Senador e pesquisadores criticam "desmonte da área ambiental”
Nova rodada do ciclo de conferências dos 20 anos do IEAT discutiu a política do governo federal e as mudanças climáticas
O auditório da Reitoria recebe nesta segunda-feira, dia 18, uma nova edição do Ciclo IEAT 20 anos, desta vez com o tema Impactos presentes e futuros das mudanças climáticas no Brasil. Na mesa de abertura do evento, realizada pela manhã, o senador Fabiano Contarato, presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal, criticou “o verdadeiro desmonte da área ambiental” que, em sua percepção, tem sido promovido pelo governo federal.
“O presidente queria acabar com o Ministério do Meio Ambiente e, se não conseguiu de direito, está fazendo de fato. Ele acabou com a secretaria de mudanças climáticas, acabou com o departamento de educação ambiental, acabou com o plano de combate ao desmatamento. Ele reduziu a participação da sociedade civil, ele criminaliza ONGs”, enumerou o senador, para quem a direção da pasta de Meio Ambiente foi entregue a um antiambientalista. Em seguida, Contarato listou as várias políticas antiambientalistas que vêm sendo implementadas pelo governo, como a permissão do uso de novos agrotóxicos pela agricultura brasileira.
Aproveitando a presença do senador na mesa de abertura do evento, a reitora Sandra Regina Goulart Almeida agradeceu o trabalho dos parlamentares brasileiros em defesa das universidades. Ela lembrou o corte que o governo federal realizou, em maio, de 30% do orçamento das universidades federais e, tomando o senador como representante dos parlamentares que trabalharam para a reversão desse corte, agradeceu a todos eles. “Foi o esforço dos parlamentares que nos possibilitou ter agora, em outubro, a liberação dessa parte do nosso orçamento. Sem o apoio deles, não teríamos conseguido esse desbloqueio”, afirmou a reitora.
Sandra disse que a universidade brasileira não é o problema do país, mas a sua solução. “Não se constrói um país sem investimento contínuo e sustentável em educação, ciência e tecnologia. Se hoje as nossas universidades se destacam nos rankings internacionais, como ocorre com a UFMG, é porque ao longo desses anos houve forte investimento na universidade pública”, lembrou a reitora, que demarcou, entre outras coisas, a posição da universidade contra a fusão de CNPq e Capes.
Discussão irracional
“Infelizmente, esse desmonte que temos vivido não é só na área ambiental: é na área da educação, é no Ministério da Saúde, é na proposta armamentista: nós estamos presenciando violações dos direitos humanos que me fazem ser radical e pensar que talvez estejamos vivendo uma ditadura em plena democracia”, disse o senador, eleito pela Rede Sustentabilidade.
Completaram a mesa de abertura do evento Estevam Las Casas, diretor do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (IEAT), e Raoni Guerra Lucas Rajão, professor do Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia, que integra a organização do evento.
Las Casas lembrou a disputa ideológica que caracteriza o desmonte das políticas públicas no país. Para combatê-lo, defendeu que a universidade se abra para a sociedade para trazer discussões sobre os temas que sejam relevantes. "É isso que estamos tentando fazer nessa comemoração dos 20 anos do IEAT”, disse Las Casas. Antes do ciclo sobre meio ambiente, o IEAT realizou, na comemoração de seus 20 anos, discussões sobre a ascensão das fake news e a guinada direitista vivida no Brasil e no mundo.
Em sua fala, Raoni Rajão lembrou que “estamos vendo uma discussão pública cada vez mais polarizada, irracional, cada vez mais voltada para as fake news, para os extremos, o que nos impede de manter um debate racional sobre o tema do meio ambiente". O professor acrescentou que a conta das mudanças climáticas está chegando mais rapidamente do que se imaginava. “Quando se fala em mudança climática, a gente pensa em algo distante, algo que está ligado ao global. Porém, cada vez mais estamos falando de uma realidade muito perto de nós e que tem impacto direto em nossas vidas”, disse.
Amazônia, ar-condicionado do mundo
Marcia Nunes Macedo, pós-doutoranda no Centro de Sensoriamento Remoto (CSR) da UFMG e pesquisadora do Woods Hole Research Center (EUA) – organização não governamental de pesquisa acadêmica –, ministrou a primeira conferência do dia, Impacto das mudanças climáticas regionais e globais no Brasil, em que mostrou as consequências do desmatamento para a estabilidade climática no Brasil. A pesquisadora fez uma apresentação com foco na Amazônia, bioma que chamou de “ar-condicionado natural do mundo”.
Segundo Marcia Macedo, cujos estudos exploram as mudanças no uso da terra e a integridade de ecossistemas aquáticos na fronteira agrícola da região amazônica, a Amazônia pode exercer papel relevante no adiamento da mudança climática. “Ela é um tesouro para o mundo, que abrange metade das florestas tropicais remanescentes do planeta. E a biodiversidade desse bioma é fantástica. Uma informação para ilustrar: uma árvore da Amazônia pode ter tantas espécies de insetos quanto toda a Inglaterra”, disse.
A pesquisadora detalhou a importância da floresta para a devolução de água para a atmosfera, colaborando para o resfriamento do mundo. “A Amazônia é crucial e vital para a estabilidade climática não só do Brasil, mas de todo o mundo. No seu processo de bombear água para a atmosfera, a Amazônia resfria a Terra em até 5ºC. Esse é um serviço ecossistêmico fantástico para um planeta que está aquecendo”, disse ela, lembrando que a manutenção da Amazônia preservada “compra tempo” para que se encontrem soluções para o aquecimento global.
Nesta tarde, ainda ocorrem, no auditório da Reitoria, os painéis Desafios para alcançar as metas climáticas do Brasil, com os professores Britaldo Soares Filho, da UFMG, Clarissa Costalonga e Gandour, da PUC-Rio, e Marcos Heil Costa, da UFV, e Polarização da agenda florestal e climática no Brasil, com os professores Tiago Ribeiro, da UnB, e Raoni Rajão.
Às 17h, na palestra de encerramento (em videoconferência), a professora Naomi Oreskes, da Universidade Harvard, fala sobre como o ceticismo climático nos Estados Unidos tem sido mobilizado para atender interesses econômicos.