Pesquisa e Inovação

Historiografia das confrarias mineiras reunirá pesquisadores em Mariana

Os esponsais da Virgem, pintura de Manoel Ribeiro Rosa, oriunda da capela de São José dos Homens Pardos de Ouro Preto, atualmente no Museu Arquidiocesano de Mariana
Os esponsais da Virgem, pintura de Manoel Ribeiro Rosa, oriunda da capela de São José dos Homens Pardos de Ouro Preto, atualmente no Museu Arquidiocesano de Mariana Acervo Adalgisa Arantes Campos

Pesquisas recentes sobre as irmandades leigas e a sua influência social nas Minas Gerais dos séculos 18 e 19 serão apresentadas no workshop Estudos confrariais na historiografia mineira, programado para o próximo sábado, 23, em Mariana. O evento é organizado por professores e estudantes do Departamento de História da Fafich e da Faculdade Arquidiocesana de Mariana (FAM).

Coordenado pela professora Adalgisa Arantes Campos, da Fafich, o workshop reunirá pesquisadores que analisam o universo dessas agremiações e sua atuação no período colonial. O intelectual Fritz Teixeira de Salles (1915-1981), que publicou, em 1963, o pioneiro estudo Associações religiosas no ciclo do ouro, será homenageado durante o evento. Segundo a professora Adalgisa, a obra interpretou, pela primeira vez, as irmandades sob a perspectiva sociológica, com suas “heranças singulares na atmosfera humana ou no estilo de viver de quase todas as pequenas cidades de Minas”.

No artigo O mecenato dos leigos: cultura artística e religiosa, publicado em 2011 como parte do livro Arte sacra no Brasil colonial (C/Arte), Adalgisa Arantes explica que as confrarias se dividiam em dois ramos: as ordens terceiras e as irmandades.

As ordens terceiras eram compostas de leigos que desejavam seguir a regra franciscana ou carmelita sem fazer os votos de castidade, pobreza e clausura. As irmandades, que também reuniam leigos, não tinham vínculo com as ordens conventuais. Elas mantinham um estilo devocional (ligado às raízes populares da religiosidade medieval) e dedicavam-se ao culto dos santos, dos anjos, das almas do purgatório, de Nossa Senhora e da Santíssima Trindade.

Direitos e deveres

De acordo com o artigo, as confrarias garantiam assistência espiritual e material aos seus filiados: “Em geral, elas responsabilizavam-se pela prestação dos seguintes serviços piedosos: socorro em caso de doença, viuvez ou desgraça pessoal; preparação e execução de cortejos fúnebres e enterros solenes; celebração de missas em sufrágio da alma e concessão de sepultura em solo sagrado o que era feito com beneplácito da paróquia”.

Em contrapartida, descreve Adalgisa no texto, “os irmãos agremiados deveriam cumprir uma série de deveres, a saber: pagar a taxa de matricula estipulada pela confraria, quitar as anuidades estabelecidas em compromisso, acompanhar os funerais dos irmãos falecidos e rezar por suas almas, participar das festas e celebrações realizadas em louvor do padroeiro da associação religiosa”.

Imagem do Livro da Irmandade do Rosário dos Pretos da Freguesia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto
Imagem do Livro da Irmandade do Rosário dos Pretos da Freguesia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto Acervo Adalgisa Arantes Campos

Bem articuladas socialmente, as ordens terceiras e irmandades se relacionavam com o poder régio, com as autoridades militares, com os civis e com os demais setores religiosos organizados. “As espiritualidades do clero diocesano, das ordens conventuais, dos missionários e dos fiéis não constituíam mundos estanques ou incomunicáveis", afirma Adalgisa, lembrando ainda que algumas associações de leigos conseguiram angariar recursos para edificar templos próprios, como as irmandades do Rosário dos Pretos – formadas por escravos – e aquelas compostas, em sua maioria, por crioulos.

Na academia
Além do livro escrito por Fritz Teixeira de Salles, outro clássico da historiografia das confrarias é a obra Os leigos e o poder, do mineiro Caio Boschi, lançado em 1986, que influenciou gerações posteriores de especialistas no tema. “Eles estudou as práticas religiosas dos leigos, as associações leigas, os sodalícios”, diz Adalgisa, lembrando que a pesquisa de Boschi, professor aposentado da UFMG e em exercício na PUC Minas, abriu caminho para que o tema começasse a ser investigado numa perspectiva acadêmica. Décadas antes (40 e 50), técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), como Raimundo Trindade e João Furtado de Menezes, também se debruçaram sobre o assunto.

“Atualmente, há uma nova onda de estudos sobre as confrarias”, afirma a professora Adalgisa. Parte deles será apresentada no seminário de sábado, na Igreja São Pedro dos Clérigos, em Mariana. A programação será aberta às 13h20, com a conferência Fritz Teixeira de Sales e a história social das irmandades de Minas Gerais, a cargo do professor Francisco Eduardo de Andrade, da Universidade Federal de Ouro Preto.

Na sequência, serão abordados temas como o calendário festivo dos terceiros carmelitas em Minas Gerais nos séculos 18 e 19, a consolidação da ordem terceira dos franciscanos em Mariana, as ramificações da ordem terceira do Carmo de Vila Rica em Minas Gerais, o perfil social dos pardos do Cordão nas Minas Setecentistas e as irmandades de sedes paroquiais, com ênfase no caso Igreja Matriz de Bom Sucesso, em Caeté, no século 18. No encerramento, o professor Renato Franco, da Universidade Federal Fluminense, vai traçar um panorama da história e historiografia das irmandades da Misericórdia na América Portuguesa.

Programação do Workshop
Programação do Workshop Jornalismo

As inscrições, gratuitas e abertas a qualquer interessado, podem ser feitas pelo e-mail famufmg@gmail.com.