Fruto do cerrado

Opinião: Um presente para o ICB

Em fevereiro de 2018, o Instituto de Ciências Biológicas celebrará seu quinquagésimo aniversário. O governo federal ofertou-lhe parte do presente, e a outra está sendo gestada. Antes de externar o que vem por aí, segue um pequeno relato sobre o Instituto. 

O ICB é composto de dez departamentos acadêmicos que são responsáveis por disciplinas oferecidas a cursos de graduação das áreas de biológicas/saúde. São 21 cursos com 4.366 estudantes que permanecem no Instituto por até quatro semestres letivos, exceto os de Ciências Biológicas. Esses discentes são apresentados a disciplinas ministradas em 119 laboratórios. Além de se destinarem ao ensino de graduação, esses laboratórios dão suporte a conhecimento novo produzido por 1.350 estudantes em 16 cursos de pós-graduação stricto sensu. 

Boa parte do que é produzido no ICB é ciência básica – informação que será usada por outros pesquisadores para desvendar fenômenos aplicados. Vacinas e kits para diagnósticos variados são produtos finais também abundantes nos laboratórios do ICB. Em média, de 25 a 30 patentes são depositadas a cada ano pelos pesquisadores do Instituto, que também investe em vasta publicação de artigos científicos em revistas especializadas, que é outra maneira de quantificar produção de conhecimento. Os professores do ICB publicam,  em média, por ano, 1.200 artigos, resultantes do trabalho de dissertações e teses dos pós-graduandos – são 350 novos mestres e doutores a cada ano. Pois bem, o que prepara o governo federal para homenagear o ICB em seus 50 anos?

O orçamento da UFMG é essencial para entendermos a seriedade do problema. Dele vem a principal verba para manutenção do ICB. De modo simples, o orçamento pode ser dividido em duas rubricas: uma chamada custeio, da qual se origina o dinheiro para manutenção do funcionamento básico da universidade (da energia elétrica ao papel higiênico), e outra chamada capital, sob cujo guarda-chuva a UFMG realiza obras de infraestrutura. A construção da moradia estudantil e dos prédios dos CADs (o terceiro deve ser inaugurado em março) recebe recursos dessa rubrica. Até o início do mês passado, o governo federal havia desembolsado o equivalente a 40% do orçamento para a rubrica capital. Ou seja, menos da metade da verba para obras havia, de fato, sido liberada. No que se refere à rubrica custeio, 65% foram liberados no mesmo período, o que significa que o pagamento a fornecedores da UFMG pode ser comprometido a qualquer momento. A direção do ICB já informou que esses percentuais devem alcançar 60% para capital e 85% para custeio até o final de 2017. Dois pontos importantes a respeito desse orçamento: a) nem mesmo esses percentuais estão garantidos, trata-se de uma previsão; b) devemos nos lembrar da Emenda Constitucional 95, ex-PEC 241, que impôs nova metodologia para orçamento em órgãos públicos. Nesse caso, o orçamento para 2018 deve ter por base o orçamento executado em 2017, acrescido do índice oficial de inflação. Ou seja, se executamos somente 60% do orçamento em 2017, é sobre esse valor que o orçamento de 2018 será calculado, o que quer dizer, na prática, que a UFMG terá, em 2018, um orçamento menor que aquele de 2017. Essa será uma parte do presente de aniversário que receberemos. 

A outra parte do presente já nos foi ofertada e diz respeito ao financiamento direto de projetos de pesquisa. Existem duas vertentes para financiamento dessas pesquisas. Na forma direta, agências de fomento, Fapemig, CNPq, entre outras, publicam editais, e os pesquisadores se candidatam. Os aprovados conseguem, assim, financiar suas linhas de pesquisa. A situação desse tipo de financiamento tem-se deteriorado nos últimos tempos. Recentemente, a Fapemig conseguiu quitar os pagamentos referentes ao edital universal do ano de 2015. O edital/2016 ainda não foi pago. Já o CNPq não lançou edital universal em 2017 – pela segunda vez nos últimos três anos. Isso mostra que as pesquisas estão sendo levadas à morte por inanição. Sem financiamento não se produz conhecimento. 

Outra maneira de complementar o financiamento direto de pesquisas é por meio da concessão de bolsas aos estudantes, que financiam desde o graduando até o pós-doutorando. Cada uma é destinada a um tipo de formação de recurso humano. Essas bolsas são destinadas aos programas de pós-graduação da UFMG. Como exemplo da situação, o Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas Fis-Far (nível de excelência pela Capes) teve 15 bolsas de doutorado suprimidas, com reversão parcial dessa perda ocorrida em 2015. 

São essas, portanto, as condições para celebrar os primeiros 50 anos do ICB. Em que pese o esforço da direção do Instituto, dos docentes e demais servidores na busca de financiamento e de melhor gestão dos parcos recursos, o torniquete imposto pelo governo atingirá um ponto irreversível. Já estamos presenciando a fuga de cérebros do Brasil para outros países onde a educação e a ciência são tratadas como política de Estado e não de governo. A miopia de técnicos que manejam planilhas e de agentes políticos despreparados que enxergam somente números onde deveriam ver investimento custará, não só ao ICB, mas também às gerações futuras de brasileiros, a dependência perigosa de tecnologia e conhecimento produzidos por outros países. 

Não são essas as notícias que gostaríamos de trazer à comunidade em um momento que deveria ser de celebração, mas somos compelidos a mostrar o que somos, o que fazemos e, principalmente, como romperemos os próximos 50 anos. Parabéns, ICB! 

Helton J. Reis, professor do Departamento de Farmacologia do ICB