Os desafios da nova gestão

Chamados à maioridade e à liberdade

Professores da UFMG retomam Kant, Hegel e Idealismo Alemão na busca de saídas dialéticas para os impasses da atualidade

Já pode ser encontrado na internet e nas lojas físicas o livro História, Estado e Idealismo Alemão, em que os professores José Luiz Borges Horta e Karine Salgado, da Faculdade de Direito, retomam o legado dessa corrente filosófica para buscar novas respostas para os desafios que surgem no presente político-jurídico brasileiro e mundial.

Na obra, a dupla procura refletir sobre a atualidade sob a perspectiva da tríade que nomeia o volume – seja à luz do postulado de Immanuel Kant (1724-1804), em que “o homem é convocado à maioridade”, seja à luz da obra de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), em que o homem “é chamado à consciência de sua liberdade”, como expõe Pedro Geraldo Novelli, professor de Filosofia da Unesp, no prefácio do volume.

Publicado pela Editora UFMG, o livro traz oito ensaios, organizados em três partes. Na primeira, foram reunidos dois artigos em que Karine Salgado mobiliza o postulado de Kant para tratar das ideias de justiça, república, liberdade e dignidade humana, que, para a especialista em doutrina do Estado, é “atributo mais essencial – na verdadeira acepção da palavra – do homem”, uma espécie de “pedra fundamental sobre a qual se erguem todos os direitos humanos”.

No prefácio da edição, Pedro Novelli antecipa questões que vão provocar as reflexões que a pesquisadora faz nessa primeira parte da obra – em particular, no que tange à composição do Estado. “A responsabilidade do Estado não é a responsabilidade de um grupo de eleitos nem de funcionários, mas, sim, e também, da totalidade dos cidadãos que o compõem”.

“O Estado não é a melhor organização política e, portanto, humana, nem, ao contrário, segundo todos os seus opositores, a pior instituição humana, mas certamente, a melhor possível”, afirma, lembrando o equívoco de se reduzir o entendimento do Estado “ao governo ou momento do Executivo”. “Nós, brasileiros, ainda não nos reconhecemos nas estruturas que nós mesmos nos damos”, escreve.

A segunda parte reúne três artigos de José Luiz Borges sobre as obras de Hegel. Nesses textos, o especialista em filosofia do Direito “questiona a legitimidade da pergunta que hoje em dia está sendo formulada, de várias maneiras, por vários ambientes acadêmicos, sobre as capacidades e possibilidades da filosofia hegeliana de compreender o mundo contemporâneo”, opina Giorgia Cecchinato, professora de Filosofia da UFMG.

Segundo Cecchinato, que escreve a apresentação do volume, os artigos de José Luiz Borges fazem pensar se, na verdade, não é o mundo contemporâneo – e, em particular, os ambientes científicos anglo-saxões – “que não tem capacidade e possibilidade de compreender Hegel”, na medida de sua propensão à dialética e à abordagem da totalidade. “De fato, a ambição hegeliana de compreender a totalidade não é uma tarefa simples para o pensamento, ainda mais para o pensamento contemporâneo, sempre mais especialístico e setorial, em que a circunscrição do que é estudado garante o nível de cientificidade”, completa Cecchinato.

Reprodução
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O Estado de Direito
Na terceira parte, os professores analisam os dualismos próprios da contemporaneidade, a gênese do Estado Democrático de Direito e a importância desse sistema institucional de proteção jurídica para o mundo político atual. “O Estado de Direito como produto da cultura humana, superação do Estado Liberal burguês, é a solução mais concreta à progressiva perda de importância e de confiança nas instituições do Estado, ao processo de despolitização típico da cultura globalizada, à falta de debate e de ideologias capazes de mover a mudança”, adianta Cecchinato.

Essa e outras reflexões sobre a consolidação do Estado de Direito soam particularmente oportunas no momento em que o país acompanha, entre perplexo e comovido, os desdobramentos do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco, em razão, provavelmente, de sua militância no campo dos direitos humanos. “Se, por um lado, é possível reconhecer traços bem marcados de uma tal estrutura econômico-social no mundo contemporâneo, por outro, o que é inaceitável é a possibilidade de ter alcançado um ponto final, pois a dialética é a verdadeira alma da cultura e esta não para no seu movimento e já tomou a estrutura do Estado de Direito como poder a serviço da liberdade”, enfatiza Cecchinato.

Livro: História, Estado e Idealismo Alemão
Autores: José Luiz Borges Horta e Karine Salgado
Editora UFMG
148 páginas / R$ 38

Ewerton Martins Ribeiro