Lazer e esporte

'A taça do mundo é nossa': Copa é tema de pesquisas desenvolvidas na UFMG

Maior competição do futebol, que começa neste domingo, 20, inspira estudos em diversos campos do conhecimento

Nos campos de futebol do Catar, seleções de 32 países começam a disputar, neste domingo, dia 20, o título de campeão da Copa do Mundo de futebol masculino em 2022. Nos campos do conhecimento científico, pesquisadores e pesquisadoras investigam os fenômenos relacionados à disputa tanto em relação aos aspectos técnicos que se configuram nas chamadas quatro linhas quanto ao impacto afetivo e social da competição na vida das pessoas, sob os mais diversos olhares. 

De acordo com o professor Gibson Moreira, do Departamento de Esportes da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG (EEFFTO), “a Copa do Mundo é um dos maiores eventos esportivos do mundo e é importante porque congrega países de todos os continentes em torno do futebol. Do ponto de vista científico, é um evento único, porque possibilita estudos sobre as mais variadas realidades, da perspectiva esportiva e, também, de outras ciências”. 

A grandiosidade da World Cup Qatar 2022, destacada por Moreira, pode ser percebida em alguns números oficiais do evento: 832 jogadores convocados, 64 jogos a serem disputados em 29 dias, três milhões de ingressos disponíveis e distribuição de mais de 2 bilhões de dólares em prêmios. 

A variedade de possibilidades de estudos científicos é evidenciada por algumas das principais pesquisas desenvolvidas na UFMG sobre a Copa. Nesta reportagem especial da TV UFMG, cinco grupos dos campos da Educação Física, Psicologia, Matemática, Comunicação Social e do Direito compartilharam perspectivas de investigação, também com ênfase crítica às denúncias de desrespeito aos direitos humanos no Catar, país que sedia a disputa.

Escalação
Representando diversos estudos conduzidos na UFMG sobre futebol e sobre a Copa do mundo, cinco integrantes de grupos de pesquisa foram convocados para compartilhar reflexões sobre a Copa. Em uma escalação simbólica, entraram em campo nesta reportagem: Gibson Moreira, do Departamento de Esportes e integrante do UFMG Soccer Science Center (perspectiva esportiva), a doutoranda em Psicologia da UFMG Bárbara Mendes, participante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT – UFMG (psicologia), o professor Andityas Matos, da Faculdade de Direito e coordenador do grupo O Estado de Exceção no Brasil Contemporâneo (normas e filosofia), a professora Ana Carolina Vimieiro, do Departamento de Comunicação Social e coordenadora do Coletivo Marta (presença das mulheres na cobertura jornalística) e o professor Gilcione Nonato Costa, do Departamento de Matemática e coordenador do grupo Probabilidades no Futebol (ciências exatas). 

Jogadas e táticas
Criado em 2014, o grupo de pesquisa UFMG Soccer Science Center, da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, investiga o futebol de maneira holística, apesar do foco nos aspectos físicos e esportivos. Neste ano, o professor e integrante do grupo Gibson Moreira lidera um estudo sobre as jogadas, os erros e acertos dos jogadores que disputaram copas passadas. “De forma geral, a educação física estuda a Copa para avaliar treinamento tático, análise de desempenho, prevenção de lesões e treinamento físico”, explica Moreira.

Torcida e violências
Institucionalizado em 2007, o Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da UFMG se detém sobre questões relacionadas às identidades de gênero e orientações sexuais. Integrante do grupo, a doutoranda em Psicologia Bárbara Menezes estuda as torcidas e as violências imbricadas no contexto do futebol, entendido, por ela, como um espaço fortemente racista, machista e LGBT+fóbico, o que não difere da realidade da sociedade. Em abordagem mais ampla, Bárbara avalia que a Psicologia pode estudar o futebol e a Copa do mundo “focando em diferentes prismas, como a interação entre os jogadores e  a comissão técnica, o modo como o ato de torcer impacta o ambiente social, os efeitos sociais, políticos e afetivos que a realização do evento pode produzir em uma sociedade”.

Abuso, corrupção e 'maquiagem social'
Para o coordenador do grupo de pesquisa O Estado de Exceção no Brasil Contemporâneo, da Faculdade de Direito da UFMG, Andityas Matos, é preciso avaliar a Copa do Mundo de maneira crítica, uma vez que o clima de festa dominante tende a mascarar os problemas. O pesquisador avalia as intervenções realizadas pela Federação Internacional de Futebol (Fifa) como abusivas e corruptivas, em especial devido à exploração dos países que sediam o evento e à “maquiagem social” promovida nas cidades em que se encontram os estádios – quando, por exemplo, pessoas em situação de rua são recolhidas e levadas para lugares distantes do evento. O FifaGate, operação iniciada em 2015, é um dos mais emblemáticos casos de corrupção no futebol.

