Riqueza em risco

A rearticulação do DA Fafich

Em 27 de março de 2015, foi denunciado o tráfico de drogas na Fafich. O Diretório Acadêmico da Unidade entendia que o tráfico é uma realidade social que não se restringe à universidade e que o fechamento da sede não seria a solução. No entanto, em 30 de março, alguns veículos de comunicação anunciaram o fechamento do Diretório Acadêmico Idalísio Soares Aranha Filho, uma determinação da Congregação provocada pela crise instaurada. Foi um golpe amargo que abalou a legitimidade da instituição.

Na sombra do debate sobre tráfico de drogas e segurança na universidade, muitos atores acabaram empreendendo uma dolorosa campanha de deslegitimação da entidade estudantil. O potencial de mobilização foi escorrendo pelas mãos como areia. Aos poucos, a desarticulação ganhou espaço. Foi uma cruel realidade, sobretudo para o legado de defesa da democracia e da justiça social do DA. 

No dia 21 de setembro de 1979, Flamínio Fantini anunciou no Jornal República, seção de cultura, a vitória da chapa Todo mundo no DCE nas eleições do DCE da USP. Foi uma virada de 180º para o movimento estudantil. Era uma terça de outono, quando a junta eleitoral fechou uma discreta urna no segundo andar do prédio. No dia 30 de maio de 2017, foi eleita a chapa única Todo mundo no DA. Uma simples, mas importante mudança na dura condição de deslegitimação e desarticulação estudantil.

Naquele momento, havia uma esperança audaciosa em relação à rearticulação política do Diretório Acadêmico, combinada com um espírito de nostalgia que remeteu às décadas de enfrentamento, de liberdade e de abertura democrática. Um resgate das memórias, não para repeti-las, mas para se inspirar. Um cartoon foi desenhado durante a campanha: várias pessoas empenhadas em manter o grande letreiro: DA. 

Ainda são pulsantes e vivas as barbaridades da ditadura. No dia 1 de abril de 1964, os militares empreenderam um golpe e instauraram uma ditadura no Brasil. Durante 21 anos, os militares perseguiram entidades estudantis defensoras da liberdade, e uma delas foi o DA Fafich. Em 13 de dezembro de 1968, o dia amanheceu com a Faculdade Filosofia cercada pela polícia que ameaçava entrar para prender o presidente do DA, Waldo Silva. Aquele foi um célebre momento de resistência política da UFMG à ditadura. 

A memória de Idalísio Aranha é igualmente fundamental para a entidade. Idalísio nasceu em 1947, no interior de Minas. Relatos afirmam que era carinhoso, observador, cantador e tocador de violão. Quando secundarista, estudou no Estadual Central. Em 1968, ingressou no curso de Psicologia da UFMG e logo organizou a “luta dos excedentes” – estudantes aprovados que não foram convocados para ocupar suas vagas. Mais tarde, foi eleito presidente do DA da Fafich. Era casado com Walkíria Afonso Costa, estudante de Pedagogia. Ambos militavam no Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Em 1972, mudaram-se e ingressaram na Guerrilha do Araguaia. 

Em 1972, Idalísio e seu grupo combateram o exército. Idalísio perdeu-se do grupo. No dia 12 de julho, ele foi emboscado e morto, aos 25 anos de idade, segundo documentos oficiais publicados em 1992. Walkíria, militante e companheira de Idalísio, foi a última guerrilheira morta na região do Araguaia. Hoje o DA da Fafich carrega em seu nome uma homenagem a Idalísio, e o da Faculdade de Educação recebe o nome de Walkíria. 

É custoso montar um belo castelo de areia. É um trabalho delicado, de muita atenção, concentração e dedicação. Por algum motivo, o escândalo midiático das “drogas” no Diretório abalou toda sustentação histórica, política e articulada da entidade. Como a rápida mão intrusa, injusta e repleta de equívocos, a denúncia de 2015 provocou uma convulsão de fatos que desmancharam as bases do DA. A legitimidade em baixa e o sentimento de derrota para as ideias conservadoras atrapalharam as gestões seguintes ao escândalo. 

O Diretório Acadêmico da Fafich assume o desafio de construir uma fortaleza e não apenas um castelo de areia por meio da rearticulação com os centros acadêmicos, da ocupação da Arena da Fafich com política e cultura e da presença nos órgãos colegiados, como a Congregação. Enfim, é preciso revitalizar o movimento estudantil, reforçando nosso legado histórico de resistência, de defesa da justiça social e da liberdade para construir o novo. 

Já é possível falar que está em curso a rearticulação política do Diretório Acadêmico Idalísio Aranha. Estamos ocupando os espaços físicos, as instâncias colegiadas, as salas de aula e as ruas e tomando lado na história em defesa de um novo mundo. Somos e seremos maiores que as dificuldades. Com calor no peito, carregamos a esperança de que os frutos em breve serão colhidos na Fafich. 

Algumas conquistas já podem ser mencionadas: O DA ganhou nova sede e agora funciona no segundo andar, na sala 2072. Além disso, seus integrantes têm frequentado as reuniões da Congregação, se aproximado dos CAs e, em agosto, promoveram uma recepção de calouros, com atividades lúdicas e políticas. Não deixa de ser um bom começo de conversa. 


Gabriel Lopo, coordenador-geral do Diretório Acadêmico da Fafich e estudante da graduação em Relaçõe