Pesquisa e Inovação

Grupo da Medicina propõe ferramenta para diagnóstico precoce de transtornos alimentares

Considerada de fácil aplicação, a Scoff-BR pode identificar risco de anorexia ou bulimia

Bulimia, que leva a pessoa a comer compulsivamente, é um dos transtornos identificados pela ferramenta
Bulimia, que leva a pessoa a ingerir grandes quantidades de alimentos em um curto espaço de tempo, é um dos transtornos identificados pela ferramenta Torsten Mangner | Wikimedia Commons | CCBY-SA 2.0

Uma nova ferramenta para o diagnóstico precoce de anorexia, bulimia e o transtorno do comer compulsivo foi desenvolvida pela equipe do Núcleo de Pesquisa em Vulnerabilidade e Saúde (Naves) da Faculdade de Medicina. Chamada de Scoff-BR, trata-se de um questionário curto, com cinco perguntas rápidas (leia ao fim da matéria)

De acordo com o professor Frederico Garcia, do Departamento de Saúde Mental e coordenador da pesquisa e do Naves, as escalas já traduzidas e adaptadas no Brasil para o mesmo fim são quase sempre longas, demandam muito tempo para serem preenchidas e avaliadas e não estão disponíveis gratuitamente. “A Scoff-BR resolve essas limitações e alerta o profissional de saúde na avaliação do paciente, mostrando o risco para algum transtorno alimentar. Assim, o profissional pode aprofundar a busca por informações sobre o comportamento alimentar da pessoa, o que gera economia de tempo e maior eficiência na avaliação”, comenta.

Além das respostas do paciente, o profissional de saúde deve levar em conta outros fatores como as alterações do comportamento alimentar, a curva de peso da pessoa ao longo da vida e sua maneira de enxergar o próprio corpo, por exemplo. “Por isso, é importante que pessoas leigas não considerem o autodiagnóstico”, alerta.

Os resultados da pesquisa desenvolvida no âmbito do Naves serão publicados no Brazilian Journal of Psychiatry, um dos mais relevantes do continente.

Anorexia e bulimia
O professor explica que os transtornos alimentares são doenças psiquiátricas que acometem, principalmente, adolescentes e adultos jovens. “Elas causam alterações importantes no comportamento alimentar e na percepção da pessoa quanto ao seu próprio corpo, podendo ocorrer crises em que os indivíduos induzem vômito após se alimentarem”, acrescenta Garcia.

Pessoas anoréxicas, de acordo com o docente, percebem-se sempre gordas e com feições desagradáveis, fenômeno conhecido como dismorfofobia. A patologia acomete 1% das mulheres no mundo, mas pode ocorrer também em homens. Tem um curso agudo ou crônico e é um dos transtornos mais mortais das doenças psiquiátricas.

A bulimia, segundo o professor, é caracterizada por crises em que o paciente ingere grandes quantidades de alimentos em curto espaço de tempo, seguidas por uma sensação de culpa. “A bulimia é caracterizada pelo recurso a um comportamento compensatório, que pode ser o vômito, o uso de medicamentos para emagrecer, o excesso de esporte ou outros meios”, descreve.

A pessoa com bulimia tende a ter dificuldades para gerir sua ansiedade, e as crises acabam se tornando uma rotina para aliviar ou diminui-la. São pacientes que sofrem muito com a culpa e o medo de engordar. A evolução tende a ser crônica, com complicações como a hiponatremia, diminuição da quantidade de potássio no sangue, que pode provocar arritmias cardíacas, lesões no esôfago, nos dentes e na mucosa da boca, devido à passagem do ácido do estômago provocada pelos vômitos compensatórios.

Transtornos e pandemia
Frederico Garcia enfatiza que os transtornos alimentares podem ter sua prevalência aumentada durante momentos de crises, como a atual pandemia do novo coronavírus.

“Os transtornos alimentares são, para muitos pacientes, uma válvula de controle da ansiedade. Como na guerra do Líbano de 2006 [usada como contexto em trabalho anterior do seu grupo de pesquisa], as incertezas impostas pela pandemia são fatores produtores de ansiedade, e, por isso, estimamos um aumento dos transtornos alimentares”, anuncia.

O professor recomenda a gestão da ansiedade por outros meios como a meditação, a psicoterapia e atividades físicas aeróbicas moderadas. “É importante que a pessoa procure ajuda de um psiquiatra para avaliar se a mudança de comportamento alimentar pode ser um transtorno. Quanto mais precoce a abordagem, maiores as chances de melhora”, conclui.

A Scoff-BR é a continuidade do processo de validação do questionário inglês Scoff, que o professor Frederico Garcia elaborou durante seu doutorado na França, e é tema do projeto de pesquisa de mestrado de Ananda Teixeira no Programa de Pós-graduação em Medicina Molecular da Faculdade de Medicina. Além deles, participa do estudo a professora Maila Castro, também do Departamento de Saúde Mental e líder do Naves.

A Scoff-BR estará entre as ferramentas disponibilizadas no site do Centro de Referência em Drogas da UFMG, coordenado pelo professor Frederico Garcia. Assim que for publicado, o artigo de validação da Scoff-BR também estará disponível no site do Brazilian Journal of Psychiatry.

Questionário

Você provoca vômito quando se sente desconfortavelmente cheio?

Você se preocupa de ter perdido o controle de quanto come?

Você perdeu recentemente mais de cinco quilos em um período de três meses?

Você acredita estar gordo(a) apesar das outras pessoas dizerem que você está muito magro(a)?

Você diria que a comida domina a sua vida?

Centro de Comunicação da Faculdade de Medicina da UFMG