Extensão

Lideranças comunitárias denunciam 'continuidade' do desastre de Mariana

Relatos de situações de descaso e adoecimento marcaram debate no auditório da Reitoria

Mesa reuniu lideranças das comunidades atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão
Mesa reuniu lideranças das comunidades atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão Raphaella Dias / UFMG

Mais de três anos se passaram desde o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, mas os atingidos ainda estão longe de terem suas demandas atendidas pelos responsáveis pelo desastre. Essa é uma das conclusões extraídas do debate realizado na tarde desta sexta-feira, 15, no auditório da Reitoria.

A professora Andrea Zhouri, da Fafich, coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta), chamou a atenção para a continuidade do desastre de Mariana. “Ele ainda está ocorrendo, e as pessoas continuam lutando, se refazendo como sujeitos. Por isso, é tão importante trazê-las para o debate. Quanto mais nos distanciamos da sociedade, mais sentimos que aquilo já era, já aconteceu. E nosso objetivo aqui é mostrar que não, que ainda está acontecendo e que não há como mensurar consequências e desdobramentos”, alertou.

Gladston Figueiredo, representante da equipe de assessoramento técnico da Cáritas, endossou a opinião de Zhouri.  “Anos após o rompimento, o dano é continuado, e o que se vive em Mariana é uma realidade de adoecimento, de ruptura de modos de vida, um crime que se renova cotidianamente na vida dos atingidos", avaliou.

Público que acompanhou o debate no auditório da Reitoria
Público que acompanhou o debate no auditório da Reitoria Raphaella Dias / UFMG

'Parte menor'
Luzia Nazaré M. Queiroz, que integra a comissão dos atingidos de Paracatu de Baixo, disse que a comunidade foi destruída pelo rompimento da barragem e que Mariana está esquecida. “Nós, atingidos, somos a parte ‘menor’; não temos mídia ou televisão para falar sobre a gente”, desabafou ela, que mora em Paracatu de Baixo há 18 anos. Luzia lamentou a perda de autonomia dos atingidos para gerenciar a própria vida. “Hoje perdemos a condição de governar nossas vidas, temos um ditador – as empresas, BHP, Vale e Samarco por meio da Fundação Renova – que nos impõe como viver, e, por isso, tem muita gente adoecendo e morrendo de tristeza”, denunciou.

O produtor rural Marino D´Angelo, da comissão dos atingidos da zona rural, descreveu o seu próprio adoecimento. “Hoje eu tomo remédios para controle da pressão alta e três antidepressivos. Tornei-me diabético, e essa tortura se renova a cada dia, pois não tem nada resolvido em Mariana. Precisamos do apoio de todos, inclusive das universidades”, afirmou.

D´Angelo criticou a forma como os processos de indenização tramitam na justiça. “As vítimas são obrigadas a negociar com os criminosos. E pior: nesse processo, são os criminosos que ditam as regras. Tenho certeza de que se eu tivesse cometido qualquer crime contra a Samarco, já estaria preso”, disse.

Cláudia Mayorga:
Cláudia Mayorga: diálogoRaphaella Dias / UFMG

Aprender para transformar
Na abertura do debate, a pró-reitora de Extensão, Claudia Mayorga, disse que a Universidade está aberta ao diálogo com as comunidades atingidas. “Adotamos uma postura ética em defesa dos direitos humanos. Não estamos aqui para falar de nossos conhecimentos ou tecnologias, mas para escutar, aprender e nos transformar com esse diálogo. Ainda temos muito que aprender, pois Mariana e Brumadinho são a ponta de um iceberg, e a gente precisa compreender essa dinâmica para transformar a realidade”, enfatizou.

O debate Para além do rompimento: lições de Mariana contou com a participação da plateia, que fez comentários e perguntas dirigidas aos componentes da mesa. A íntegra da atividade está disponível no canal do YouTube da Coordenadoria de Assuntos Comunitários. O evento foi apoiado pelo Participa UFMG e pelo Observatório Interinstitucional do Desastre Mariana-Rio Doce.

Com Assessoria de Comunicação da Proex