Otimistas e curiosos
Pesquisa inédita organizada na UFMG, cujos resultados estão compilados em livro, revela percepção que os mineiros têm da C&T
Em Minas Gerais, assim como no resto do país, é grande o desconhecimento das pessoas com relação ao universo da ciência e tecnologia. Mas, nesse caso, ignorar não significa temer ou desconfiar da atividade e dos cientistas. Os mineiros veem de forma positiva o trabalho das instituições de pesquisa e dos pesquisadores. E também se mostram dispostos a questionar sobre riscos de diversas naturezas e reivindicar controle da produção científica.
Essas são algumas das conclusões da pesquisa A opinião e o conhecimento dos mineiros sobre ciência e tecnologia, coordenada e realizada na UFMG, com participação de pesquisadores de outras instituições, e financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig). Os resultados estão compilados no livro Os mineiros e a ciência (editora KMA, 166 páginas, distribuição gratuita).
Os cidadãos “menos conservadores” depositam mais confiança nos cientistas
De acordo com os organizadores, as informações geradas pelo estudo têm potencial para apoiar a concepção de experimentos inovadores na busca do engajamento público em C&T nos campos da educação formal e não formal em ciências, da divulgação -científica e das políticas públicas.
Pela primeira vez foi investigada a influência de valores – -religiosos, políticos, morais, entre outros – sobre a percepção e as atitudes dos mineiros quanto à ciência e à tecnologia. Os pesquisadores constataram, por exemplo, que os cidadãos “menos conservadores” depositam mais confiança nos cientistas.
Pesos equivalentes
De acordo com a professora Elaine Vilela, do Departamento de Sociologia da Fafich, uma das coordenadoras da pesquisa, as variáveis relacionadas às características socioeconômicas e demográficas (sexo, escolaridade, renda, idade) “não são suficientes para explicar a variação na percepção dos mineiros sobre ciência e tecnologia”. Outros fatores devem ser considerados na análise, como as medidas de valores e as de localização espacial. O trabalho também foi liderado pelo professor Yurij Castelfranchi, colega de Departamento de Elaine e coordenador do Observatório Interdisciplinar InCiTe (Inovação, Cidadania, Tecnociência).
Embora a maioria das pessoas em Minas Gerais declare ter interesse elevado em temas de cunho científico e tecnológico e veja de forma positiva as instituições que fazem pesquisa, assim como a qualidade da C&T no Brasil, o acesso à informação ainda é baixo e marcado por desigualdades. “Espaços e atividades de difusão da ciência, como museus e debates, são ainda pouco frequentados. E o consumo de informação científica nos meios de comunicação é significativo apenas para uma minoria da população”, comenta Elaine Vilela. O estudo revela, por exemplo, que poucos mineiros – incluindo os mais interessados e de escolaridade mais alta – conseguem dizer o nome de uma instituição de pesquisa no estado ou de algum cientista brasileiro.
"Espaços e atividades de difusão da ciência, como museus e debates, são ainda pouco frequentados"
Os relatos sobre os resultados da pesquisa enfatizam também que os mineiros são capazes de questionar implicações e riscos ambientais e éticos relacionados à atividade científica. Eles se dizem favoráveis ao controle social e político da ciência e à formulação de códigos de conduta. “As pessoas não têm visão simplista ou ingênua e querem ser ouvidas antes de decisões importantes”, diz Elaine.
Fome e pobreza
De modo geral, homens e mulheres consideram que ciência e tecnologia vão contribuir para eliminar a pobreza e a fome no mundo. E os homens, mais do que as mulheres, avaliam que os cientistas têm poderes – derivados do conhecimento – que os tornam perigosos. A concordância total com as duas teses diminui quando aumenta a escolaridade. As pessoas – sobretudo os homens – também entendem que a ciência e a tecnologia são responsáveis pela maior parte dos problemas ambientais.
O trabalho sobre a percepção dos mineiros acerca da ciência e da tecnologia é resultado da aplicação de dois mil questionários presenciais domiciliares, com 100 perguntas. Um pré-teste cognitivo procurou mensurar o grau de compreensão das questões e das categorias disponíveis para as respostas. Algumas perguntas foram alteradas, mas a comparabilidade com outros estudos foi preservada.