Arte e Cultura

Centro de Memória da Fale recebe mostra sobre povoamentos negros livres de Minas Gerais

Em 13 pranchas, são apresentados conteúdos sobre sete quilombos do século 18 e 11 agrupamentos que preservam a língua, a cultura e os saberes banto oriundos da África

Desenhos aquarelados de ex-aluno da Escola de Belas Artes integram exposição
Desenhos aquarelados de ex-aluno da Escola de Belas Artes integram exposição Desenho: Murilo Pagani

Está aberta ao público, no Centro de Memória da Faculdade de Letras (Fale), no campus Pampulha, a mostra Cumbara, que conta a história dos povoamentos de negros livres formados nos sertões de Minas Gerais no século 18. A entrada é franca. A exposição fica em cartaz até 25 de junho e pode ser visitada gratuitamente de segunda a sexta, das 15h às 19h.

Cumbara – palavra que significa “cidade” em dialeto banto – oferece aos visitantes essa viagem pelos povoamentos de negros livres do século 18 “e pelos agrupamentos que ainda hoje guardam a memória dos saberes e das lutas dos homens e das mulheres trazidos da África durante o regime escravocrata e de seus descendentes brasileiros”, conforme se explica no material de divulgação da mostra.

Na exposição, são apresentados conteúdos sobre sete quilombos do século 18 e sobre 11 agrupamentos que, situados em Minas Gerais, ainda hoje preservam a língua, a cultura e os saberes banto trazidos da África para o Brasil. A mostra é composta de textos e imagens, apresentados em 13 pranchas de material sintético, impressas em meio digital.

A mostra foi idealizada pela poeta e editora Sônia Queiroz, professora aposentada da Faculdade de Letras (Fale), que hoje atua como docente voluntária na instituição. A curadoria é do escultor Fabrício Fernandino, professor da Escola de Belas Artes (EBA) e diretor do Centro Cultural UFMG. O projeto gráfico e a diagramação das peças apresentadas na mostra são de Pedro Peixoto.

Passado presente
As imagens dos quilombos são reproduções digitais de aquarelas que integram o manuscrito anônimo A expedição do Campo Grande, Cayeté, Abayeté e de Paracatu, que trata de expedição realizada em 1769 em Minas Gerais. As imagens dos agrupamentos, por sua vez, são reproduções digitais de desenhos aquarelados do artista visual Murilo Pagani, egresso da Escola de Belas Artes (EBA).

“Nessas imagens, são evidenciadas manifestações culturais de origem banto preservadas em território mineiro: a língua de negro, ou Língua do Negro da Costa; os vissungos, cantos de enterro e de trabalho; o candombe e o Reinado de Nossa Senhora do Rosário”, informa o material de divulgação. Além das imagens, a mostra traz um mapa com a localização desses agrupamentos recentes, produzido por Rômulo Vianna.

'Língua do Negro da Costa'
Produzidos por Sônia Queiroz, os textos que integram a exposição foram escritos na “Língua do Negro da Costa”, variante regional do português ainda hoje falada em subúrbios de Bom Despacho, em Minas Gerais – particularmente, na região do bairro Tabatinga, conforme Sônia mapeou em suas pesquisas. Tem origem nesse dialeto a palavra que dá nome à exposição.

Sônia Queiroz, professora aposentada da Fale
Sônia Queiroz é especialista das línguas e culturas banto em Minas GeraisFoto: Arquivo pessoal

Investigadora da presença das línguas e culturas banto em Minas Gerais, Sônia Queiroz é autora dos livros Pé preto no barro branco: a língua dos negros da Tabatinga (Editora UFMG, 1998) e Palavra banto em Minas (Editora UFMG, 2019), que tratam do tema. Ambos podem ser baixados gratuitamente no site da Editora. Na mostra, uma das pranchas apresenta a tradução para o português brasileiro do vocabulário banto utilizado por Sônia em seus textos.

Em Pé preto no barro branco, Sônia relata uma curiosidade: a de que o aprendizado da “Língua do Negro da Costa” em Tabatinga não se dá na escola nem na família, mas sobretudo entre amigos, nos contextos de lazer, e especialmente no período da vida que vai dos 11 aos 20 anos. O recorte coincide com a época em que os indivíduos, já dominando a língua materna, começam a intensificar suas relações fora do lar, como em bares e em festas.

Em razão desse contexto, a língua acaba sendo utilizada também sobretudo nas situações de lazer. “As diversões dos falantes da Língua do Negro da Costa concentram-se nos bares, onde eles conversam na língua, tomam matuaba ‘cachaça’ ou grozope ‘cerveja’ e fumam um marcanjo ‘cigarro’. Mas há também a possibilidade de rastá o longado, ‘dançar’ ao som de um imbanjeco, que pode ser ‘qualquer instrumento musical’”, exemplifica a autora.

Mostra: Cumbara
Local: Centro de Memória da Faculdade de Letras (Fale), no campus Pampulha
Endereço: Avenida Presidente Antônio Carlos, 6627 – Pampulha, Belo Horizonte
Data e horário: de 26/05 a 25/06; de segunda a sexta, das 15h às 19h
Entrada franca

Ewerton Martins Ribeiro