Genética e Alcoolismo

Na contramão

Menos estacionamento e mais cidade é o lema do Instituto de Políticas para o Transporte e o Desenvolvimento, do México. Trata-se de uma massiva campanha do governo mexicano para mudar a visão, equivocada, da população que acredita que quanto mais estacionamento para automóveis, mais fácil é deslocar-se pela cidade. 

Ao contrário: pesquisas realizadas em várias grandes cidades do mundo comprovam que, quanto mais estacionamento disponível, mais pessoas optam pelo automóvel particular, sobrecarregando o tráfego e congestionando as vias de circulação.  Além disso, o excesso de automóveis traz outras graves consequências, como o aumento da poluição atmosférica, violência no trânsito, desperdício de áreas e de recursos que poderiam ser aplicados em ambientes de lazer e praças ou mesmo na melhoria e na diversificação do transporte coletivo.

No entanto, os técnicos que elaboraram o Plano Diretor do campus Pampulha e as autoridades da UFMG que o aprovaram trafegam na contramão dessa tendência. O documento prevê que os tradicionais e únicos campos de futebol e lazer existentes no campus – o da Assufemg e o da FaE – serão transformados em “estacionamentos periféricos”, o que revela, por parte dos seus formuladores, profundo desconhecimento em relação ao uso intenso que a comunidade universitária faz dessas áreas esportivas. Além de partidas informais, esses campos recebem atividades de vários programas de funcionários da universidade, que, com recursos próprios, contratam alunos da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional para manter escolinhas de futebol para seus filhos e meninos da ­redondeza. 

O uso dessas áreas configura ações verdadeiramente extensionistas e põe em prática o que a UFMG preconiza. As últimas edições do seu Festival de Inverno, por exemplo, têm sido focadas na apropriação do espaço universitário com trânsitos acadêmicos e não acadêmicos, no caráter público do campus e na construção de espaços compartilhados com a cidade.

Os acadêmicos da área de esporte e lazer e os especialistas em urbanismo consideram que as áreas esportivas e de lazer em coletividades devem ser regra e não exceção. Há cerca de 30 anos, iniciativa desenvolvida pela divisão de planejamento físico da Universidade, o Projeto de Recuperação da Área dos Serviços Gerais (Rasg), propunha reformar espaços no entorno da Escola de Belas-Artes, como o horto, oficinas, almoxarifado, administração e galpões que formavam o canteiro de obras dos primórdios do campus, além do prédio da Assufemg e da cantina Pelego’s. 

A comunidade também reivindicava uma área de convívio e lazer, formada, principalmente, pelo campo ali existente e por quadras de vôlei, peteca, raia de malha e pista de caminhada, entre outros equipamentos esportivos que seriam construídos.  A infraestrutura e as instalações prediais foram executadas. A área de lazer não saiu do papel, e apenas o campo foi preservado, sendo utilizado até hoje, inclusive por adeptos do rúgbi.

O campo da Faculdade de Educação, igualmente tradicional, surgiu em condições melhores, pois seu gramado era idêntico ao do estádio do Mineirão, implantado para testes pelo engenheiro agrônomo Camilo Fonseca, funcionário da Universidade que criou o Museu de História Natural, no bairro de Santa Inês, e o horto do campus. Camilo foi responsável pelo plantio do primeiro gramado do Mineirão, projetado pelo arquiteto Eduardo Mendes Guimarães Jr., também autor do prédio da Reitoria. Aliás, nas imediações do campo da FaE, existe um histórico vestiário, singelo projeto do mesmo arquiteto, que se encontra praticamente abandonado. Por causa da qualidade do gramado, os principais times mineiros chegaram a treinar ali. Ou seja, além de importantes espaços de esportes e lazer, essas instalações têm valor histórico para a Universidade.

Os formuladores do Plano Diretor do campus Pampulha consideram dispensáveis áreas de lazer e esportes. Se o plano tivesse sido amplamente debatido com a comunidade universitária, talvez tivessem percebido esse grande equívoco e colhido sugestões e alternativas, como criação de ciclovia com piso de rolamento adequado, oferta de bicicletas nas entradas do campus e incremento do transporte coletivo interno.

Acrescente-se a isso o fato de que o Centro Esportivo Universitário (CEU) não consegue solucionar os problemas de sua piscina principal, que se arrastam há mais de sete anos, e ainda asfaltou o seu único campo de futebol e o transformou em estacionamento para receber as apresentações do Cirque du Soleil. Mais uma terrível metáfora dos vexaminosos 7x1 que sofremos no Mineirão, nosso ilustre vizinho, na Copa de 2014.

No campo do CEU, desenvolvia-se uma exitosa iniciativa de educação esportiva e saúde, o Programa Esporte para Saúde (Proesps), da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, que atendia às comunidades interna e externa e chegou a abrigar as atividades esportivas de times profissionais e de grupos de estudantes de outros países. Tudo isso no propalado país de futebol. Enquanto isso, os estudantes se apropriam dos gramados da Faculdade de Letras para praticar o seu rúgbi. Menos mal.

*Arquiteto e urbanista. Servidor técnico-administrativo em educação da UFMG. Presidente do Sindicato dos Arquitetos de Minas Gerais e estudante do mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável da Escola de Arquitetura

Eduardo Fajardo Soares*