Saúde

A pandemia e o futuro de um dos maiores programas de vacinação do mundo

A gestão do PNI em meio ao combate à covid-19 é tema do ‘Outra estação’, da Rádio UFMG Educativa

Vacinação contra a poliomielite é um dos símbolos do PNI
Vacinação contra a poliomielite é um dos símbolos do PNI Tomaz Silva | Agência Brasil

Vacinas contra o novo coronavírus foram desenvolvidas em tempo recorde pela ciência. Em ritmos distintos, a vacinação tem progredido em diversos países. No Brasil, desde o início o processo sofre com frequentes interrupções, causadas por distribuição descontínua dos imunizantes. Em meio a esses problemas, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) brasileiro, coordenado pelo governo federal, vem sendo tema frequente de debate entre especialistas da área da saúde e políticos. Criado em 1973, o PNI é um dos maiores programas de vacinação do mundo, responsável por definir e implementar um calendário anual composto de vacinas distribuídas gratuitamente, destinadas a pessoas de todas as faixas etárias.

O episódio 72 do Outra estação, programa da Rádio UFMG Educativa, mostra como o PNI tem sido impactado pelos desafios impostos pela vacinação contra a covid-19. A estrutura do PNI, cuja eficiência é internacionalmente reconhecida, vem sendo utilizada como deveria pelos governos? Disputas políticas relacionadas ao processo de imunização têm prejudicado a atuação desse programa nacional? Para responder a essas e outras perguntas, o Outra estação conversou com três especialistas: a epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o PNI de 2011 a 2019, o chefe do Serviço de Imunologia Clínica do Hospital das Clínicas da UFMG e professor da Faculdade de Medicina, Jorge Andrade Pinto, e o assessor técnico do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) Alessandro Chagas.


Disputas político-ideológicas

Jorge Pinto durante a coletiva na Faculdade de Medicina:
Jorge Pinto: mobilização em favor da vacinação foi prejudicada pela polarização políticaEstefânia Mesquita | Faculdade de Medicina

O primeiro bloco do episódio mostra que o PNI contribuiu para mudar radicalmente o cenário das doenças em circulação no Brasil. Algumas foram até erradicadas do território nacional, como a rubéola e a poliomielite. Porém, mesmo antes da pandemia de covid-19, um dado já vinha causando preocupação: nos últimos anos, caíram várias taxas de pessoas vacinadas em relação a cada grupo-alvo. Ao analisar essa queda, o médico e professor Jorge Andrade Pinto destaca o fortalecimento de grupos que se posicionam contra a vacinação, apesar das evidências favoráveis a essa prática sanitária.

Jorge Pinto e Carla Domingues ressaltam, também, a importância de as campanhas de vacinação serem acompanhadas por medidas de comunicação eficientes. Os dois especialistas criticam o modo como o Ministério da Saúde implementou ou deixou de implementar ações de comunicação destinadas a informar a população brasileira sobre a importância de se vacinar contra o novo coronavírus. Os pesquisadores avaliam que esse processo de vacinação tem sido prejudicado por disputas político-ideológicas, incentivadas pelo próprio Ministério. O assessor técnico do Conasems Alessandro Chagas também alerta para a tentativa de imposição de crenças ideológicas sobre os critérios técnicos no campo da saúde pública.

Falta de coordenação nacional

Alessandro Chagas defende autonomia dos municípios na gestão das doses
Alessandro Chagas defende autonomia dos municípios na gestão das doses Arquivo pessoal

O segundo bloco do episódio discute o papel do Ministério da Saúde na coordenação nacional da campanha de vacinação contra a covid-19. Alessandro Chagas defende que os municípios tenham autonomia na gestão das doses distribuídas pelo governo federal. No entanto, Carla Domingues e Jorge Andrade Pinto enfatizam que o Ministério deveria ter liderado o processo em todo o país. A ex-coordenadora do PNI considera que o governo federal poderia ter priorizado o envio de vacinas para regiões onde o índice de contágio era maior em determinado período.

O professor da Faculdade de Medicina da UFMG diz que a falta de uma coordenação nacional tem sido a principal falha no planejamento e na execução da vacinação contra o novo coronavírus. Na opinião do médico, a estrutura do PNI não vem sendo utilizada como deveria. Ele comenta, ainda, informações divulgadas pela CPI da Pandemia do Senado Federal. Segundo o especialista, a CPI apresentou “indícios muitíssimo graves” de que pessoas ligadas ao Ministério da Saúde buscaram usar o processo de vacinação para “fazer negócios com fornecedores paralelos”. Andrade destaca, ainda, que o PNI passa por um desmonte de seu corpo técnico.

Para saber mais

"A vacinação mudou o perfil de sobrevida do brasileiro", entrevista com Carla Domingues publicada no jornal Nexo

“46 anos do Programa Nacional de Imunizações: uma história repleta de conquistas e desafios a serem superados”, artigo acadêmico publicado nos Cadernos de Saúde Pública

Livro Vacinas e vacinação no Brasil: horizontes para os próximos 20 anos, publicado em 2020 e organizado por Akira Homma, Cristina Possas, José Carvalho de Noronha e Paulo Gadelha

Produção

O episódio 72 do programa Outra estação é apresentado por Alessandra Ribeiro e foi produzido por Alessandra Ribeiro, Arthur Bugre, Igor Costa e Tiago de Holanda. Os trabalhos técnicos são de Breno Rodrigues. A coordenação de jornalismo da Rádio UFMG Educativa é de Paula Alkmim. 

Na segunda temporada, a atração vai ao ar às quintas, quinzenalmente, às 18h, com reprise às sextas, às 7h, pela frequência 104,5 FM. Em cada episódio, o programa aborda um tema de interesse social. Todos os episódios estão disponíveis nos aplicativos de podcast, como o Spotify.