Além do viés da filosofia do direito, ao qual se filia o grupo coordenado por Matos, o campo do Direito realiza estudos sob outras perspectivas, explica o professor: “Uma dimensão clássica é o direito desportivo, que pensa nas normas que regulam as relações no futebol. Há também a perspectiva do direito internacional, que avalia a ida de pessoas do mundo todo a um local com leis próprias e normatividades”. 

Mulheres em campo
Tradicionalmente, a área da Comunicação Social estudava a Copa do Mundo e, em especial, o futebol brasileiro como traço definidor da identidade nacional, mas, nos últimos anos, outras formas de estudar os dois fenômenos têm ganhado força. É o que explica Ana Vimieiro, coordenadora do Coletivo Marta da UFMG, criado em 2018. “Há certa mudança de foco, e os olhares começam a  ser direcionados a coisas mais cotidianas, como os campeonatos nacionais, as relações com os clubes, as identidades locais e os times. São mudanças de perspectivas sob a quais se investiga, inclusive, a Copa do Mundo Feminina [que será realizada em 2023, na Nova Zelândia e Austrália].”

Neste ano, os estudos liderados por Ana Vimieiro têm foco nas mulheres brasileiras participantes das coberturas midiáticas da Copa do Mundo de futebol masculino. Um questionário será aplicado e respondido por algumas das principais profissionais atuantes na cobertura da edição de 2022. O objetivo é avaliar como se dá a participação delas e os dilemas que vivenciam.

A bola e suas probabilidades
Iniciado em 2005, o grupo de pesquisa Probabilidades no Futebol, coordenado pelo professor Gilcione Nonato Costa, estuda, de acordo com ranqueamentos das classificações de times e seleções, os enfrentamentos e vitórias mais prováveis entre as equipes que disputam determinado título. Neste ano, as atenções estão voltadas para a Copa do Mundo. De acordo com Costa, com base nos dados disponíveis, que medem o poderio de cada equipe, as seleções da França e do Brasil são as mais cotadas para vencer a disputa.

Além dos estudos como os realizados pelo grupo Probabilidades, a matemática, de forma mais ampla, se apropria cientificamente da Copa fazendo projeções, estabelecendo as possibilidades de confrontos e de um time chegar a uma fase seguinte. "Tudo isso é feito com base na avaliação da força de um time, com base nas vitórias que ele alcançou", explica Gilcione Costa.

'Mito salvacionista'
“O Catar é uma monarquia absoluta, na forma de emirado, dominado por uma única família e despreocupado com direitos humanos, democracia e grupos socialmente excluídos”, afirma Andityas Matos. Nas redes sociais, diversas denúncias contra os desrespeitos aos direitos humanos, em especial, à comunidade LGBT+, têm sido compartilhadas. 

Apesar da necessidade de atenção a tais pontos, a doutoranda em Psicologia na UFMG Bárbara Menezes alerta para o que chama de certo “mito salvacionista”, traduzido no fato de que culturas ocidentais se sentem superiores às orientais, como a do Catar. “Temos que pensar nas razões que levam ao questionamento de alguns países e não de outros. O contexto brasileiro também é marcado por profundo desrespeito aos direitos humanos", contrapõe a pesquisadora.

Para o educador físico e pesquisador da EEFFTO Gibson Moreira, a ciência e a sociedade em geral têm, por meio de um evento de grande magnitude, como a Copa do Mundo, a oportunidade de refletir sobre os diversos problemas culturais e sociais que atravessam a disputa.

Outros times
As cinco perspectivas apresentadas nesta reportagem não esgotam as possibilidades de investigação científica da Copa do Mundo, tampouco representam todos os estudos sobre o tema conduzidos na UFMG. É possível conhecer outras frentes de pesquisa por meio da plataforma Somos UFMG e do Banco de Teses e Dissertações.

Equipe: Pedro Campos (motorista), Laura Bragança (apuração e produção de externa), Olívia Resende (produção de externa), Pablo Paixão (produção de externa),  Ângelo Araújo (imagens), Samuel do Vale (imagens), Marcelo Duarte (edição de imagens) e Ruleandson do Carmo (produção, reportagem e edição de conteúdo)

Apoio: Thiago Nogueira (assessoria de imprensa do Mineirão), Iago Proença, Fabiano Guieiro, Melissa Souza (equipe da assessoria de imprensa da EEFFTO) e Marcelo Lima (diretoria de esporte e lazer da Assufemg, que deu apoio operacional)

Ruleandson do Carmo