental garantir peso equivalente para todas as linguagens na Educação Infantil.”

As pesquisas e as ações de formação viabilizadas pelo projeto de extensão já renderam trabalhos de conclusão de cursos de graduação, projetos de iniciação científica, dissertações de mestrado e artigos em periódicos nacionais e internacionais.

Itamar Rigueira Jr.