Semana do Conhecimento

Líder tupinambá relata luta de seu povo pela educação

Cacique Babau participou, na manhã de hoje, da mesa de abertura da Semana do Conhecimento com etnólogos da UnB e da UFSB

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Cacique Babau: esperança e confiançaFoto: Foca Lisboa / UFMG

Na cerimônia que abriu oficialmente a 27ª Semana do Conhecimento da UFMG, realizada na manhã de hoje, dia 15, o líder indígena Tupinambá Rosivaldo Ferreira da Silva – conhecido como Cacique Babau – relatou a experiência de democratização da educação e o decorrente desenvolvimento social de sua comunidade, que habita terras no Sul da Bahia.

Segundo Babau, historicamente, os índios e os descendentes dos empregados dos latifúndios não tinham acesso à educação – e isso era feito deliberadamente para se perpetuar a condição de subalternidade. “A partir do ano 2000, levamos a sala de aula para a comunidade e reduzimos a zero o índice de analfabetismo, que era de quase 100%. Com acesso ao conhecimento, multiplicamos a produção agrícola e a renda das famílias”, relatou.

Práticas de saúde, técnicas de agricultura e de criação de animais, de acordo com o cacique, foram oferecidas dentro de uma escola erguida na comunidade, tanto para índios como para não índios, incluindo pessoas idosas. “Quando melhora a educação, tudo em nossa volta também melhora. No nosso caso, as pessoas foram ganhando esperança, acreditando em si. Começaram a perceber que são capazes e não precisam servir a ninguém”, refletiu Babau.

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Cláudia Mayorga: outros atores, vozes e históriasFoto: Foca Lisboa / UFMG

Saberes diversos
Para a pró-reitora de Extensão, Cláudia Mayorga, coordenadora do evento e da mesa de abertura, “as profundas desigualdades que marcam a sociedade brasileira exigem cada vez mais que articulemos saberes, esforços e práticas de enfrentamento”. “Esses problemas não dizem respeito a um único campo do conhecimento. Por isso, devemos recorrer a saberes diversos, outros atores, outras vozes e histórias”, argumentou.  

Ainda sobre a transdisciplinaridade perseguida pelo ensino superior nos dias atuais, a professora Rosângela Pereira de Tugny, da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), destacou que a UFMG, ao iniciar, há quatro anos, os programas de formação transversal em saberes tradicionais, “de forma pioneira e maravilhosa”, combateu aquilo que chamou de “empobrecimento cultural sistêmico”. “A UFMG partiu da consciência de que, para reduzir desigualdades, é preciso acolher e produzir a multiplicidade. O que assisto aqui, e acompanho com esperança, é uma revolução, cujo alcance talvez ainda nem sejamos capazes de mensurar”, avaliou Rosângela, que foi docente na instituição de 1998 a 2014.

O antropólogo José Jorge de Carvalho, da Universidade de Brasília (UnB), sublinhou que as universidades, no momento em que foram concebidas, foram preparadas para reproduzir desigualdades. “Em seus primórdios, essas instituições não tinham propósitos igualitários. Mas participamos agora de uma melhora nesse universo”, ressaltou.

Segundo José Jorge, a primeira ruptura com o contexto de exclusão se deu com a emergência das cotas raciais para ingresso no ensino superior. “No passado, cheguei a lecionar para turmas compostas apenas de alunos brancos. Mas passamos a questionar esse caráter racista e exclusivo, que felizmente não configura mais a realidade da graduação”, constatou o professor, lamentando, no entanto, o fato de que essa transformação ainda não tenha se consolidado na pós-graduação e na docência.

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Sandra Goulart: diversidade e direitos humanosFoto: Foca Lisboa / UFMG

Defesa à universidade
A reitora Sandra Regina Goulart Almeida destacou que a temática escolhida para esta edição da Semana é especialmente importante para a UFMG, instituição “erguida sobre os pilares do respeito e da solidariedade, como prevê a ‘constituição cidadã’ de 1988”.

A reitora leu um comunicado em “defesa da universidade brasileira”, no qual repudia, em nome da UFMG, “atos de violência, preconceito e discriminação contra membros da comunidade universitária”, ocorridos em função do propósito político de “confundir e desqualificar as universidades”, no contexto que antecede o segundo turno das eleições presidenciais no Brasil.

“Estão emergindo, perigosamente, das profundezas de um tempo que deveria ficar só no passado, práticas autoritárias, antidemocráticas e desidratadas da noção de justiça social, respeito à diversidade e aos direitos humanos. É uma ameaça à própria democracia”, concluiu Sandra Goulart Almeida.

Até a sexta-feira, dia 19, as atividades da 27ª Semana do Conhecimento serão realizadas nos campi Pampulha e Montes Claros.