Em sua estreia na poesia, Jacyntho Lins Brandão investiga o ‘nada’
Um dos mais destacados helenistas do país, professor da Fale faz uma 'contabilidade de perdas, vazios e ausências'
Perto de completar 70 anos, Jacyntho Lins Brandão, professor emérito da Faculdade de Letras da UFMG e um dos mais destacados especialistas em antiguidade grega do Brasil, acaba de lançar seu primeiro livro de poesias, Mais (um) nada, pela editora Quixote+Do, de Belo Horizonte.
O livro traz 32 poemas em que o poeta, alternando-se entre o erudito e o zombeteiro, o desbocado e o sentimental, evoca a própria biografia – assim como saberes referentes aos campos de conhecimento em que é versado, como a filosofia, o teatro, a noção de cidade e a própria literatura – para estabelecer uma obra de forte caráter metapoético, atravessada pela noção de “nada” e as suas implicações.
Para a poeta Ana Martins Marques, que assina a orelha do volume, trata-se de um livro que parece ter a dicotomia “ganhar (perder)” como a sua força-mestra, por meio da qual Jacyntho termina fazendo uma espécie de “contabilidade de perdas, vazios e ausências” para os quais a literatura, em si mesma, não parece oferecer salvação. (“Se algo ajuda não é literatura”, registra o professor em um verso.)
Ela prossegue: “O cômico, o ceticismo, a ironia, os jogos de palavras, mas também a disciplina e o rigor das formas, são aqui as armas com que o poeta se bate contra a falta de sentido, o vazio, o absurdo, ‘a imensidão do nada’, o luto, a perda. A métrica, e também a rima, criam alguma ordem, ausente no mundo, que é sem rima e sem razão”.
'Só vencidos'
Com a noção de 'nada' como eixo, a obra de Jacyntho termina por trazer a morte como a sua imagem mais recorrente: “A correnteza contra a qual se nada / Não deixa vencedores: só vencidos”. Contudo, diante da “indesejada das gentes”, será a experiência da vida, no tempo presente, e não da morte, no tempo inominado, o que será cantado pelo poeta como a sina à qual todos devem se resignar, como descrito no desfecho do penúltimo poema do livro: “O que tens de saber que te anuncio / É coisa só: tua simples condição / De perecível: mais além não mires / Porque no fim partir é o que te é dado / Viver o teu instante é o teu fado”. O último, Soneto part’ido, é dedicado ao filho Pedro, falecido há dois anos.
Sobre o autor
Professor emérito da UFMG, Jacyntho Lins Brandão leciona língua e literatura grega na Faculdade de Letras desde 1977, da qual foi diretor nas gestões 1990-1994 e 2006-2010. Foi vice-reitor da Universidade na gestão 1994-1998. É membro da Academia Mineira de Letras desde 2018.
Com Mais (um) nada, Jacyntho mantém o ritmo de publicação de uma obra literária a cada década, em paralelo à sua vasta produção teórica e de tradução – da qual o lançamento mais recente é O romance de Tristão, de Béroul, que chegou às livrarias também neste ano.
Em 1982, Jacyntho publicou Relicário (José Olympio), romance que reflete algo do caráter tradicionalista da mentalidade mineira. Em 1997, lançou O fosso de Babel (Nova Fronteira), no qual estabelece um bem-humorado jogo com as noções de escritor, autor, narrador e personagem, desdobrando-as em relações de duplicidade e espelhamento. Em 2007, Jacyntho publicou Que venha a Senhora Dona (Tessitura), uma peça de teatro.
Mais (um) nada pode ser adquirido na Livraria Quixote, em Belo Horizonte (Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi), ou pelo serviço de entregas que a livraria inaugurou durante a pandemia, pelo telefone (31) 98676-1007 ou em seu perfil no Instagram.
Livro: Mais (um) nada
Editora: Quixote+Do
Autor: Jacyntho Lins Brandão
88 páginas / R$ 40